1. Santa Teresa: dados gerais
1.1 Teresa, diz-nos quem és.
- Sou Teresa Sánchez de Cepeda e Ahumada ou Teresa de Ahumada. Porém, a partir da fundação do novo Carmelo, comecei a apresentar-me e a ser reconhecida como Teresa de Jesus ou Teresa de Jesus carmelita.
Quais os teus títulos?
- Já se nota que és filho da tua época… Não tenho qualquer título académico. No entanto, após o grande encontro com o meu Amado, pelo qual tanto ansiei, fostes-me colocando diversos títulos, tais como: Madre Fundadora, ‘a Santa’, Mãe de Espirituais, Doutora Mística, Doutora da Igreja, Padroeira, Teresa de Ávila para me distinguir da minha filha Teresa de Lisieux, etc…
Se tivesses que destacar alguns períodos notáveis da tua vida, quais destacarias?
- Os meus 20 anos na casa paterna (1515-1535); os meus 27 anos de carmelita na Encarnação (1535-1562); os meus 28 anos de profunda experiência mística (1554-1582) e, finalmente, os meus 22 anos de escritora e fundadora (1560-1582).
Catequese 2 - Dados gerais
2. Santa Teresa: dados gerais
2.1 Teresa, conta-nos como eras.
- Alguma coisa já deverás saber sobre mim. Contudo, digo-te que era uma mulher Avilense, carmelita, mística e humanista, contemplativa-activa, escritora-autodidacta, fundadora e líder, empreendedora e negociadora, mestra e mãe espiritual. Houve quem ainda me tivesse por santa.
Mas como eras a nível físico e psicológico?
- Fisicamente, fui uma pessoa frágil: enferma crónica; mas, psiquicamente, forte: o meu espírito nunca sucumbiu às enfermidades corporais; mantive-me sempre aberta aos valores transcendentes: Deus, Cristo, Igreja, alma…; sempre pronta para as tarefas diárias (boa cozinheira!).
Que contrastes é que notavas em ti?
- Olhando para mim, as pessoas apontam o meu sentido de transcendência (o místico) e a minha habilidade negociadora e social (realismo e humanismo). Penso ser essas as duas características de maior contraste.
E a nível social?
- Sociologicamente falando, acho que sempre fui uma pessoa aberta à amizade e à comunhão com as pessoas; das minhas relações pessoais posso destacar: S. Francisco de Borja, S. Pedro de Alcântara, D. Álvaro de Mendonça, S. João da Cruz, Pe. João Baptista Rúbeo (Geral da Ordem), S. João de Ávila (apenas por carta), Pe. Jerónimo Graciano… Apenas também ocasionalmente, S. João da Ribera e S. Luís Beltrán. Mas as minhas maiores relações foram com as Irmãs dos meus Carmelos. Destaco entre elas: as duas Anas, Maria de São José, Maria Baptista, Maria de Jesus, várias Irmãs enfermas, as três Irmãs-crianças que entram no Carmelo, etc.
Pode-se saber que sentido deste à tua vida?
- Sabes, acho que tive dias bons e menos bons como todos. Recordo os dias de luta e os momentos de crise. Porém, nunca quebrei; pelo contrário, mantive um rumo unidireccional… Identificada com a minha vocação religiosa (ser religiosa foi grandíssima mercê). Mas com um certo complexo de inferioridade feminina: uma como eu, fraca e ruim, uma mulherzita como eu, sem estudos nem boa vida… Só ao atingir a maturidade é que captei plenamente o sentido da minha existência. Identifiquei-o com a minha experiência mística e a minha missão profética: mística dinâmica; e missão, ao mesmo tempo, transcendente e terrena. Ser testemunha de Cristo e fomentadora de uma nova vida religiosa. Quis ser uma mulher capaz de dar testemunho de Deus presente no mundo e na história.
Foste uma mulher escritora. Que te apraz referir desta obra por ti empreendida?
- Fui escritora, é verdade... Mas não propagandista. Sei que até vós chegaram umas 2000 páginas autografadas, mas escrevi muitas mais. A maior parte em Ávila. Em suma:
Quatro obras maiores: Vida, Caminho, Moradas e Fundações.
Vários escritos menores: Relações, Conceitos, Exclamações, Constituições, Modo de visitar os conventos, poesias…, escritos humorísticos.
Cartas: Conserva-se quase meio milhar, mas escrevi vários milhares (mais de uma centena ao Pe. Graciano).
Escritos perdidos: além das cartas (concretamente as cartas a S. João da Cruz), várias Relações, a primeira redacção de Vida, parte do meu comentário ao Cântico dos Cânticos (= Conceitos) e uma novelita de cavalaria escrita aos 14 anos (o meu primeiro escrito).
De todas estas obras, considero Vida a mais introspectiva, o melhor retrato da minha vida; as Moradas, a minha melhor síntese doutrinal; Caminho, a mais pedagógica, a única que decidi publicar em vida, se bem que não estará cá fora antes de 1583.
Volta e meia, ouve-se as pessoas a chamar-te em castelhano ‘andariega’. Porquê?
- Porque percorri mais de mil quilómetros em toda a minha vida fundando Carmelos. Fundei em Ávila, Medina, Valladolid, Toledo, Malagón, Salamanca, Alba, Pastrana (Guadalajara), Segovia, Beas (Jaén), Sevilla, Villanueva de la Jara (Cuenca), Palencia, Soria, Burgos. Além disso, colaborei nas fundações dos ‘Descalços’ de Duruelo e de Pastrana. Outros locais por mim percorridos: Gotarrendura, Guadalupe, Madrid, Torrijos, Becedas e Duruelo…
O percurso era sempre feito de diversas maneiras (por exemplo, cavalgando ou a pé…). Ao longo das minhas obras, vou dando a conhecer ao leitor.
Obrigado, Teresa. Até à próxima!
Já sei mais algumas coisas sobre ti.
Catequese 3 - Ávila e lugares circunvizinhos
3. 1 Santa Teresa: Ávila e lugares circunvizinhos
Teresa, como era a tua Ávila?
- Ávila, a minha cidade natal, era uma povoação importante na antiga Castela do século de ouro. Está situada no alto da meseta castelhana, a mais de 1100 m acima do nível das águas do mar, a pouca distância de Madrid, Valladolid e Salamanca. Uma cidade com muralhas medievais, palácios, brasões de nobres senhores, cavaleiros… Uma cidade com um clima muito seco.
Ávila tinha muita população?
- Se tinha… Pelo ano 1561, a população era de 10.000 habitantes. A minha cidade natal era uma das cidades mais povoadas da Castela antiga, com excepção de Valladolid, Segóvia e Salamanca. Por incrível que pareça, Ávila tinha mais habitantes que Burgos e Leão.
E quem é que a governava nessa época?
- Era governada pelos senhores do Concelho, a saber: regedor (ou regedores) e, em nome do rei, corregedor. Recordo-me que, pelo menos duas vezes, tive fortes embates com o concelho da cidade: em 1562, aquando da fundação de S. José e por causa dum canal de transporte de água; e em 1577, quando foi raptado S. João da Cruz. Nas duas situações, o problema acabou por chegar ao Concelho Urbano e passar à Corte; mais, na segunda situação, eu própria intervim, junto do rei, em favor de S. João da Cruz.
Catequese 4 - Ávila na época
4. 1 Santa Teresa: Ávila na época
Deixaste-me curioso em relação à tua cidade natal… Conta-me, pois, mais pormenores.
- É com todo o gosto. Começo então por te dizer que a própria cidade de Ávila, quando eu comecei a percorrer as suas ruas empinadas e tortuosas, era, em pedra e em venerados ossos humanos, um verdadeiro panorama histórico da luta travada nas Espanhas por Cristo contra o Príncipe deste mundo. Era tão antiga aquela cidade, que provavelmente já estava assentada, erguida sobre as colinas próximas do Adaja quando Nosso Senhor andava a fazer milagres na Palestina.
Como assim?
- Segundo a tradição, no século I – ano 63 do Senhor -, S. Pedro enviou um dos sete diáconos apostólicos para fundar uma Igreja em Abula (como então se lhe chamava) e São Segundo derramou o seu sangue numa das mais antigas perseguições romanas. Aí, no século IV, o heresiarca Prisciliano, que concebera um pseudo-Cristianismo, composto das ideias gnósticas e maniqueístas vindas do moribundo Oriente – as quais, se tivessem sido aceites, haveriam destruído toda a genuína vida cristã -, foi proclamado bispo pelos seus partidários. Destitui-o e condenou-o à morte um imperador romano, que abjurara o paganismo. Aí, como no resto da Hispânia, dominavam os Visigodos, que primeiro aceitaram e depois traíram a fé, e foram punidos pelos Maometanos conquistadores (cujo castelo ainda existe). E, para que saibas, só no século XI voltou a ser alçada a cruz ao lado das bandeiras dos guerreiros cristãos, no cimo da alta cidade.
Quando é que apareceram as muralhas da cidade?
- Entre os anos 1090 e 1097, os habitantes de Ávila construíram a larga muralha da cidade, que é uma das obras mais notáveis que nos legou a Idade Média. De quarenta pés de altura e treze de espessura, está erguida sobre a rocha viva para contornar as colinas em que assentam a catedral medieval (mais fortaleza que Igreja) e a maior parte dos outros edifícios primitivos; tem de perímetro 9075 pés, e por toda a extensão dos seus muros ameados levanta para o céu singularmente azul umas oitenta e seis torres.
Envoltas nestas sombrias muralhas de cinzento-acastanhado, as casas da cidade elevam-se em cerradas fileiras até ao círculo das torres da Igreja e convento que, ao pôr do sol e ao amanhecer, é uma crista flamejante. No centro, voltados para as muralhas, estão os palácios dos grandes senhores de Ávila – os Bracamontes, os Verdugos, os Cepedas, os Dávilas, como um cinto de pedra envolvendo a colina.
Catequese 5 – Ávila na época
5. 1 Santa Teresa: Ávila na época
Como era Ávila em termos paisagísticos? Já havia conventos, além da Encarnação, ou o teu foi o primeiro?
- Eu sempre gostei das paisagens da minha cidade. Não, já havia algum convento: convento Sant’Ana, onde a Rainha Isabel, a Católica, um dia, recusou a coroa de Castela; convento S. Tomás…
Conto-te que, a norte, numa estreita veiga, precisamente desde o subúrbio de Ajates, viam-se deliciosos jardins ao longo do declive, e, para além deles, os cumes sempre nevados das montanhas, coroando uma infinita variedade de formas e de cores. A Sul, olhando para o vale de Ambles, estava o subúrbio que guardava o convento dominicano de S. Tomás, com muitos outros veneráveis santuários santificados por preciosas relíquias de santos. Ao fundo, o claro rio Adaja ia serpenteando num leito salpicado de grandes pedras cinzentas e ao longo de verdes margens onde, no meu tempo, se erguiam muitos teares, pois o principal produto de Ávila eram os panos, e as águas do rio davam às tintas a qualidade que lhes tornava as cores imperecíveis.
Pelo que sei e pelo que me revelaste no passado, o conflito pró e contra a Cristandade não terminou com a expulsão dos Mouros e a construção das imponentes muralhas… Ultimamente, de tanto te ouvir falar sobre a tua época e cidade, despontou-se em mim algum interesse por esta questão. Que me podes dizer sobre ela?
- É verdade que daquilo que tu dizes nada findou. No próprio interior das muralhas, logo surgiram novas divergências, desta vez entre cristãos e judeus, e entre ambos e a nova classe de judeus-católicos, chamados «conversos», «marranos», ou cristãos-novos. Episódio desta luta foi a desentronização, no meio da Veiga, da efígie de Henrique IV, amigo dos judeus e dos mouros. Em 1491, Isabel, a Católica, mandou um salvo-conduto aos judeus de Ávila, depois de um deles ter sido lapidado pela multidão. Na Igreja de S. Tomás, em que se conservava o braço direito do Doutor Angélico, as criancinhas de Ávila podiam ver o túmulo de Torquemada, o Grande Inquisidor, não longe do belo sepulcro do Príncipe João das Astúrias, que a Rainha Isabel, ao cabo de todos os seus triunfos, tinha tido de ceder à morte, na primavera da sua juventude.
Catequese 6 – Teresa e o mundo para o qual abriu os olhos
6. 1 Santa Teresa: Primavera de 1515
Minha grande amiga: gostaria também de obter da tua parte algumas luzes acerca do ano do teu nascimento. Que me poderias dizer a esse respeito?
- Muitas coisas… Não sei mas é por onde começar…
Sabes, o mundo para o qual abri os olhos na primavera de 1515 era um mundo que passava pelas revolucionárias agonias da tremenda transição dos tempos medievais para os modernos. Só vinte e três anos tinham passado – uma geração apenas – desde o providencial ano de 1492, em que a cruzada hispânica de 777 anos culminara com a conquista de Granada aos Mouros, a expulsão dos Judeus e a descoberta do hemisfério ocidental. Havia só nove anos que Colombo estava na sepultura. Eram ainda vivos homens que com ele tinham navegado: alguns gozando na própria pátria do ouro das Índias; outros levando a luz da civilização ao México ou a Lução, sem nenhum deles dar muita importância à predição que ele fizera de que o fim do mundo seria em 1655. A sua protectora, Isabel a Católica, tinha morrido onze anos antes. Carlos V era um rapaz de quinze anos. O Papa Leão X, filho de Lourenço de Médicis, sentava-se na cadeira de São Pedro, e em 1514, o ano anterior ao do meu nascimento, tinha promulgado uma importante indulgência, sob as habituais condições de penitência e contrição, para conseguir fundos para levantar em Roma uma nova Basílica, em que trabalhava Miguel Ângelo. E em 1515, um monge alemão, então de 33 anos, tinha acabado de improvisar um sistema teológico que considerava como prolongamento das ideias de São Paulo e de Santo Agostinho, mas que estava tão carregado de explosivos espirituais, que cortou de alto a baixo todo o edifício da vida e da cultura cristãs, e abriu a brecha para todos os conflitos da vida moderna.
Pelo que me acabas de dar a saber e pelo meu próprio conhecimento das circunstâncias históricas, eu diria que foi então uma interessante coincidência o teu nascimento e a proclamação do dogma luterano da graça…
- Sim, poder-se-á ver assim as coisas, pois eu viria a considerar a tarefa da minha vida como antídoto e expiação da sua. Lutero, atormentado pelo conflito entre a carne e o espírito, tentou resolvê-lo abraçando as coisas boas deste mundo, e fracassou. Eu calquei-as todas sob os meus pés calçados de sandálias, e triunfei.
do blog potugues:http://teresadejesus.carmelitas.pt/index/index.php
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