O tempo do Advento é por si um
tempo litúrgico de espera vigilante e de alegria. Nele recordamos a espera de
Jesus no Natal e a sua vinda definitiva no fim dos tempos. Os personagens
bíblicos do profeta Isaías, João batista e da Virgem Maria são os que nos guiam
na espera do Messias. Mas é sobretudo a Virgem Maria quem nos serve de modelo
para uma acolhida fecunda e operante da Palavra de Deus, particularmente com as
festas da Imaculada Conceição e de N. Senhora de Guadalupe.
No Carmelo Teresiano a festa de são João da Cruz recorre neste
tempo. Por isso, vamos procurar percorrer as principais passagens de seus
escritos onde ele faz menção a Nossa Senhora.
Nos Romances Trinitários e
cristológicos à Virgem Maria é pedido o consentimento por meio do Anjo
Gabriel para a obra da Encarnação do Filho de Deus por obra do espírito Santo.
No final do 8º Romance sobre a Encarnação, conclui o santo:
“E
o que então só tinha Pai,
já
Mãe também teria,
embora
não como outra
que
de varão concebia,
porque
das entranhas dela
sua
carne recebia;
pelo qual Filho de Deus
e
do Homem se dizia”. (Romance 8º sobre a Encarnação)
A seguir, no 9º Romance, S. João
da Cruz segue cantando em chave esponsalícia o evento do nascimento de Jesus.
Maria é chamada de “bendita Mãe”. Ela deita o Menino Jesus no presépio entre os
animais, em meio aos cantos festivos dos anjos e do “assombro” de Maria diante
do Mistério da “troca” que presencia.
“Deus,
porém, no presépio
ali
chorava e gemia;
eram
jóias que a esposa
ao
desposório trazia;
e
a Mãe se assombrava
da
troca que ali se via:
o
pranto do homem em Deus
e
no homem a alegria;
coisas
que num e no noutro
tão
diferente ser soía.” (Romance 9º do
nascimento)
Em outra quadrinha chamada “Natalina”,
composta para a noite do Natal, o santo organiza uma procissão com a imagem da
Virgem em um andor e parando de frente da porta do quarto de cada
religioso, canta e lhe pede hospedagem:
“Do
Verbo divino
A
Virgem grávida
Segue
de caminho:
Pede-vos
pousada”
Um segundo elemento da mariologia
sanjoanista é a docilidade de Maria ao Espírito Santo. A união da pessoa com
Deus se dá sempre através da ação do Espírito Santo. Ele diviniza a pessoa e a
torna cada vez mais semelhante a Jesus. No estado de perfeição, é o Espírito
que move sua inteligência, vontade e memória para cumprir em tudo as obras que
são conformes à vontade de Deus ou de acordo com os seus mandamentos. E como exemplo
coloca Maria, dizendo que
“as
súplicas dessas almas são sempre eficazes. Tais foram as da gloriosíssima
Virgem Nossa Senhora, elevada desde o princípio a este sublime estado; jamais
teve impressa na alma forma de alguma criatura, nem se moveu por ela; mas
sempre agiu sob a moção do Espírito Santo”. (3 Subida Do Monte Carmelo,
2,10).
O relacionamento do Espírito Santo com Maria se deu de maneira
especial na Anunciação, onde por virtude do mesmo Espírito Santo, concebeu o
Filho de Deus. Ele utiliza o termo “obumbração”, que significa receber a sombra
de alguém, isto é, ser revestido por uma especial virtude ou atributo de Deus
para uma missão. Escreve o Santo:
“Efetivamente,
quando a sombra de uma pessoa vem cobrir alguma outra, é sinal de que está
perto para favorecer e amparar a esta última. Eis a razão pela qual o arcanjo
Gabriel usou deste termo para comunicar à Virgem Maria a grande mercê da
conceição do Filho de Deus, dizendo: "O Espírito Santo virá sobre ti, e a
virtude do Altíssimo te fará sombra" (Lc 1,35) (Chama
de amor viva 3,12).
Um outro tema importante da
Mariologia de João da Cruz é o da intercessão de Maria. Para a pessoa que ama e
confia em Deus, fazer-Lhe notar uma necessidade e esperar confiantemente é o
que convém. E apresenta como modelo disso a Virgem nas Bodas de Caná.
“Quem
ama discretamente, não cuida de pedir o que deseja ou lhe falta: basta-lhe
mostrar sua necessidade para que o Amado faça o que for servido. Assim procedeu
a bendita Virgem com o Amado Filho nas bodas de Caná; não lhe pediu diretamente
o vinho, mas disse apenas: “Não têm vinho” (Jo 2,3) (Cântico Espiritual 2,8).
Importante é o seu pensamento
sobre a devoção a Maria através das imagens ou de
lugares de peregrinação (3 Subida 36,1.2;
42,5). O que importa para Deus é a fé e a pureza de coração de quem reza. A
imagem em si mesma ou o seu valor artístico ou econômico não são importantes. O
que se deve fazer é passar da imagem à pessoa que nela está representada. Escreve
ele:
“
Muito haveria que escrever sobre a pouca inteligência de muitas pessoas a
propósito de imagens... confiam mais em uma imagem que em outra, na persuasão de serem mais ouvidas
por Deus por aquela que por esta, embora ambas representem a mesma realidade,
como, por exemplo, duas de Jesus Cristo, ou duas de Nossa Senhora. Isto
acontece porque põem a sua afeição na
figura exterior... Deus só olha a fé e pureza de coração daquele que ora....
Se
tivesses, pois, a mesma devoção e fé em Nossa Senhora ,
diante de uma como de outra imagem, .. receberiam as mesmas graças, e ainda sem
imagem alguma...”
Enfim, concluamos esta breve resenha de textos de São João da Cruz sobre a
Mãe de Jesus com este bonito e profundo trecho
da sua Oração da alma enamorada (Ditos
26).
“Os
céus meus são e minha é a terra; minhas são as criaturas, os justos são meus e
meus os pecadores; os anjos são meus e a Mãe de Deus e todas as coisas são
minhas; e o próprio Deus é meu e para mim, porque Cristo é meu e todo para mim”.
Textos tirados
das Obras Completas de S. João da
Cruz, ed. Vozes.
Decide entrar no Carmelo de Medina. Fora uma
escolha plenamente li-vre e pessoal, uma opção não retratada. Poderia ter
entrado nos Jesuítas, que bem conhecia; ou ficar como capelão no hospital, como
deseja o seu protetor e aconselhavam as necessidades da família. Algo concreto
procura quando vai ao Carmelo contra as circunstâncias. Os motivos mais
discer-níveis são dois: ânsias de solidão e vida contemplativa, devoção à
Santíssima Virgem[1].
Trá-los na alma desde pequenino.
SÃO JOÃO DA CRUZ:
Quem ama discretamente, não
cuida de pedir o que deseja ou lhe falta; basta-lhe mostrar sua necessidade
para que o amado faça o que for servido. Assim procedeu a bendita Virgem com o
amado Filho nas bodas de Caná; não lhe pediu diretamente o vinho, mas disse
apenas: “não tem vinho” (Jo 2,3). (CII,8)
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