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sábado, 24 de abril de 2010

XII Encontro de Presidentes, Mestres e Conselheiros OCDS - (Palestra 1)

Tema : Santa Teresa (cristológica, eclesial, oracional e mariana)

• São realidades que em Santa Teresa estão intrinsecamente relacionadas, como que desdobramentos naturais de uma única realidade: Deus. Deus Uno-Tríno é a fonte que dá vida e sustenta todas as realidades dele oriundas.

• Cristológica: Teresa de Jesus e Jesus de Teresa. É todo um programa de vida que se aprofunda e desenvolve à medida dos anos. Cristo é o centro de sua vida e sua história a tal ponto de também nela ocorrer o que Paulo apóstolo experimenta: “não sou mais eu quem vivo, é Cristo quem vive em mim”.
Sua espiritualidade cristológica está profundamente enraizada na S. Escritura, particularmente nos Evangelhos, na Liturgia (Missa e Ofício), nos Sacramentos e que se prolonga na oração pessoal. É seu AMIGO, seu LIVRO VIVO, seu CAPITÃO DE AMOR.
“Não sabes que sou poderoso? Que temes?” (V. 36,16)
“Eu sou fiel”. (R. 28,1) = (Ap 1,5;19,11)
Mesmo no ápice de sua vida espiritual, jamais abandonou as expressões populares das relações com o Senhor, como p. ex. o Jesus Menino que presidia suas fundações, o Senhor do Horto e as várias representações da paixão, etc...
“Tenho compreendido claramente que esta é a Porta pela qual devemos entrar, se pretendemos que a soberana Majestade revele grandes segredos. Não queira outro caminho, ainda que esteja no cume da contemplação. Por aqui irá seguro. É por meio deste Senhor nosso que nos vem todos os bens”. ( V. 22,6.7)

• Eclesial: Teresa é e quer ser filha da Igreja até a morte. Absolutamente nada sem a Igreja.
Sem negar, naturalmente, a realidade espiritual da Igreja Corpo Místico, Teresa vive a realidade terena da Igreja, compartilhando a dramática situação eclesial do séc. XVI; preocupa-se em dar o melhor de si para o bem da Igreja. A evangelização do novo mundo (América) interessa-lhe particularmente.
Quer relacionar-se com “homens da Igreja” e que estes sejam “santos e letrados” para deles receber ajuda oportuna, tanto pessoal quanto comunitária para suas monjas.
Na sua atividade de fundadora, bem como na sua obra escrita e na sua experiência mística, tudo vem submetido à autoridade eclesial, mesmo havendo, em alguns casos, certas hesitações. Todo seu carisma e ministério é exercido dentro da estrutura eclesial: “ Em tudo sujeito-me à Santa Igreja Católica”. Nota importante na eclesialidade de Teresa: esta acontece, antes de tudo, na própria comunidade religiosa: é o “pequeno colégio de Cristo”, onde “todos deverão amar-se e fazer-se amáveis”.

• Oracional: a vida cristológica e eclesial de Teresa, como que um movimento natural de relação amorosa, encontra na oração sua “ Terreno” privilegiado.
A oração teresiana é, antes de tudo, uma atitude existencial: Ela não é outra coisa “ senão tratar de amizade – estando muitas vezes tratando a sós – com quem sabemos que nos ama”. (V. 8,5)
Nesta relação ( e justamente por ser relação !) “o principal não é pensar muito, mas amar muito” (4M, 1,7). Trata-se, portanto, não apenas de atos de oração, mas de atitudes orantes, uma vez que “ o verdadeiro amante em toda parte ama e se lembra do amado”. (F. 5,16)
Esta atitude orante, em S. Teresa, compromete seriamente toda a existência e não deixa espaço para o mínimo farisaísmo: “Não deveis assentar vossos alicerces só em rezar e contemplar. Com efeito, se não buscardes virtudes e o exercício delas, ficareis sempre anãs. E praza a Deus que não seja só no crescer, porque já sabeis que quem não cresce, diminuí. (7M, 4,9)
Para o orante, a mãe e mestra Teresa é categórica: “Segui sempre o mais perfeito” (C 5,3).

• Mariano: como nos aspectos anteriores, o marianismo em Santa Teresa invade e ilumina toda sua existência.
Nascida e criada em família profundamente cristã, Teresa vive com fervor e simplicidade sua vida de fé e esta vida é marcada pela presença viva e fecunda da Mãe do Senhor. Toda a sua trajetória e experiências é um canto de amor e gratidão para com a Virgem Maria, a tal ponto de ser chamada, também de “ Teresa de Maria”. Teresa jamais separou Maria de Jesus, da Igreja, da oração e do Carmelo. Maria é como que o perfume que exala suavemente sempre e em toda parte.
Para além de sua devoção popular à Virgem, jamais abandonada, as elevadas experiências de S. Teresa tem raízes bíblicas e fortes motivações teológicas. A Mãe de Deus é proposta com modelo de união com Cristo. Ver 6 M 7,14.
“ A companhia do bom Jesus é proveitosa demais para que nos afastemos dela, o mesmo acontecendo com a da Sua Sacratíssima Mãe” (6M 7,13)
Eis um texto pouco divulgado, no que se refere à Virgem como modelo e testemunho de fé e sabedoria: “Ó segredos de Deus! Aqui não há senão entregar o intelecto e pensar que, para compreender as grandezas de Deus, ele de nada vale. Convém nos lembrar do que fez a Virgem Nossa Senhora, com toda sua sabedoria, perguntando ao anjo: como se fará isso? E quando o anjo lhe disse: O Espírito Santo virá sobre ti, a virtude do Altíssimo te cobrirá com sua sombra, ela não tratou de mais disputas. Como quem tinha grande fé e sabedoria, percebeu algo que, diante da intervenção dessas duas coisas, nada mais havia para saber ou de que duvidar” (CAD 6,7).
De diversos modos, na experiência e espiritualidade de Teresa, Maria surge como modelo e testemunho, mas também como intercessora e auxílio: “ Entendi ter muita obrigação de servir a Nossa Senhora e a São José, porque muitas vezes, estando eu totalmente perdida, Deus voltava a me dar saúde graças aos seus rogos” (R 30).
Toda sua intimidade divina foi sempre vivida sob o patrocínio da Virgem Maria. Humana como é, Teresa jamais desprezou os recursos dos simples: “Sinto uma alegria indizível olhando para uma imagem de Nossa Senhora” (CE 61,7).
Como mãe e mestra nossa, deixa-nos o seu amoroso convite, sempre atual e necessário para nossa vida cristã e carmelitana: “ Já que possuís tão boa Mãe, imitai-A e considerai a imensa grandeza dessa Senhora, bem como a vantagem de tê-La por padroeira”. (3M, 1,3)
Olhando com simplicidade e amor para Mãe do Senhor e nossa, descobriremos na constelação da santidade uma ESTRELA de primeira grandeza, cujo nome é MARIA: “ Quem é esta donzela? É filha do Eterno Pai E reluz como uma estrela”. (P. 14)


Frei Afonso de Santa Teresinha, ocd

quarta-feira, 22 de abril de 2009

TEXTOS DO XI ENCONTRO DE PRESIDENTES, FORMADORES E CONSELHEIROS

TEXTOS DE APOIO DADO NA PALESTRA 

A CRISE É UMA EXTRAORDINÁRIA OPORTUNIDADE- FREI WILSON GOMES

TEMA-Comunidade – Só o Amor Transforma, Humaniza sua Vida! 

COMUNIDADE – SÓ O AMOR TRANSFORMA, HUMANIZA SUA VIDA!

 

1. Comunidade Cósmica – Relação com Natureza

 

Texto: A Crise é uma extraordinária oportunidade

a) Interdependência entre tudo e todos

b) Possibilidades de novas relações

c) Dificuldade de mudança: o que mais ouço “é difícil”

 

“Redimido por Cristo e tornado nova criatura no Espírito Santo, o homem pode e deve amar as coisas criadas pelo próprio Deus. Com efeito, recebe-as de Deus; olha-as e respeita-as como dons vindos das mãos de Deus. Agradecendo por elas ao divino Benfeitor e usando e fruindo das criaturas em espírito de pobreza e liberdade, é introduzido na verdadeira posse do mundo,  como se nada tivesse e possuísse: (1 Cor. 3, 22-23) ‘Tudo é vosso, mas vós sois de Cristo, e Cristo é de Deus’” . (GS 38)

 

 

2. Comunidade Humana – Relações com os Outros na Sociedade

 

Texto: Paulo Gaudêncio –  Pesquisa: O perfil do Consumidor como Pessoa

a) Visão do Ser Humano na Sociedade

b) O Valor da Pessoa e o Valor das Coisas

c) Qual é nossa visão?

 

“Descobrir e ajudar a descobrir a dignidade inviolável de cada pessoa humana constitui uma tarefa essencial, diria mesmo, em certo sentido, a tarefa central e unificadora do serviço que a Igreja, e nela os fiéis leigos, são chamados a prestar à família dos homens. De todas as criaturas terrenas, só o homem é “pessoa”, sujeito consciente e livre e, precisamente por isso, “centro e vértice” de tudo o que existe sobre a terra“ (Vocação e Missão dos Leigos na Igreja e no Mundo, N. 37)

 

 

3. Comunidade Eclesial/Carmelitana – Escola de Amor e Comunhão

 

Texto: Santa Teresinha: Trechos Manuscrito C

a) Amar com o Amor de Jesus

b) Os Tipos dentro da Comunidade

c) Formação e Correção Fraterna

d) Amadurecimento no Amor

e) Educar os Afetos

 

“Como membros da Igreja, somos chamados a viver e a transmitir a comunhão com a Trindade, antecipando a comunhão perfeita e definitiva com Deus e com as pessoas, convidando outros a participarem dessa comunhão. (...)

“Nutrida pela Palavra e pela Eucaristia, a Igreja é a “casa e escola de comunhão”, onde os discípulos compartilham a mesma fé, esperança e amor a serviço da missão evangelizadora” (...)

Cada batizado é portador de dons que deverão ser desenvolvidos em comunhão com os demais em vista da irradiação missionária da comunidade eclesial” (...) (DGAE 49-50)

SANTA TERESINHA: O AMOR NA COMUNIDADE 

Amar com o amor de Jesus

 

Este ano, Madre querida, Deus deu-me a graça de compreender o que é a caridade. Compreendia antes, mas de maneira imperfeita, não tinha aprofundado esta palavra de Jesus: “O segundo [mandamento] é semelhante a este: Ama o teu próximo como a ti mesmo.

Dedicava-me, sobretudo, a amar a Deus e foi amando-o que compreendi que não devia deixar meu amor se traduzisse apenas em palavras, pois: Nem todo o que me diz Senhor, senhor, entrará no reino dos céus, mas o que faz vontade de meu Pai que está nos céus.

Essa vontade, Jesus a deu a conhecer muitas vezes, deveria dizer quase a cada página do seu Evangelho; mas na última ceia, quando sabe que o coração dos seus discípulos arde de maior amor por Ele que acaba de dar-se a eles no inefável mistério da sua Eucaristia, esse doce Salvador quer dar-lhes um novo mandamento.

Diz-lhes com indizível ternura: Dou-vos um mandamento novo: que vos ameis uns aos outros; que, assim como eu vos amei, vós também vos ameis uns aos outros. E nisto precisamente todos reconhecerão que sois meus discípulos: se tiverdes amor uns pelos outros. 

De que maneira Jesus amou seus discípulos e por que os amou? Ah! Não eram suas qualidades naturais que podiam atraí-lo, havia entre eles e Ele uma distância infinita. Ele era a ciência, a Sabedoria Eterna; eles eram pobres pescadores ignorantes e cheios de pensamentos terrenos. Contudo, Jesus os chama de amigos, de irmãos, quer vê-los reinar com Ele no reino do seu Pai e, para abrir-lhes esse reino, quer morrer numa cruz, pois disse: Não há amor maior que dar a vida por quem se ama. 

Madre querida, ao meditar essas palavras de Jesus, compreendi como era imperfeito o meu amor para com minhas irmãs, pois não as amava como Deus as ama. Ah! Compreendo agora que a caridade perfeita consiste em suportar os defeitos dos outros, não se surpreender com suas fraquezas, edificar-se com os menores atos de virtude que os vemos praticar. Compreendi, sobretudo, que a caridade não deve ficar presa no fundo do coração.

Ninguém, disse Jesus, acende uma candeia para colocá-la debaixo do alqueire, mas sobre o candelabro, e assim ilumine a quantos estão em casa. Parece-me que essa candeia representa a caridade que deve iluminar, alegrar, não só os que me são mais caros, mas todos os que estão em casa, sem excetuar ninguém. 

Ah, Senhor! Sei que não ordenais nada impossível, conheceis minha fraqueza e minha imperfeição melhor do que eu mesma; bem sabeis que nunca poderei amar as minhas irmãs como vós as amastes, se vós mesmo, ó meu Jesus, não as amásseis em mim. É porque queríeis me conceder essa graça que fizestes um mandamento novo. Oh! Como o amo, sinto que me dás a certeza de que vossa vontade é amar em mim todos aqueles que me ordenastes amar!...   Sinto que quando sou caridosa é só Jesus que age em mim; mais unida fico a Ele, mais amo todas as minhas irmãs.    Quando quero aumentar em mim esse amor, quando o demônio, sobretudo, procura colocar perante os olhos da alma os defeitos de tal ou qual irmã que me é menos simpática, apresso-me em procurar ver suas virtudes, seus bons desejos. Penso que, se a vi cair uma vez, bem pode ter conseguido muitas vitórias que ela esconde por humildade, e que mesmo aquilo que para mim parece ser uma falta pode ser, devido à intenção, um ato de virtude.Não tenho dificuldade em acreditar, pois já fiz uma pequena experiência que me provou que não se deve julgar. Foi durante um recreio, a porteira deu dois toques, era preciso abrir a grande porta dos serviçais a fim de introduzir árvores destinas ao presépio.O recreio não estava alegre, pois não estáveis aí, Madre querida, e, por isso, pensei que me seria agradável ser mandada para servir de terceira. Nesse momento, madre vice-priora disse-me que fosse, ou a irmã que estava a meu lado.

Logo comecei a desatar o nosso avental, mas bem devagar, a fim de que minha companheira pudesse desatá-lo antes de mim, pois pensei agradar-lhe deixando-a ser terceira.

A irmã que substituía a depositária observava-nos rindo e, vendo que me levantei por último, disse-me: ah! Bem que imaginei que não seria vós quem acrescentaríeis uma pérola à coroa, andáveis devagar demais. 

Certamente a comunidade toda pensou que eu tinha agido segundo a natureza. Não sei dizer como uma pequena coisa fez bem a minha alma e me tornou indulgente em relação às fraquezas dos outros.

Isso me impede também de sentir vaidade quando sou julgada favoravelmente, pois digo a mim mesma: se meus pequenos atos de virtude são vistos como imperfeições, pode também haver engano e considerar-se como ato de virtude o que não passa de imperfeição.

Então, digo como são Paulo: Bem pouco me importa em ser julgado por vós ou por um tribunal de homens, nem julgo a mim mesma; quem me julga é o Senhor. Assim, a fim de fazer com que esse julgamento me seja favorável, ou melhor, a fim de não ser julgada de forma alguma, quero ter sempre pensamentos caridosos, pois Jesus disse: Não julgueis e não sereis julgados. (Obras completas, Manuscrito C., pgs. 233-236). 

Os Tipos de Membros da Comunidade 

Observei (e é bem natural) que as irmãs mais santas são as amadas, procura-se a conversação delas, prestam-se serviços a elas sem que tenham de pedi-los, enfim

 Essas almas capazes de suportar faltas de consideração, de delicadezas, vêem-se cercadas pelo afeto de todas. Pode-se aplicar a elas as seguintes palavras do nosso Pai, são João da Cruz: “Todos os bens me foram dados quando não os procurei mais por amor-próprio” (texto que acompanha o desenho do “Monte da perfeição”). 

Ao contrário, as almas imperfeitas não são procuradas. Permanece-se, sem dúvida, dentro dos limites da cortesia religiosa, mas receando, talvez, dizer-lhes algumas palavras pouco amáveis, evita-se a companhia delas.

Ao mencionar almas imperfeitas não estou me referindo apenas ás imperfeições espirituais, pois as mais santas só serão perfeitas no Céu, refiro-me

 À falta de juízo, de educação, à suscetibilidade de alguns temperamentos, todas coisas que não tornam a vida agradável. Sei que essas enfermidades morais são crônicas, sem esperança de cura, mas sei que minha Madre não deixaria de cuidar de mim, de procurar aliviar-me, se ficasse doente a vida toda. 

Eis a conclusão a que cheguei: devo procurar, no recreio, na licença, a companhia das irmãs que me são menos agradáveis, desempenhar junto a essas almas feridas o ofício de boa samaritana.

Uma palavra, um sorriso amável são muitas vezes suficientes para alegrar uma alma triste.

Mas não é absolutamente para alcançar essa meta que quero praticar a caridade, pois sei que logo desanimaria: uma palavra que eu teria proferido com a melhor das intenções seria, talvez, interpretada erroneamente. Por isso, a fim de não perder meu tempo, quero ser amável com todas (e particularmente com as irmãs menos amáveis) para alegrar Jesus e responder ao conselho que me dá no Evangelho, mais ou menos nos seguintes termos: “Quando ofereceres um almoço ou um jantar, não chames os teus amigos, nem os teus irmãos, nem os teus parentes, nem os ricos vizinhos; de outro modo eles também convidar-te-iam e terias uma retribuição. Mas, quando deres um banquete, convida os pobres, os aleijados, os coxos, os cegos; e serás feliz, porque eles não terão como retribuir-te; mas ser-te-á retribuído na ressurreição dos justos”  (Obras Completas, Manuscrito C., pgs.253-254).  

Formação e Correção fraterna 

(...) De longe, parece fácil fazer bem às almas, fazê-las amar sempre mais a Deus, modelá-las, enfim, segundo seus próprios pontos de vista e suas idéias pessoais.

De perto, é o contrário... sente-se que fazer o bem, sem a ajuda de Deus, é tão impossível quanto fazer o sol brilhar no meio da noite...

Sente-se que é absolutamente necessário esquecer as próprias preferências, as concepções pessoais e guiar as almas pelo caminho que Jesus delineou para elas, sem procurar fazê-las caminhar pela nossa via. Não é ainda o mais difícil:

o que mais me custa é observar as faltas, as mais leves imperfeições  e dar-lhes combate mortal. (...) Nada escapa ao meu olhar, fico muitas vezes espantada por enxergar tão bem e acho o profeta Jonas muito desculpável por ter fugido em ver de ir anunciar a ruína de Nínive. Preferiria mil vezes receber recriminações a fazê-las, mas sinto que é necessário que seja um sofrimento, pois quando se age segundo a natureza é impossível que a alma à qual se quer apontar as faltas compreenda os próprios erros: só vê uma coisa: a irmã encarregada de me dirigir está zangada e tudo recai sobre mim, embora eu esteja cheia das melhores intenções.

(...) Podem dizer tudo o que quiserem, no fundo, sentem que os amo (cordeirinhos = noviças) com amor verdadeiro, que nunca faria como o mercenário que, vendo o lobo chegar, abandona o rebanho e foge. Estou pronta a dar minha vida por eles, mas meu afeto é tão puro que não desejo que o conheçam. Com a graça de Jesus, nunca procurei conquistar o coração deles. Compreendi que minha missão consistia em levá-los a Deus e fazê-los compreender que, aqui, vós sois a minha Madre, o Jesus visível que devem amar e respeitar

(...) instruindo os outros muito aprendi. Vi que todas as almas têm de travar, mais ou menos, os mesmos combates, mas são tão diferentes sob outros aspectos, que não tenho dificuldades em compreender o que dizia o padre Pichon: “Há muito mais diferenças entre as almas que entre os rostos”. Por isso, é impossível agir da mesma maneira com todas.

Com certas almas, sinto que devo fazer-me pequena, não recear diminuir-me, confessar meus combates, meus defeitos; vendo que tenho as mesmas fraquezas que elas (...).

Com outras, é preciso agir com muita firmeza e nunca voltar ao que foi determinado. Diminuir-se não seria humildade, mas fraqueza. Deus deu-me a graça de não temer a guerra, preciso cumprir minha obrigação, custe o que custar. (...)

(...) Sei que ninguém é bom juiz em causa própria e que uma criança em quem o médico faz um curativo doloroso não deixará de gritar e dizer que o remédio é pior que o mal. Contudo, fica boa alguns dias depois, feliz por poder brincar e correr. É assim com as almas, reconhecem logo que um pouco de amargo é, às vezes, preferível ao doce e não receiam admitir.

Em alguns casos, não deixo de sorrir interiormente vendo as transformações que se operam de um dia para outro.

(...) fico muito feliz em poder seguir a tendência do meu coração, deixando de servir alimento amargo. Sim, mas... logo percebo que não é para ter pressa, uma palavra poderia fazer desmoronar o belo edifício construído nas lágrimas. Se eu tiver a infelicidade de dizer uma só palavra que pareça atenuar o que disse ontem, vejo minha irmãzinha tentar agarrar-se aos galhos, faço então uma pequena oração interior e a verdade triunfa sempre. (Obras completas, Manuscrito C.,  pgs. 247-249)

 Amadurecimento no amor 

Ao ler o que acabo de escrever, poderíeis, Madre, crer que a prática da caridade não me é difícil. É verdade que, desde alguns meses, não tenho de combater para praticar essa bela virtude. Não quero dizer com isso que nunca me acontece cair em faltas. Ah! Sou imperfeita demais para evitar isso, mas não tenho muita dificuldade em me levantar quando caio (...), pois num certo combate alcancei a vitória e, por isso, a milícia celeste vem agora em meu socorro, não podendo aceitar ver-me vencida depois de ter sido vitoriosa na guerra gloriosa que vou procurar descrever. 

Encontrava-se na comunidade uma irmã que tem o dom de desagradar-me em tudo, suas maneiras, suas palavras, seu caráter eram-me muito desagradáveis, porém é uma santa religiosa que deve ser muito agradável a Deus. Não querendo entregar-me à antipatia natural que sentia, disse a mim mesma que a caridade não deveria assentar-se nos sentimentos, mas nas obras. Então apliquei-me a fazer por essa irmã o que teria feito pela pessoa que mais amo.

Cada vez que a encontrava, rezava por ela, oferecendo a deus todas as suas virtudes e méritos. Sentia que isso agradava a Jesus, pois não há artista que não goste de receber elogios pelas suas obras, e Jesus, o artista das almas, fica feliz quando, em vez de olhar apenas o exterior, entramos no santuário íntimo que ele escolheu para morada e admiramos sua beleza.

Não me restringia a rezar muito pela irmã que me levava a tantos combates, procurava prestar-lhe todos os serviços possíveis.

Quando estava tentada a responder-lhe de modo desagradável, contentava-me em lhe dar meu mais agradável sorriso e procurava desviar a conversa, pois diz-se na Imitação que é melhor deixar cada um no seu sentimento que se entregar a contestação.

 (...), tendo algum relacionamento de serviço com essa irmã, quando os combates se faziam violentos demais, fugia como desertora. Como ela ignorava completamente o que eu sentia por ela, nunca suspeitou os motivos do meu comportamento e está persuadida de que o caráter dela me é agradável. Um dia no recreio, disse-me, aproximadamente, as seguintes palavras com ar contentíssimo: Aceitaríeis dizer-me, Irmã Teresa do Menino Jesus, o que tanto vos atrai em mim, pois cada vez que me olhais vejo-vos sorrir? Ah! O que me atraía era Jesus oculto no fundo da alma dela... Jesus que torna suave o que é amargo... Respondi que sorria por estar contente em vê-la (obviamente não acrescentei que era do ponto de vista espiritual).

 (...), contei-vos meu último meio para não ser vencida nos combates: a deserção. Esse meio empreguei-o durante meu noviciado e sempre deu ótimos resultados

(...) Durante um dos vossos ataques de bronquite, fui uma manhã, de mansinho, entregar-vos as chaves da grade de comunhão, pois eu era sacristã. (...) Uma irmã, animada por um santo zelo e que, todavia, gostava muito de mim, vendo-me entrar em vossos aposentos, pensou que eu ia vos acordar. Quis tomar de mim as chaves, mas eu era bastante esperta para não entregá-las a ela e ceder-lhe meus direitos. (...) Agora compreendo que teria sido mais perfeito ceder diante dessa irmã, jovem, é verdade, mas mais antiga que eu. Naquele tempo, não o compreendi. Querendo de todo jeito entrar atrás dela, que empurrava a porta para me impedir de passar, provocamos o que não queríamos: o barulho vos acordou... Então, Madre, tudo recaiu sobre mim. (...) Pensei que se eu começasse a justificar-me não conseguiria, certamente, manter a paz da alma; sentia também que não tinha virtude suficiente para me deixar acusar sem reagir. Minha última tábua de salvação foi a fuga. Dito e feito. Saí em surdina, deixando a irmã continuar seu discurso, que parecia com as imprecações de Camilo contra Roma. (...)

Não havia bravura nisso (...) Acredito, porém, que mais vale não se expor à luta quando a derrota é certa. Ai! Quando recordo o tempo do meu noviciado, como percebo o quanto eu era imperfeita... Atormentava-me com tão pouca coisa, que hoje rio disso. Ah! Como o Senhor é bom por ter feito crescer a minha alma, (...).

Futuramente, sem dúvida, o tempo atual parecer-me-á ainda cheio de imperfeição, mas agora não me espanto com nada, não fico triste por constatar que sou a própria fraqueza, pelo contrário, é nela que me glorifico e espero cada dia descobrir em mim novas imperfeições.

Lembrando-me de que a Caridade estende um véu sobre uma multidão de pecados (1Pd 4, 8) abasteço-me nessa mina fecunda que Jesus abriu diante de mim.

 No Carmelo sem dúvida, não encontramos inimigos, mas há simpatias, sentimos atração por tal irmã enquanto tal outra nos levaria a dar uma longa volta a fim de não encontrar com ela. Sem que se percebam, ela passa a ser objeto de perseguição. Mas Jesus me diz que essa irmã deve ser amada, que se deve rezar por ela, mesmo que seu comportamento me leve a crer que ela não me ama.

Se amardes os que vos amam, que merecimento vos é devido? Pois os próprios pecadores amam os que os amam.

Não basta amar, é preciso dar provas desse amor. Temos naturalmente prazer em dar presente a um amigo, gosta-se, especialmente, de causar surpresa; mas isso não é caridade pois os pecadores também agem assim (...)

Dar a todas aquelas que vos pedem é menos agradável do que oferecer segundo a inclinação do coração; se bem que, quando se pede com gentileza, não custa dar. Porém, se por acaso não se usam palavras delicadas, a alma revolta-se logo caso não seja firmada na caridade. Encontra-se mil motivos para recusar o que lhe é pedido e só depois de ter convencido a solicitante da sua indelicadeza lhe dá, finalmente e por favor, o que ela deseja, ou lhe presta um leve serviço que teria exigido vinte vezes menos tempo do que foi preciso para exigir direitos imaginários. (OC 236-239)

 Educar o afeto 

Ao dar-se a Deus, o coração não perde sua natural ternura, pelo contrário, essa ternura cresce ao tornar-se mais pura e mais divina. (OC pg. 230).

 (...) tentando consolá-la (companheira de noviciado), explicar àquela que me destes por imã entre todas em que consiste o verdadeiro amor. Mostrei-lhe que era a ela própria que amava e não a vós; disse-lhe como eu vos amava e que sacrifícios fui obrigada a fazer, no início da minha vida religiosa, para não me apegar a vós de maneira totalmente material, como o cachorro se apega a seu dono. O amor alimenta-se de sacrifícios, mais a alma recusa para si satisfações naturais, mais sua ternura se torna forte e desinteressada. 

Lembro-me de que, quando postulante, tinha tentações tão violentas de ir vos encontrar para minha satisfação, para achar algumas gotas de alegria, que tinha de passar rapidamente diante do depósito e agarrar-me ao corrimão da escada. Chegavam à minha mente uma porção de permissões a pedir; enfim, Madre querida, encontrava mil motivos para satisfazer a minha natureza... Como estou feliz agora por me ter privado, logo no início da minha vida religiosa. Já usufruo da recompensa prometida aos que combatem corajosamente. Não sinto mais necessidade de me recusar todas as consolações do coração, pois minha alma está consolidada pelo Único que eu queria amar. Vejo com satisfação que, amando-o, o coração se dilata e pode dar incomparavelmente mais ternura aos que lhe são caros, do que se tivesse ficado concentrado num amor egoísta e infrutífero. (OC. pg. 246)

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Entrevista/Helio Mattar -2 de fevereiro de 2009 – O globo – Razão Social 4-5p.

Para presidente do Instituto Akatu, é o momento de as pessoas repensarem os seus padrões de consumo

Osvaldo Soares

 

Diretor-presidente do Instituto Akatu Pelo Consumo Consciente, Helio Mattar consegue enxergar uma boa notícia em tempos de tantos abalos na economia global. Para ele, a crise é uma grande chance para as pessoas mudarem seus padrões de consumo em busca de uma sociedade mais sustentável. Algo que, segundo Mattar, terá que ser feito mais dia menos dia, seja por causa do desemprego ou da falta de crédito, seja devido ao esgotamento dos recursos naturais decorrente dos atuais patamares de produção e consumo. Para ele, vivemos na “sociedade da falta”, em que nunca estamos satisfeitos. “A gente precisaria de uma sociedade do bastante, na qual as pessoas vão consumir aquilo que basta a elas para ter bem-estar”. Nesse processo, propõe até a redução do número de horas de trabalho. Ainda segundo ele, a crise reduzirá a marcha do movimento de responsabilidade social no país, mas será mais bem enfrentada pelas empresas que já incorporaram a sustentabilidade à sua gestão.

 

O Globo: Como um consumidor consciente deve fazer na crise atual? Se continuar comprando, como pediu o governo, ele ajuda a pôr o planeta em risco. Por outro lado, se diminuir o consumo, ele ajuda a reduzir a atividade econômica e a agravar a crise, que já resulta em milhares de demissões...

HELIO MATTAR: Em primeiro lugar, a gente deve ressaltar que esta crise é uma crise do consumo. Deriva do excesso do consumo que uma grande parcela da população americana procurou fazem em cima de ativos que estavam supervalorizados. Em outras palavras, o indivíduo tinha uma casa que valia US$ 100 mil. Ele refinanciava o imóvel, cujo valor de mercado supostamente se valorizara para US$ 150 mil ou US$ 200 mil. Um banco oferecia a ele então um financiamento tendo como colateral (garantia) a casa, ou aquela parcela do imóvel que havia se valorizado. O indivíduo recebia esse dinheiro e o usava não para investir, para gerar recursos para ele, mas para consumir. Então esta é uma crise do sobreconsumo.

 

O GLOBO: Por que o senhor diz que as conseqüências da crise também têm a ver com o sobreconsumo?

MATTAR: Vamos ver quais são os principais setores afetados. O primeiro é o automobilístico. No Brasil, houve uma queda de até 30% nas vendas do último mês (dezembro) contra o último mês do ano anterior. Nos Estados Unidos, a queda foi de 50%. Numa sociedade em que os produtos têm uma obsolescência programada, as pessoas continuamente estão atualizando seus produtos. No momento de uma crise, obviamente elas estão com os produtos atualizados e não há obsolescência programada que dê jeito nisso.

 

O GLOBO: O que é obsolescência programada?

MATTAR: Isso é numa coisa discutida cotidianamente como estratégia das empresas de produtos. Um liquidificador custa, sei lá, R$50, R$60. Ele vai durar um ano, dois anos, e acabou, você nem vai mandar consertar. Cinqüenta anos atrás, meus pais mantinham um liquidificador por 30 anos, ele literalmente era um produto durável. Custava obviamente muito mais caro, mas por 30 anos só demandava da natureza uma única vez.

 

O GLOBO: Como agir então na crise?

MATTAR: A pergunta que você me faz é a seguinte: como é que a gente faz para compatibilizar a questão econômica com a social e a ambiental. E a resposta é a seguinte: a crise é uma extraordinária oportunidade de as pessoas compreenderem que é possível viver de uma outra forma. É possível não viver numa sociedade em que a gente tenha uma contínua tensão do consumo e que eu caracterizo como sendo a sociedade da falta...

 

O GLOBO: Por quê?

MATTAR: Porque sempre estamos em falta. A gente acabou de comprar um telefone celular, já surgiu um outro e nós pensamos: puxa vida, olha que pena, comprei hoje e o novo aparelho tem aquele recurso e tal. Então é a sociedade da falta, a gente nunca está satisfeito. A gente precisaria de uma sociedade do bastante, aquela na qual as pessoas vão consumir aquilo que basta a elas para ter bem-estar. Elas vão substituir aquilo que hoje seria uma sociedade da acumulação por uma sociedade do bem-estar. O que as pessoas precisam se perguntar é: o que eu preciso para o meu bem-estar?

 

O GLOBO: Que outras características teria essa sociedade?

MATTAR: As pessoas buscariam um sentido para as suas vidas não no consumo. O significado de viver estaria nas emoções, nos afetos, nas amizades, nas coisas que de fato compreendem o bem-estar das pessoas. E o consumo seria apenas um instrumento para o bem-estar. Essa sociedade, do ponto de vista ambiental, seria muito mais sustentável. Do ponto de vista econômico, teria muito menos risco, porque as pessoas se endividariam menos. A crise pode mostrar às Pessoas que consumir, consumir, consumir pode não ser uma maneira de viver. Em vez de ficarem chateadas por causa da crise, aproveitem para se perguntar do que realmente precisam. E aproveitem para usar o seu tempo, que aliás é precioso, para fazer coisas que não tenham custo. Para fazer um passeio pelo parque, para estar com os amigos, para fazer um roteiro cultural, visitar um museu. Para fazer coisas que as alimentem emocionalmente e tenham baixa despesa.

 

O GLOBO: O senhor disse, em outra entrevista que as pessoas precisam repensar o seu estilo de vida, para consumir menos e gerar menos lixo. No caso do celular, por exemplo, o senhor disse que na fabricação de um aparelho são gastos entre dez e 20 vezes o peso dele em recursos naturais. No caso do automóvel, duas vezes. Olhando por esse lado, a crise é uma boa notícia para o meio ambiente?

MATTAR: Desse ponto de vista, a crise seria uma ótima notícia para o meio ambiente, se as pessoas e os governos raciocinassem sobre o atual modelo de produção e consumo. Mas acaba sendo má notícia, porque as pessoas morrem de medo do desemprego que vai ser criado. Agora, a crise é ainda uma oportunidade para se pensar se a gente não deveria reduzir a carga de trabalho. Se a gente não deveria pensar num processo em que se redistribuísse renda, reduzindo a carga de trabalho e incluindo no mercado mais pessoas. Mas isso só é possível se as pessoas se derem conta de que consumo não é igual a felicidade.

 

O GLOBO: Qual a diferença, na prática, de uma redução do consumo provocada pela crise e uma causada por um novo estilo de vida?

MATTAR: A diferença é que, na crise, dado que as pessoas não se dão conta do sofrimento que estão vivendo na sociedade da falta, elas vão achar que só há coisas ruins. Já se elas fizessem uma mudança no seu modelo de vida e nos seus valores, iam se dirigir a isso com alegria, iam dizer: puxa, esta é uma oportunidade de eu trabalhar menos, de estar mais em contato com os amigos, de me dedicar ao meu desenvolvimento espiritual, para ter uma vida mais plena do que esta em que eu trabalho, trabalho, trabalho, me endivido, me endivido, me endivido, consumo, consumo, consumo, tudo isso para poder trabalhar, trabalhar, trabalhar mais, e aí não vai ter jeito.

 

O GLOBO: Quais serão os principais reflexos da crise no movimento de responsabilidade social empresarial no Brasil?

MATTAR: A gente tem que olhar pelo menos três grupos no mercado. Tem o das melhores empresas, que já incorporaram a cultura da sustentabilidade aos seus negócios. Nessas, imagino que a mudança não será pronunciada. O segundo é daquelas que ainda fazem ações de sustentabilidade de maneira muito fragmentada, onde a sustentabilidade não se tornou ainda uma cultura. Nessas, eu imagino que haverá um maior efeito. A evolução para uma cultura de sustentabilidade será mais lenta, porque os esforços vão estar voltados para a sobrevivência. Depois há um terceiro grupo de empresas, sem preocupação efetiva com cultura de sustentabilidade e responsabilidade socioambiental. Essas vão continuar operando como sempre. Para o movimento como um todo, talvez diminua um pouco a velocidade na qual a ação de sustentabilidade vai se dar. Mas não nas melhores empresas. E essas é que são importantes, porque puxam o mercado.

 

O GLOBO: Elas estariam então mais bem aparelhadas para enfrentar a crise?

MATTAR: Não tenho dúvida. As empresas com uma cultura de sustentabilidade mais consolidada têm um nível de participação dos funcionários muito maior. Há elementos que fazem a ligação, servem de fio condutor entre as várias pessoas para que a empresa funcione como ela funciona. E isso num momento de crise torna a empresa, como se diz em física, mais resiliente. O que quer dizer isso? Um organismo mais interligado, em vez de fragmentado, quando toma uma pancada a absorve e volta à posição original. É isso que ocorre com as empresas em que uma gestão sustentável já se colocou na prática. A empresa tem mais resiliência porque os seus funcionários, como um todo, têm uma visão comum.

 

 

PROPAGANDA

 

UMA EMPRESA AGRIDE A NATUREZA ATÉ QUE A NATUREZA E A SOCIEDADE REAJAM.

 

Tão importante quanto preservar o meio ambiente e corrigir os abusos cometidos contra ele é mudar mentalidades. E as suas práticas. A responsabilidade social é parte das novas atitudes de respeito à natureza. Trata-se de um ideal contemporâneo, um meio transformador que constrói uma sociedade sustentável do ponto de vista ambiental, social e empresarial. Todos os vínculos são requalificados entre empresas, governos, pessoas. E entre todos eles e o meio ambiente. Muitas empresas já fazem parte dessa cultura que traz resultados positivos para os negócios e para a sociedade. A natureza está nos lucros, não nas perdas.

 

Instituto Ethos – Empresas e Responsabilidade Social

Responsabilidade social empresarial não são palavras. São ações.

www.ethos.org.br


Paulo Gaudencio – Men at Work

Como o ser humano se torna e se mantém produtivo – Editora Gente

 

 

Líder não é mais aquele que administra pessoas; é o que permite e promove o crescimento de pessoas.

Ser pai é a arte de se tornar desnecessário. O educador é assim. O gerente moderno também...

 

O ser humano não vem acompanhado de manual de instruções, nem sempre oferece garantia; é uma máquina misteriosa.

 

Uma vez, fui chamado a participar de uma pesquisa da MPM sobre O Consumidor como Ser Humano (esse era o título da pesquisa!). A equipe precisava descobrir as motivações que levam uma pessoa a consumir. Mas o enfoque da pesquisa me espantou. Embora precisassem compreender o consumidor integralmente, só o lado profissional da clientela os preocupava. Eles estavam tão fixados na questão do trabalho que o fato de o consumidor ser também um ser humano se tornara secundário.

 

Por muito tempo, o trabalho com o ser humano foi cercado de preconceitos. Psiquiatras, psicoterapeutas e outros psis eram aqueles que cuidavam de maluco, e não de gente.

O preconceito começava dentro da própria categoria. Na Faculdade de Medicina, os que escolhiam a Psiquiatria estavam geralmente entre os piores da turma. Os colegas diziam que eram os que não conseguiam ser médicos.

Freqüentemente, era diagnosticada a etiologia emocional de dores pré-cardiais ou gástricas, por exemplo. O cardiologista ou gastro, no entanto, preferiam receitar qualquer pílula a encaminhar seu paciente a um psicoterapeuta.

Também havia preconceito por parte dos empresários. Por não conhecer o assunto, eles pré-conceituavam os problemas psicológicos que surgiam em suas empresas. Estresse, consumo de drogas e alcoolismo, por exemplo, eram sempre tratados pelo sintoma, jamais pelas causas. E o resultado era uma série de campanhas, tão trabalhosas e caras quanto ineficientes.

Tanto a pílulas dos cardiologistas quanto as campanhas das empresas são tratamentos sintomáticos. Eles parecem rápidos, parecem solucionar os problemas. Mas, na realidade, apenas os escamoteiam. Agem como o indivíduo que, por ter surpreendido a esposa fazendo amor com outro homem no sofá, resolve o problema vendendo o sofá. Para uma solução efetiva, é preciso entender o que está acontecendo com o sujeito. Não existe crise setorial em gente. Ou o sistema está em crise ou não está, por inteiro. (...) O tratamento sintomático é de curto prazo, mascara as causas sistêmicas e provoca efeitos colaterais (nesses casos podem acontecer gastrite e sentimento de injustiça), fazendo com que o sistema fique mais doente. No tratamento sistêmico a constante de tempo é maior, exige o trabalho da equipe que nele atua, porém as soluções são duradouras e eficazes. Mas não foi assim que o empresário, o governante, os pais aprenderam a lidar com as pessoas.

 

(...) Hoje, a empresa corre atrás daquilo que tenho definido como sendo a última descoberta da tecnologia: o ser humano. O valor de pessoas, e não das coisas, tornou-se o diferencial entre sucesso e falência.

(...)As bases dessa idéia estão em uma publicação de 1788: A Crítica da Razão Prática. Quem refletiu sobre essas bases não foi um empresário, mas um filósofo: Immanuel Kant. E do que fala ele nesse livro? Da diferença entre pessoas e coisas.

 

Indivíduo é uma palavra interessante. Ela significa indiviso. É aquilo que, em qualquer espécie, animal, mineral ou vegetal, constitui uma unidade distinta.

(...).

Embora estejamos acostumados a usar a palavra indivíduo para designar o ser humano, podemos perceber, por sua definição, que ela se aplica a tudo aquilo que é singular.

A personalidade é algo único. É aquilo que caracteriza e distingue certo indivíduo e suas propriedades incomuns, que o diferencia de todos os outros indivíduos. Por isso freqüentemente confundimos indivíduo com pessoa. Mas esses dois termos não são sinônimos.

Só indivíduo humano, racional, portador de um valor especial é pessoa. Vamos abrir um parêntese para falar desse valor, do valor humano.

Existem valores absolutos e relativos.

Valor relativo é aquele que se define por relação a outro valor; ele não faz parte do objeto, mas é determinado por comparação com outro. Tudo aquilo que não tem em si mesmo o princípio de seu valor é chamado coisa. O valor das coisas se chama preço. Coisas podem ser trocadas por um valor equivalente a elas. Não por acaso, o nome da moeda brasileira, Real, tem a mesma origem da palavra coisa (do latim res).

O valor que caracteriza pessoas é um valor absoluto. Embora se possam estabelecer padrões de comparação entre pessoas (fulano é mais alto que sicrano, beltrano pesa mais do que fulano etc.), o que determina que o indivíduo seja uma pessoa é um valor não-mensurável.

Graças a esse valor, cada pessoa é inconfundível, incomparável e não pode ser permutada por nenhum equivalente.

Esse valor intrínseco ao homem, que o impossibilita de ser trocado por qualquer outro homem, é a sua dignidade. É um valor que não pode ser relativizado. É o único cujo princípio reside nele mesmo e não se define por comparação exterior.

Como é portadora desse valor absoluto, a pessoa não pode ser considerada como coisa, instrumento ou meio para obtenção de um fim estranho a ela.

A dignidade da pessoa consiste, então, em ser considerada, em si mesma, como fim. E jamais somente como instrumento ou meio.

 

(...) Quando desrespeitamos o valor absoluto que diferencia uma pessoa de uma coisa, fazemos o caminho inverso: transformamos a pessoa em coisa. Nós a reificamos (res = coisa). Nós a coisificamos.

 

QUANDO O ÚNICO CRITÉRIO DE JULGAMENTO É O DA UTILIDADE, A DIGNIDADE DE ALGUÉM É DESCONSIDERADA.

 

É o caso da mulher-objeto. O que é ela? É a mulher de quem se desconhece a dignidade, encarada exclusivamente pelo critério de sua utilidade, no caso sexual. Por quê? Porque a pessoa passa a ser considerada somente em função da utilidade a que se presta, isto é, como um meio em vista de um fim. A mesma coisa ocorre com o homem-objeto.

Se trocarmos a utilidade sexual por qualquer outra, o resultado será o mesmo. A mulher que vê o homem exclusivamente pelo prisma de sua utilidade financeira também está desconhecendo a dignidade dele.

Quando falamos de mulheres e homens-objetos, esse mecanismo fica bastante explícito, porque a valoração realizada é negativa. É fácil perceber a perda da dignidade. Mas nem sempre é tão simples perceber as nuances da reificação.

 

As pessoas e as coisas

Pessoas, quando respeitadas em sua dignidade, apresentam, entre outras, duas características importantes:

São autônomas, isto é, assumem as normas para si.

Comprometem-se. Sabem seu lugar no contexto da empresa. Lutam por sua realização pessoal e também a da empresa que lhe dá o espaço profissional.

Já as pessoas reificadas têm atitudes típicas de coisas nas empresas onde trabalham:

 

Coisas são heterônomas, isto é, obedecem às normas. Não porque as assumam, mas por temerem as conseqüências da desobediência. Mesmo quando coisificadas, as pessoas insistem em se manter pessoas e procuram exercer a sua individualidade criando maneiras de burlar a norma. Uma multinacional que conheço e que iniciou um processo de transformação em 1986 colecionou uma série de exemplos de burla, como: empregados que cumpriram a norma de usar óculos de segurança durante dois anos... sem as lentes. Empregados que, não conseguindo cumprir as normas estabelecidas sobre rejeitos, trataram de enterra-los. Não conseguindo fazer algumas mudanças importantes porque eram contras as normas, um empregado entrou escondido na fábrica, durante um feriadão, e fez as modificações. No dia seguinte, ninguém conseguiu compreender a melhoria obtida na produção. Outro empregado esqueceu de ligar um instrumento durante uma parada para manutenção, comprometendo toda produção; esquecer ou errar era contra as normas, o que impediu que ele confessasse o ocorrido r providenciasse a sua correção. Quando conseguiu faze-lo, a produção voltou ao normal. (...)

 

Coisas participam, mas não se comprometem. São como a galinha no bife a cavalo, que entra com o ovo, enquanto o boi entra com a carne. Coisas dão parte de si, o descartável, o excedente. Limitando-se a trocar horas de trabalho por remuneração.

 

PESSOAS TÊM O VALOR DIGNIDADE. COISAS TÊM PREÇO. QUANDO DESRESPEITADAS EM SUA DIGNIDADE, A PESSOA SE COISIFICA.

 

Pessoas pensam com a própria cabeça. São maiores, pensam por si. E como pensam as pessoas coisificadas? Os outros pensam por elas. Seus pensamentos, suas idéias, suas opiniões, até suas atitudes e seu comportamento são pensados pelos outros. São menores; vivem na menoridade.

As pessoas autônomas, entendendo o significado das normas, as assumem. Pessoas coisificadas seguem a norma; desde que alguém tome conta.

Quem não pensa com a própria cabeça e somente obedece a norma está pendurado, pendente, dependente. Quem pensa por elas ou toma conta do cumprimento das normas é também dependente, pois faz parte da mesma estrutura coisificante. Quem é maior e autônomo está pendurado somente em si: é uma pessoa in-dependente (pendurado dentro).

Pessoas maiores, autônomas, independentes comprometem-se. Pessoas menores, heterônomas, dependentes apenas participam.

 

Já vimos que a dignidade só é respeitada quando o critério da utilidade não é exclusivo. Ocorre, porém, que, para a empresa, utilidade é sinônimo de desempenho profissional. E esse é um critério que não pode ser abandonado. Do diretor ao porteiro, passando pelas secretárias e telefonistas, o desempenho é essencial ao bom êxito de uma organização.

Mas as empresas estão descobrindo que, se o desempenho for o único fator, ocorre a reificação e, conseqüentemente, a falta de comprometimento e autonomia.

Desempenho é importante, sim; mas algum fator a mais deve ser levado em consideração. Não como proposta teórica, mas como algo que faça parte essencial da filosofia da organização, sendo manifestado em toda as atitudes e norteando as tomadas de decisão: a noção do indivíduo como sujeito de seus atos.

O que quer dizer isso exatamente?

 

SÓ O SER HUMANO É LIVRE, SÓ O SER HUMANO É RESPONSÁVEL

 

Se o ser humano fosse movido apenas pela força de suas carências, apetites e pulsões, suas atitudes seriam completamente explicáveis segundo os esquemas válidos para o mundo animal.

Posso dizer, com segurança, que um cão faminto colocado dentro de um restaurante de luxo vai avançar sobre a comida; mas não posso dizer o mesmo de um ser humano faminto. Posso afirmar que um casal de gatos que copula no telhado não interrompe o ato porque percebeu alguém espiando na janela; mas  posso garantir que um casal humano se sentiria constrangido nessa situação.

O cão e o gato agem de acordo com uma combinação de fatores causais sobre os quais eles não exercem controle. Se têm fome, comem; se seus hormônios pedem cópula, copulam. O comportamento deles é resultado de mera reação a estímulos recebidos de seu organismo ou do mundo ao redor.

Se o homem fosse apenas um animal, estaria cegamente submetido às leis do reino animal. Ele jamais poderia ser considerado sujeito de suas ações.

Os fatores internos e externos a que estão sujeitos todos os membros do reino animal influenciam o agir humano, mas o aspecto mais importante do comportamento do ser racional é a capacidade de decidir de modo voluntário e consciente. O homem é titular da capacidade de determinar o próprio agir, de tomar decisões livres, voluntárias, conscientes, racionais. Isso significa saber (e ousar) fazer escolhas, lucidamente assumidas, entre várias opções possíveis.

Como toda e qualquer decisão necessariamente envolve riscos, a capacidade de assumir riscos de modo consciente e voluntário é uma característica inseparável da responsabilidade. Dizer que o ser humano é sujeito responsável significa afirmar que o poder de escolha entre múltiplas possibilidades deve ser um princípio ativo de sua conduta.

 

O SUJEITO MORAL

 

As ações humanas são reguladas por leis naturais e leis morais.

As leis naturais expressam as relações entre fenômenos através de suas causas. Servem para explicar por que troveja durante a tempestade e por que pássaros comem inseto, por que os tubarões atacam, por que o homem fica doente após comer algo estragado etc. Mas as causas das ações do homem incluem a razão.

As leis que explicam a conduta humana indicam como suas ações devem ser. Por isso são chamadas morais. Elas dizem como devem interagir os seres humanos no mundo.

O ser humano é livre e responsável. Mas isso não lhe dá salvo-conduto para todo tipo de anarquia e arbitrariedade. Sua ação está submetida às normas éticas e morais.

Dentre todas as espécies, somente o ser racional é dotado de capacidade de discernimento, escolha e decisão. Somente ele é capaz de determinar o próprio comportamento, de escolhe-lo e assumi-lo, isto é, de justifica-lo por meio de argumentos racionais.

 

O PARADOXO DA NORMA É QUE ELA TANTO PODE SABOTAR A LIBERDADE DO SER HUMANO QUANTO RESGUARDÁ-LA.

 

A norma implica limitação. Mas limite não é necessariamente constrangimento. Limite é também aquilo que define, que (de)limita um espaço, que desenha um campo de atuação.

 

LIBERDADE COM RESPONSABILIDADE

 

Em nome desse slogan, muitas ações libertárias foram tolhidas por governos ditatoriais. Entretanto, eles se apropriaram indevidamente de um conceito que, em si, é exato. É preciso que exista uma relação de coerência entre o sujeito que acata e assume a norma, a escolha, e a norma que orienta a decisão. Isso faz parte do agir responsavelmente.

 

SÓ É LIVRE O INDIVÍDUO CAPAZ DE ESCOLHA E DECISÃO ETICAMENTE ORIENTADAS.

 

Nenhum animal, por exemplo, tem capacidade de autodeterminação. Por isso, ele não pode ser considerado responsável por ela.

A ação livre é, no entanto, necessariamente submetida às normas éticas e morais que orientam o agir dos seres racionais.

Essas normas não podem ser fundadas em nenhuma coisa exterior à pessoa humana, considerada como indivíduo livre e racional.

A liberdade da pessoa é o fundamento das normas morais; mas por outro lado, o comportamento determinado por essas normas é o que qualifica a pessoa como sujeito moral e expressa sua liberdade.

O sujeito moral pode e deve ser considerado responsável, porque age segundo a norma que expressa a escolha e ao mesmo tempo se reconhece como causa livre do próprio agir.

(...) a responsabilidade é a suprema prerrogativa do ser humano livre. (...) a ação responsável implica e exige comprometimento.

 

NINGUÉM VESTE UMA CAMISA APERTADA DEMAIS

 

Não é à toa que as empresas usam a metáfora vestir a camisa para falar de comprometimento. É mesmo uma boa imagem. Mas, pensando melhor nessa metáfora, verificamos que ninguém veste uma camisa que não lhe cabe. Se assim o fizer, seus movimentos estarão de tal forma tolhidos que o resultado será a imobilidade.

Comprometimento é uma relação de conseqüência entre toda decisão responsável e a norma que a orienta, de modo que essa norma possa e deva ser assumida pelo sujeito da ação.

Nas empresas, observamos que, quanto mais o funcionário é tratado como ser humano, maior é seu grau de comprometimento na função. Para isso, as normas devem ser objeto de consenso.

Isso não significa que todos os funcionários ditem normas, mas sim que eles tenham o direito de opinar sobre elas, e até refuta-las. Discordar não quer dizer rejeitar pura e simplesmente, mas cumprir a função de opinar responsavelmente para que a norma seja assimilada no dia-a-dia.

Comprometimento pressupõe autonomia, outra palavra mágica (...). Mas o que é autonomia? Auto (aquilo que é próprio) + nomia (de ou relativo a norma, regra, lei). Ou seja voltamos à noção de norma voluntariamente escolhida e assumida.

Também nesse ponto podemos perceber claramente as diferenças entre o ser autônomo e autômato.

Ao contrário de autônomo, o indivíduo heterônomo não compreende nem assume a norma como algo que está dentro de si, mas sim do outro (hetero) a quem ele deve simplesmente obedecer. A norma está fora, e ele segue como autômato. Recusando-se a usar o próprio entendimento ou aceitando passivamente a determinação externa de seu agir e pensar. Permite que seu valor de pessoa seja desprezado. Permite ser tratado como coisa.

Por isso se diz que tutelar um ser humano ou reduzi-lo à vassalagem é ilícito e imoral. Mas, da mesma forma, é ilícito e imoral aceitar a condição de pupilo ou vassalo. Em ambos os casos, nega-se a liberdade como propriedade essencial.

 

O que caracteriza o líder é a sua crença na causa que abraça. Essa crença é de tal ordem que contamina as pessoas e as mobiliza para a implementação. As crenças derivam dos sonhos e das visões: colocar o homem na lua e o trazer de volta (Kennedy); fabricar o próprio sal (Ghandi), garantir os direitos dos negros (Luther King); (...).

 

Mesmo em simples ações mecânicas, se os envolvidos não assimilarem o sentido da norma, a tarefa não será melhorada.

 

Uma norma faz sentido para nós quando os valores que estão inseridos nela são nossos, ou podem vir a ser nossos. Eficiência e eficácia são valores contidos em várias normas. Se esses valores não puderem ser assimilados por quem vai adota-los, a norma não fará sentido algum para essa pessoa.

Só há responsabilidade quando o sujeito tem chance prévia de decidir se aquela norma (e o valor contido nela) é dele.


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  PALESTRA DE JOSE EDUARDO-

A importância do conselho para as comunidades

  

“... a fim de que todos sejam um.” (Jo 17,21)

 

 Mais uma vez, Deus, na sua infinita bondade e sabedoria, nos reúne. A todos desejamos a paz e a alegria que brota do coração de Jesus!

Refletir sobre a importância e o papel do conselho nas comunidades/grupos OCDS é, acreditamos, querer “renovar a nossa maneira de pensar e agir” (citação paulina) em relação a esse assunto. Primeiro, pensamos que é necessário mudar ou melhorar a nossa maneira de ver o conselho. Muitas vezes somos movidos, devido às influências que sofremos no meio em que vivemos, a olhar as pessoas que estão à frente de uma instituição, empresa, comunidade, enfim, onde quer que haja um grupo, como se elas fossem as mais importantes e poderosas. Não que isso, às vezes, não seja verdade e necessário, mas não o é na OCDS.

Nas comunidades/grupos da Ordem Secular, o conselho não pode ser visto no “topo da pirâmide” e o “resto” dos membros abaixo, na base; bem porque, esse símbolo não serve para nós. Aqui,  o conselho é e deve ser “um” com a comunidade/grupo, cujo centro é Cristo (const. OCDS 10). Talvez, o símbolo que corresponda melhor ao que queremos dizer, é o  círculo. Sem começo e fim, forte, “perfeito”, com um único centro. Dessa forma, mudando a maneira de ver o conselho (se for preciso), conseguiremos realmente ver a importância e o papel do conselho das Comunidades/grupos OCDS.

Assim as nossas constituições o define:

 

 O Conselho, formado pelo Presidente, três Conselheiros e o responsável pela formação, constitui a autoridade imediata da comunidade. A responsabilidade primária do Conselho é a formação e amadurecimento cristão e carmelitano dos membros da comunidade (const. OCDS nº46).

Esse é o papel do conselho. Vamos analisar e refletir sobre isso, ou seja, sobre a importância desse, na vida comunitária.

 

 I - Autoridade Imediata

 

As constituições  definem o conselho como “autoridade imediata da comunidade”. Essa autoridade “nasce” da responsabilidade assumida, que por sua vez vem da GRATUIDADE do SERVIÇO prestado à comunidade/grupo. Ninguém É presidente, conselheiro ou encarregado da formação, mas ESTÁ, e exerce essas funções por três anos, a serviço da OCDS.

 Essa autoridade só é válida se for acompanhada daquela humildade que o Senhor nos ensina no evangelho: “... o Filho do Homem não veio para ser servido, mas para servir... (Mt 20, 28)”. Isso não diminui em nada a autoridade do conselho, que as constituições declaram no nº 47, pelo contrário, só a “fortalece e reafirma”.

É responsabilidade de o conselho zelar pela “ordem” na comunidade/grupo e por isso ele tem autoridade, mas em tudo deve existir a caridade fraterna, o respeito e a humildade, virtudes tão desejadas por Teresa de Jesus à seus filhos, e além disso  “... não há problema que não seja resolvido com facilidade entre os que se amam e deve ser grave a coisa capaz de causar problema...” (C 4, 5). Esse conselho da santa madre Teresa, deve estar gravado no coração de cada membro da OCDS, e principalmente, deve ser um meio de avaliação e reflexão, diante de um possível problema.

 A autoridade exige docilidade no trato com as pessoas, não admite preferências (const. OCDS 51); se conquista pela afabilidade e respeito,  além de zelar pela igualdade. Nunca se impõe, mas sabe impor-se quando necessário através do amor fraterno.

 

 

II - A responsabilidade “primária” do Conselho é a formação e amadurecimento  dos membros

  Essa, sem dúvida, é a tarefa mais importante do conselho. Uma vez que é na formação – inicial, preparatória para as promessas (temporárias e definitivas) e na permanente – que os membros vão ter a oportunidade de adquirir a base teórica para amadurecerem, crescerem e principalmente, viverem no espírito carmelitano.

Logo, o conselho deve trabalhar de maneira que a formação atinja a todos, o que se torna um grande desafio na riqueza da diversidade de seus membros: das mais variadas formações, classes sociais, qualidades, limitações, dificuldades, entre outras. Por isso, o conselho deve ter empatia, e ser o mais democrático  e aberto possível, acolhendo com amor e atenção as sugestões dos membros, sem se “preocupar tanto” com o tempo “gasto” ou com o cronograma traçado. Pois nesse assunto, o mais importante é fazer com que a formação seja “absorvida, transformada em oração, e posta em prática” por TODOS, o que muitas vezes exige de uns, esforço, e de outros, paciência.

            O conselho deve também ter a preocupação de formar “novos líderes”, ou seja, dar a formação e a oportunidade para que todos possam estar preparados para servir a comunidade e a OCDS  através do conselho local.

Na formação todos devem “andar” junto, e respeitando a etapa e o tempo de  cada um. Assim, “o caminho de perfeição” torna-se mais prazeroso, pois teremos com quem conversar sobre as misericórdias do Senhor; e se cairmos durante a subida do Monte Carmelo, poderemos contar com uma mão amiga, que nos ajudará a levantar.

Sendo assim, cabe ao conselho, e não só ao encarregado da formação, um carinho e uma atenção toda especial nesse ponto (const. OCDS 51-53). Talvez, esse aspecto seja o mais delicado dentro de uma comunidade/grupo, pois pensamos que, é através da formação oferecida e concretizada que o conselho deve se  auto-avaliar.

  

III - CONSELHO COMO ARTÍFICE DE DINAMISMO

  

No nº. 40 das nossas constituições lemos: A Ordem Secular se estrutura basicamente na comunidade local como um sinal visível da Igreja. Sendo assim, pensamos que as comunidades/grupos OCDS devem ser aquelas sementes que caíram na terra boa e produziram muitos frutos (Mt 13, 8).

Mas, para que isso aconteça, o conselho deve fazer com que as reuniões e formações sejam momentos de encontro com Deus, e Nele, com os irmãos. Deve proporcionar momentos de reflexões e meditações, de adoração ao Santíssimo Sacramento; devem usar meios para animar e incentivar seus membros a participarem das discussões em grupos, a darem opiniões em relação a tudo o que for do interesse da comunidade/grupo; deve incentivar momentos de recreações, entre outros.

Devem ainda, preocupar-se em formar seus membros num “espírito crítico”, tão necessário nos dias atuais, para que possam saber discernir tudo e ficar com o que é bom (1 Ts 5, 19). As reuniões/formações devem servir como “instrumentos”, muitas vezes cirúrgicos, para retirar o cisco dos nossos olhos (Lc 6, 42), para que assim, possamos estar  sempre com os olhos fixos no Senhor (C 26, 3)!

Outro aspecto que merece muita atenção, e que já citamos acima, é a formação de “novos líderes”. Isso é de extrema e vital importância para a sobrevivência e continuidade da OCDS. A comunidade (conselho) que não faz isso comete um erro fatal, e põe em risco a estrutura que, muitas vezes, demorou a se formar. Por isso, os membros devem estar preparados para assumir qualquer um dos cargos do conselho, respeitando, é claro, a liberdade e os limites de cada um.

Como diz o ditado popular, “ninguém fica para semente”, isso significa que  tudo passa (lembremo-nos da poesia Eficácia da Paciência, de santa me. Teresa) e devemos dar lugar  e espaço para os outros. Muitas vezes, acontece que o mesmo conselho fica triênio e triênios à frente da comunidade, acontecendo apenas uma rotatividade interna, ou seja, do conselho em questão. Quando a comunidade/grupo é pequena, isso é compreensível e aceitável, devido à limitação da quantidade de membros. Porém, pensamos que, quando  o número de membros permite uma rotatividade dos membros eleitos para o conselho e isso não acontece, é inaceitável e prejudicial  para o crescimento e amadurecimento da OCDS e dos seus membros, mesmo que o conselho tenha desempenhado um ótimo trabalho nos triênios que esteve à frente.

Cabe ao conselho que termina o triênio, ajudar, naquilo que for preciso, o conselho que assume; o que proporciona crescimento mútuo e união.

 

IV - CONCLUSÃO

 

Queridos irmãos e irmãs, espero que essas reflexões possam ajudar-nos a ver e a assumir com maior alegria e gratuidade, as responsabilidades inerentes aos cargos do conselho. Penso que, quando Santa Teresa fez a reforma e fundou o novo Carmelo, ela desejava que as monjas, os frades e os leigos que se aproximavam dos mosteiros e conventos, vivessem o maior de todos os mandamentos: o AMOR.

 

Amor que brota da intimidade com um Deus que vem até nós e torna-se hóspede; que nos fala no silêncio da oração, e que se faz presente na solidão;

Que vence o medo e fortalece o coração,

 para pôr-se a serviço dos irmãos... missão!

Amor, que é chama e chama para a  união;

União de pensamentos e momentos, de partilha e comunhão;

Amor transformante, atuante...

Nuca negligente e ausente... Mas exigente, e sempre presente!

AMOR que aquece e enaltece os filhos de Deus,

Que revigora o cansado, que sacia o faminto, que enxuga as lágrimas...

Do oprimido, do injustiçado, do desesperado!

AMOR que não se cansa de amar, de esperar... de perdoar.

 Simplesmente amar,

...no AMOR, por Amor, com o AMOR!

 

 

José Eduardo M. Manfredini Júnior, OCDS

Comunidade Santa Face – Tremembé/SP

E-mail: je.manfredini@gmail.com

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O BATISMO E A NOVIDADE CRISTÃ

Vocação e Missão dos Leigos na Igreja e no Mundo

 

Um só corpo em Cristo

 

N. 12 – Regenerados como “filhos no Filho”, os batizados são inseparavelmente “membros de Cristo e membros do corpo da Igreja”, como ensina o Concílio de Florença (Conc. Ecum. Florentino, Decr. Pro Armeniis, DS 1314).

 

O Batismo significa e realiza uma incorporação, mística mas real, no corpo crucificado e glorioso de Jesus. Através do sacramento Jesus une o batizado à sua morte para uni-lo à sua ressurreição (Rm 6, 3-5), despoja-o do “homem velho” e reveste-o do “homem novo”, isto é, de si mesmo: “Todos os que fostes batizados em Cristo – proclama o apóstolo Paulo – vos revestistes de Cristo” (Gl 3, 27; cf. Ef. 4, 22-24; Cl 3, 9-10). Daí resulta que “nós, embora sendo muitos, constituímos um só corpo em Cristo” (Rm 12, 5).

 

Reencontramos nas palavras de Paulo o eco fiel da doutrina do próprio Jesus, que revelou a unidade misteriosa dos seus discípulos com ele e entre si, apresentando-a como imagem e prolongamento daquela arcana comunhão que une o Pai ao Filho e o Filho ao Pai no vínculo amoroso do Espírito (cf. Jô 17, 21). (...)

 

Templos vivos e santos do Espírito

 

N. 13 Usando uma outra imagem, a do edifício, o apóstolo Pedro define os batizados como “pedras vivas” edificadas sobre Cristo, a pedra angular”, e destinadas à construção de um edifício espiritual” (1Pd. 2, 4ss) (...)

 

O Espírito Santo “unge” o batizado, imprime-lhe a sua marca indelével (cf. 2 Cor. 1, 21-22) e faz dele templo espiritual, isto é, enche-o com a santa presença de Deus, graças à união e à conformação com Jesus Cristo.

 

Com essa espiritual “unção”, o cristão pode,, por sua vez, repetir as palavras de Jesus: “O Espírito do Senhor está sobre mim: por isso me ungiu e me enviou para anunciar a Boa Nova aos pobres, para proclamar a libertação aos cativos, e aos cegos o recobrar da vista, para mandar em liberdade os oprimidos e proclamar um ano de graça do Senhor” (Lc 4,18-19; Is 61, 1-2).

 

Assim, com a efusão batismal e crismal o batizado torna-se participante da mesma missão de Jesus Cristo, o Messias Salvador.

 

CHAMADOS À SANTIDADE

 

n. 16 – (...) o Espírito que santificou a natureza humana de Jesus no seio virginal de Maria (cf. Lc 1, 35) é o mesmo Espírito que habita e atua na Igreja para lhe comunicar a santidade do Filho de Deus feito homem. (....).

 

Todos na Igreja, precisamente porque são seus membros recebem e, por conseguinte, partilham a comum vocação à santidade. A título pleno, sem diferença alguma dos outros membros da Igreja, a essa vocação são chamados os fiéis leigos: “todos os fiéis, de qualquer estado ou ordem, são chamados à plenitude da vida cristã e à perfeição da caridade” (LG 40); Todos os fiéis são convidados e têm por obrigação tender à santidade e à perfeição do próprio estado” (LG 42 – Tb. Pio XI, encíclica Casti connubii dirigida aos esposos cristãos: “Podem e devem todos, qualquer que sejam as condições e o santo estado de  vida que tenham escolhido, imitar o modelo perfeitíssimo de toda a santidade, que Deus propôs aos homens, e que é Nosso Senhor JC, e com a ajuda de Deus chegar Tb ao nível supremo da perfeição cristã, como o mostram os exemplos de tantos santos”: AAS 22 (1930), 548.).

 

A vocação à santidade mergulha as suas raízes no Batismo e volta a ser proposta pelos vários sacramentos, sobretudo pelo da Eucaristia: revestidos de Jesus Cristo e impregnados por seu Espírito, os cristãos são “santos” e, por isso, são habilitados e empenhados em manifestar a santidade do seu ser na santidade de todo o seu operar. O apóstolo Paulo não se cansa de advertir todos os cristãos para que vivam “como convém a santos” (Ef 5, 3).

 

A vida segundo o Espírito, cujo fruto é a santificação (Rm 6, 22; cf. Gl 5, 22), suscita e exige de todos e cada um dos batizados o seguimento e imitação de Jesus Cristo, no acolhimento das suas bem-aventuranças, na escuta e meditação da Palavra de Deus, na consciente e ativa participação da vida litúrgica e sacramental da Igreja, na oração individual, familiar e comunitária, na fome e sede de justiça, na prática do mandamento do amor em todas as circunstancias da vida e no serviço aos irmãos, sobretudo os pequeninos, os pobres e os doentes

 

 

Santificar-se no mundo

 

N. 17 – A vocação dos fiéis leigos à santidade comporta que a vida segundo o Espírito se exprima de forma peculiar na sua inserção nas realidades temporais e na sua participação nas atividades terrenas. É ainda o apóstolo quem adverte: “Tudo quanto fizerdes por palavras e obras, fazei tudo no nome do Senhor Jesus, dando por meio dele, graças a Deus Pai” (Cl 3, 17). Aplicando as palavras do apóstolo aos fiéis leigos, o Concílio afirma categoricamente: “Nem os cuidados familiares nem outras ocupações profanas devem ser alheias à vida espiritual” (Dec. Apostolicam actuositatem, 4). A unidade de vida dos fiéis leigos é de enorme importância, pois eles têm que se santificar na normal vida profissional e social. Assim, para que possam responder à sua vocação, os fiéis leigos devem olhar para as atividades da vida quotidiana como uma ocasião de união com Deus e de cumprimento da sua vontade, e também como serviço aos demais homens, levando-os à comunhão com Deus em Cristo” (Propositio 5).

 

 

O MISTÉRIO DA IGREJA-COMUNHÃO

 

Uma comunhão orgânica: diversidade e complementaridade

 

N.20 – O fiel leigo “não pode nunca fechar-se em si mesmo, isolando-se espiritualmente da comunidade, mas deve viver num contínuo intercâmbio com os outros, com um vivo sentido de fraternidade, na alegria de uma igual dignidade e no empenho em fazer frutificar ao mesmo tempo o imenso tesouro recebido em herança. O Espírito do Senhor dá-lhe, como aos outros, múltiplos carismas, convida-o a diferentes ministérios e funções, recorda-lhe, como também recorda aos outros em relação a ele, que tudo o que o distingue não é um suplemento de dignidade, mas uma especial e complementar habilitação para o serviço... Deste modo os carismas, os ministérios, as funções e os serviços do fiel leigo existem na comunhão e para a comunhão. São riquezas complementares em favor de todos, sob a sábia orientação dos pastores” (João Paulo II, Homilia da solene concelebração eucarística no encerramento da VII Assembléia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos - 30 de outubro de 1987): AAS 80 – 1988, 600.)

 

 

OS MINISTÉRIOS E OS CARISMAS, DONS DO ESPÍRITO À IGREJA

 

Os Carismas

 

N. 24 – Os carismas, sejam extraordinários ou simples e humildes, são graças do Espírito Santo que têm, direta ou indiretamente, uma utilidade eclesial, ordenados como são à edificação da Igreja, ao bem dos homens e às necessidades do mundo.

 

(...) “O juízo acerca da sua (dos carismas) autenticidade e reto uso pertence àqueles que presidem a Igreja e aos quais compete de modo especial não extinguir o Espírito, mas julgar tudo e conservar o que é bom (cf. 1Ts 5, 12 e 19-21 –LG 12), de modo que todos os carismas concorram, na sua diversidade e complementaridade, para o bem comum” (LG 30).

 

 

FORMAS DE PARTICIPAÇÃO NA VIDA DA IGREJA

 

n. 28 – Os fiéis leigos, juntamente com os sacerdotes, os religiosos e as religiosas, formam o único povo de Deus e Corpo de Cristo.

 

Ser “membros” da Igreja nada tira ao fato de cada cristão ser um ser “único e irrepetível”; antes, garante e promove o sentido mais profundo da sua unicidade e irrepetibilidade, enquanto é fonte de verdade e de riqueza para a Igreja inteira. Nesse sentido, Deus em Jesus Cristo, chama cada qual pelo próprio e inconfundível nome. O convite do Senhor: “Ide vós também para a minha vinha” dirige-se a cada um pessoal e soa: “Vem também tu para a minha vinha”!

 

Assim, cada um na sua unicidade e irrepetibilidade, com o seu ser e o seu agir, põe-se a serviço do crescimento da comunhão eclesial, como, por sua vez, recebe singularmente e faz sua a riqueza comum de toda a Igreja. Esta é a “comunhão dos santos”, que nós professamos no Credo: o bem de todos torna-se o bem de cada um e o bem de cada um torna-se o bem de todos. “Na santa Igreja – escreve S. Gregório Magno – cada um é apoio dos outros e os outros são seu apoio” (S. Gregório Magno, Hom. In Ez., II, I, 5: CCL 142, 211).

 

Formas pessoais de participação

 

É absolutamente necessário que cada fiel leigo tenha sempre viva consciência de ser um “membro da Igreja”, a quem se confia um encargo original insubstituível e indelegável, que deverá desempenhar para o bem de todos. Numa tal perspectiva, assume todo o seu significado a afirmação conciliar sobre a necessidade absoluta do apostolado de cada pessoa: “O apostolado individual que deriva com abundância da fonte de uma vida verdadeiramente cristã (cf. João 4, 14),é origem e condição de todo o apostolado dos leigos, mesmo do associado, e nada o pode substituir. A este apostolado, sempre e em toda a parte proveitoso e em certas circunstâncias o único conveniente e possível, são chamados e, por isso, obrigados todos os leigos, de qualquer condição, ainda que não se lhes proporcione ocasião ou possibilidade de cooperar nas associações” (Decreto sobre o apostolado dos leigos Apostolicam actuositatem, 16).

 

(...) Com esta forma de apostolado, a irradiação do Evangelho pode tornar-se mais capilar, chegando a tantos lugares e ambientes quantos os que estão ligados à vida quotidiana e concreta dos leigos. Trata-se, além disso, de uma irradiação constante, estando ligada à contínua coerência da vida pessoal com a fé; e também de uma irradiação particularmente incisiva, porque na total partilha das condições de vida, do trabalho, das dificuldades e esperanças dos irmãos, os fiéis leigos podem atingir o coração dos seus vizinhos, amigos ou colegas, abrindo-o ao horizonte total, ao sentido plena da existência: a comunhão com Deus e entre os homens.

 

Formas agregativas de participação

 

29. – A comunhão eclesial, já presente e operante na ação do indivíduo, encontra uma expressão específica no operar associado dos fiéis leigos, isto é, na ação solidária que eles desenvolvem ao participar responsavelmente da vida e da missão da Igreja.

 

(...) A agregação dos fiéis leigos por motivos espirituais e apostólicos brota de várias fontes e vai ao encontro de diversas exigências: exprime, de fato, a natureza social da pessoa e obedece ao imperativo de uma mais vasta e incisiva eficácia operativa. Na verdade, a incidência “cultural” fonte e estímulo e, simultaneamente, fruto e sinal de todas as demais transformações do ambiente e da sociedade, só se pode alcançar com a ação, não tanto dos indivíduos, mas de um grupo, de uma comunidade, de uma associação, de um movimento. E isso é particularmente verdade no contexto de uma sociedade pluralista e fragmentada – como é, em tantas partes do mundo, a atual – e perante os problemas tornados enormemente complexos e difíceis. Por noutro lado, sobretudo num mundo secularizado, as várias formas agregativas podem representar para muitos uma ajuda preciosa em favor de uma vida cristã coerente, com as exigências do Evangelho e de um emprenho missionário e apostólico.

 

Além desses motivo, a razão profunda que justifica e exige o agregar-se dos fiéis leigos é de ordem teológica: uma razão eclesiológica, como abertamente reconhece o Concílio Vaticano II, ao apontar o apostolado associado como um “sinal da comunhão e da unidade da Igreja em Cristo” (Decreto sobre o apostolado dos leigos Apostolicam actuositatem, 18).

 

É um sinal que deve manifestar-se nas relações de “comunhão”, tanto no interior como no exterior das várias formas agregativas, no mais vasto contexto da comunidade cristã.

 

 

VIVER O EVANGELHO SERVINDO A PESSOA E A SOCIEDADE

 

n. 36 – Ao anunciar e ao acolher o Evangelho na força do Espírito, a Igreja torna-se comunidade evangelizada e evangelizadora e, precisamente por isso, faz-se serva dos homens. Nela, os fiéis leigos participam da missão de servir a pessoa e a sociedade. É verdade que a Igreja tem como fim supremo o Reino de Deus, do qual ela “constitui na terra o gérmen e o início” (LG. N. 5), e, portanto, está inteiramente consagrada à glorificação do Pai. Mas, o Reino é fonte de libertação plena e de salvação total para os homens: com estes, portanto, a Igreja caminha e vive, real e intimamente solidária com a sua história.

 

Tendo recebido encargo de manifestar ao mundo o mistério de Deus, que brilha em Jesus Cristo, ao mesmo tempo a Igreja descobre o homem ao homem, esclarece-o acerca do sentido da sua existência, abre-o à verdade total acerca dele e do seu destino (GS. N. 22). Nesta perspectiva, a Igreja é chamada, em virtude da sua própria missão evangelizadora, a servir o homem. Tal serviço tem a sua raiz primeiramente no fato prodigioso e empolgante de que, “com a encarnação, o Filho de Deus uniu-se de certa forma a todo o homem” (GS. N. 22).

 

“A Igreja, ao procurar o seu fim salvífico próprio; não se limita a comunicar ao homem a vida divina; espalha sobre todo o mundo os reflexos da sua luz, sobretudo enquanto cura e eleva a dignidade da pessoa humana, consolida a coesão da sociedade e dá um sentido mais profundo à quotidiana atividade dos homens. A Igreja pensa, assim, que por meio de cada um dos seus membros e por toda a sua comunidade muito pode ajudar para tornar mais humana a família dos homens e a sua história” (GS. N. 40).

 

Neste contributo à família dos homens, de que é responsável a Igreja inteira, cabe aos fiéis leigos um lugar de relevo, em razão da sua “índole secular”, que os empenha, com modalidades próprias e insubstituíveis, na animação cristã da ordem temporal.

 

 

Promover a dignidade da pessoa

 

 

N. 37 – Descobrir e ajudar a descobrir a dignidade inviolável de cada pessoa humana constitui uma tarefa essencial, diria mesmo, em certo sentido, a tarefa central e unificadora do serviço do serviço que a Igreja, e nela os fiéis leigos, são chamados a prestar à família dos homens.

 

De todas as criaturas terrenas, só o homem é “pessoa”, sujeito consciente e livre e, precisamente por isso, “centro e vértice” de tudo o que existe sobre a terra (GS. N. 12).

 

A dignidade pessoal é o bem mais precioso que o homem tem, graças ao qual ele transcende em valor todo o mundo material. A palavra de Jesus: “Que serve ao homem ganhar o mundo inteiro, se depois perde a sua alma?” (Mc 8, 36) implica uma afirmação antropológica luminosa e estimulante: o homem vale não por aquilo que “tem” – mesmo que ele possuísse o mundo inteiro -, mas por aquilo que “é”. Não são tanto os bens do mundo que contam, mas o bem da pessoa, o bem que é a própria pessoa.

 

A dignidade da pessoa aparece em todo o seu fulgor, quando se consideram a sua origem e o seu destino: criado por Deus AA sua imagem e semelhança e remido pelo sangue preciosíssimo de Cristo, o homem é chamado a tornar-se “filho no Filho” e templo vivo do Espírito, e tem por destino a vida eterna da comunhão beatífica com Deus. Por isso, toda a violação da dignidade pessoal do ser humano clama por vingança junto de Deus e torna-se ofensa ao Criador do homem.

 

Em virtude da sua dignidade pessoal, o ser humano é sempre um valor em si e por si, e exige ser considerado e tratado como tal, e nunca ser considerado e tratado como um objeto que se usa, um instrumento, uma coisa.

 

A dignidade pessoal constitui o fundamento da igualdade de todos os homens entre si. Daí, a absoluta recusa de todas as mais variadas formas de discriminação que, infelizmente, continuam a dividir e a humilhar a família humana, desde as raciais e econômicas às sociais e culturais, das políticas às geográficas etc. Toda discriminação é uma injustiça absolutamente intolerável, não tanto pelas tensões e conflitos que pode gerar no tecido social, quanto pela desonra feita à dignidade da pessoa: não só a dignidade daquele que é vítima da injustiça, mas ainda mais à daquele que pratica essa injustiça.

 

Fundamento da igualdade de todos os homens entre si, a dignidade pessoal é, ao mesmo tempo, o fundamento da participação e da solidariedade dos homens entre si: o diálogo e a comunhão têm a sua raiz última naquilo que os homens “são”, antes e mais ainda do que naquilo que eles “têm”.

 

A dignidade pessoal é propriedade indestrutível de cada ser humano. É fundamental compreender-se toda a força que irrompe desta afirmação, que se baseia na unicidade e na irrepetibilidade de toda pessoa. Dela deriva que o indivíduo seja irredutível a tudo o que o queira esmagar e anulá-lo no anonimato da coletividade, da instituição, da estrutura, do sistema. A pessoa, na sua individualidade, não é um número, não é o anel de uma cadeia nem uma peça da engrenagem de um sistema. A afirmação mais radical e exaltante do valor de cada ser humano foi feita pelo Filho de Deus ao encarnar no sei de uma mulher. E disto continua a falar-nos o Natal cristão (“Se celebramos com tanta solenidade o nascimento de Jesus, fazêmo-lo para dar testemunho de que o homem é alguém, único e irrepetível. Se as nossas estatística humanas, as catalogações humanas, os humanos sistemas políticos, econômicos e os sociais e as simples possibilidade humanas não conseguem garantir ao homem que ele possa nascer, viver e agir como um ser único e irrepetível, então, tudo isso lhe assegura Deus. Para ele e diante dele, o homem é sempre único e irrepetível; alguém que foi desde toda a eternidade idealizado e escolhido; alguém que é chamado e denominado pelo próprio nome” – João Paulo II, Primeira rádio-mensagem natalícia ao mundo: AAS 71 [1979], 66).

 

 

Venerar o inviolável direito à vida

 

N. 38. O reconhecimento efetivo da dignidade pessoal de cada ser humano exige o respeito, a defesa e a promoção dos direitos da pessoa humana. Trata-se de direitos naturais, universais e invioláveis: ninguém, nem o indivíduo, nem o grupo, nem a autoridade, nem o Estado, pode modificar e muito menos eliminar esses direitos que emanam do próprio Deus.

 

Ora, a inviolabilidade da pessoa, reflexo da inviolabilidade absoluta do próprio Deus, tem a sua primeira e fundamental expressão na inviolabilidade da vida humana. É totalmente falsa e ilusória a comum defesa, que aliás justamente se faz, dos direitos humanos – como por exemplo o direito à saúde, à casa, ao trabalho, à família e à cultura -, se não se defende com a máxima energia o direito à vida como primeiro e fontal direito, condição de todos os outros direitos da pessoa.

 

A Igreja nunca se deu por vencida perante as violações que o direito à vida, que é próprio de cada ser humano, tem sofrido e continua a sofre, tanto por parte dos indivíduos como mesmo até por parte das próprias autoridades. O titular desse direito é o ser humano, em todas as fase de seu desenvolvimento, desde a concepção até a morte natural, e em todas as suas condições, tanto de saúde como o de doença, de perfeição ou de deficiência, de riqueza ou de miséria. O Concílio Vaticano II afirma abertamente: “Tudo quanto se opõe à vida, como seja toda espécie de homicídio, genocídio, aborto, eutanásia e mesmo suicídio liberado; tudo o que constitui uma violação da integridade da pessoa humana, como as mutilações, os tormentos corporais e mentais e as tentativas para violentar as próprias consciências; tudo quanto ofende a dignidade da pessoa humana, como as condições de vida infra-humana, as prisões arbitrárias, as deportações, a escravidão, a prostituição, o comércio de mulheres e de jovens; e também as condições degradantes de trabalho, em que os operários são tratados como meros instrumentos de lucro e não como pessoas livres e responsáveis; todas estas coisas e outras semelhantes são, sem dúvida, infamantes; ao mesmo tempo que corrompem a civilização humana, desonram mais aqueles que assim procedem do que os que as padecem, e ofendem gravemente a honra devida ao Criador” (GS. N. 27).

 

Ora, se a todos pertencem a missão e a responsabilidade de reconhecer a dignidade pessoal de cada ser humano e de defender o seu direito à vida, certos fiéis leigos são a isso chamados por um título particular: são os pais, os educadores, os agentes da saúde e todos os que detêm o poder econômico e político.

 

Ao aceitar amorosa e generosamente toda a vida humana, sobretudo se fraca e doente, a Igreja vive hoje um momento fundamental da sua missão, tanto mais necessária quanto mais avassaladora se tornou uma “cultura de morte”. De fato, “a Igreja firmemente acredita que a vida humana, mesmo se fraca e sofredora, é sempre um dom maravilhoso do Deus da bondade. Contra o pessimismo e o egoísmo, que ensombram o mundo, a Igreja está ao lado da vida: e em cada vida humana ela consegue descobrir o esplendor daquele ‘sim’, daquele ‘amém’, que é o próprio Cristo (cf. 2Cor. 1, 19; Ap. 3, 14). Ao ‘não’ que avassala e aflige o mundo, contrapõe-se esse vivo ‘sim’, defendendo dessa maneira o homem e o mundo daqueles que ameaçam e mortificam a vida” (Exort. AP. Familiaris consortio, 30: AAS 74 [1982], 116). Pertence aos fiéis leigos, que mais diretamente ou por vocação ou por profissão se ocupam do acolhimento à vida, tornar concreto e eficaz o ‘sim’ da Igreja à vida humana. 

Nas fronteiras da vida humana abrem-se hoje novas possibilidades e responsabilidades , com o enorme progresso das ciências biológicas e médicas, aliado ao surpreendente poder tecnológico: o homem, com efeito, é já capaz não só de “observar”, mas também de “manipular” a vida humana no seu início e nas primeiras fases de seu desenvolvimento.

 A consciência moral da humanidade não pode ficar alheia ou indiferente perante os passos gigantescos dados por uma força tecnológica que consegue ter um domínio cada vez mais vasto e profundo sobre os dinamismos que presidem à procriação e às primeiras fases do desenvolvimento da vida humana. Talvez nunca como hoje e neste campo a sabedoria se revela como única ancora de salvação, para que o homem, na investigação científica e na aplicada, possa agir sempre com inteligência e com amor, isto é, no respeito, diria mesmo na veneração, da inviolável dignidade pessoal de todo ser humano, desde o primeiro instante de sua existência. Isso acontece quando, usando meios lícitos, a ciência e a técnica se empenham na defesa da vida e na cura da doença, desde os inícios, recusando, no entanto – pela própria dignidade da investigação -, intervenções que se tornem perturbadoras do patrimônio genético do indivíduo e da geração humana (Instrução Donum vitae, 22.02.1987: AAS n80 [1988], 70-102).

 Os fiéis leigos que, a qualquer título ou a qualquer nível, se empenham na ciência e na técnica, bem como na esfera médica, social, legislativa e econômica, devem corajosamente enfrentar os “desafios’ que lhes lançam os novos problemas da bioética. Como disseram os padres sinodais, “os cristãos devem exercer a sua responsabilidade como donos da ciência e da tecnologia, não como seus escravos... Em ordem a esses ‘desafios’ morais, que estão para serem lançados pela nova e imensa força da tecnologia e que põem em perigo não só os direitos fundamentais dos homens, mas a própria essência biológica da espécie humana, é de máxima importância que os leigos cristãos – com a ajuda de toda a Igreja – tomem a peito o enquadramento da cultura nos princípios de um humanismo autêntico, de forma que a promoção e a defesa dos direitos do homem possam encontrar fundamento dinâmico e seguro na sua própria essência, aquela essência que a pregação evangélica revelou aos homens” (Propositio 36).

 É urgente que todos, hoje, estejam alertados para o fenômeno da concentração do poder, e, em primeiro lugar, do poder tecnológico. Tal concentração tende, com efeito, a manipular não só a essência biológica, mas também os conteúdos da própria consciência dos homens e os seus padrões de vida, agravando, assim, a discriminação e a marginalização de povos inteiros.

 Liberdade para invocar o nome do Senhor

 N. 39 – (...) Quanto até aqui dissemos sobre o respeito pela dignidade pessoal e sobre o reconhecimento dos direitos humanos, prende-se, sem dúvida, com a responsabilidade de cada cristão, de cada homem. Mas, devemos imediatamente sublinhar como isso se revista hoje de uma dimensão mundial: trata-se, de fato, de uma questão que já atinge grupos humanos inteiros, até povo inteiro, que são violentamente espezinhados nos seus direitos fundamentais. Saí, aquelas formas de desigualdades de progresso entre os diversos mundos que na recente Encíclica Sollicitudo rei socialis foram abertamente denunciadas.

 O respeito pela pessoa humana ultrapassa a exigência de uma moral individual e coloca-se como critério de base, quase como pilar fundamental, na estruturação da própria sociedade, sendo a sociedade inteiramente finalizada para a pessoa. 

Assim, intimamente ligada à responsabilidade servir a pessoa põe-se a responsabilidade de servir a sociedade, qual tarefa geral daquela animação cristã da ordem temporal a que os fiéis leigos são chamados segundo as modalidades próprias e específicas.

  família, primeiro espaço para o empenho social

 N. 40 – a pessoa humana tem uma natural e estrutural dimensão social enquanto é chamada, desde o seu íntimo, à comunhão com os outros e à doação aos outros: “Deus, que cuida paternalmente de todos, quis que os homens formassem uma só família e se tratassem entre si com espírito de irmãos” (GS. N. 24). E, assim a sociedade, fruto e sinal da sociabilidade do homem, mostra a sua verdade plena ao constituir-se comunhão de pessoas.

 Dá-se interdependência e reciprocidade entre a pessoa e a sociedade: tudo o que for feito em favor da pessoa é também serviço feito à sociedade, e tudo o que for realizado em favor da sociedade reverte-se em benefício da pessoa. Por isso, o empenho apostólico dos fiéis leigos na ordem temporal adquire sempre e de forma indissolúvel um significa de serviço ao homem indivíduo na sua unicidade e irrepetibilidade e um significado de serviço a todos os homens. 

Ora, a primeira e originária expressão da dimensão social da pessoa é o casal e a família: “Deus não criou o homem para o deixar sozinho; desde o princípio ‘homem e mulher os criou’ (Gn. 1, 27) e a sua união constitui a primeira expressão de comunhão de pessoas” (GS. N. 12). Jesus mostrou-se preocupado em restituir ao casal a sua inteira dignidade (MT. 19, 3-9) e à família a sua própria solidez (MT 19, 4-6); São Paulo mostrou a relação profunda do matrimônio com o ministério de Cristo e da Igreja (Ef. 5, 22-4, 6; Cl 3, 18-21; cf. 1Pd 3, 1-7).

 O casal e a família constituem o primeiro espaço para o empenho social dos fieis leigos. Trata-se de um empenho que só poderá ser desempenhado adequadamente na convicção do valor único e insubstituível da família para o progresso da sociedade e da própria Igreja.

 Berço da vida e do amor, onde o homem “nasce” e “cresce”, a família é a célula fundamental da sociedade. Deve reservar-se a essa comunidade uma solicitude privilegiada, sobre tudo quando o egoísmo humano, as campanhas contra a natalidade, as políticas totalitárias, e também as situações de pobreza e de miséria física, e também as situações de pobreza e de miséria física, cultural e moral, bem como a mentalidade hedonista e consumista conseguem extinguir as fontes da vida, e onde as ideologias e os diversos sistemas, aliados a formas de desinteresse e de falta de amor, atentam contra a função educativa própria da família.

 É urgente, portanto, realizar uma ação vasta, profunda e sistemática, apoiada não só na cultura, mas também nos meios econômicos e nos instrumentos legislativos, destinada a assegura à família a sua função de ser o lugar primário da “humanização” da pessoa e da sociedade.

 A ação apostólica dos fiéis consiste, antes de mais, em tornar a família consciente da sua identidade de primeiro núcleo social de base e do seu papel original na sociedade, para que a própria família se torne cada vez mais protagonista ativa e responsável do seu crescimento e da sua participação na vida social. Dessa forma, a família poderá e deverá exigir de todos, a começar pelas autoridades públicas, o respeito por aqueles direitos que, salvando a família, salvam a mesma sociedade. 

(...) Como a experiência ensina, a civilização e a solidez dos povos dependem sobretudo da qualidade humana das próprias famílias. Assim, a ação apostólica em favor da família adquire um valor social incomparável. A Igreja, por sua parte, está profundamente convencida disso, bem sabendo que “o futuro da humanidade passa através da família” (Exort. Ap., Familiaris consortio, 85: AAS 74 [1982], 188).

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PALESTRA DE MICHELINE

BUSCAR O HOMEMENCONTRAR DEUS

OS FRUTOS DO ESPÍRITO NAS RELAÇÕES HUMANAS

"Talvez o amor seja o processo

de eu conduzi-lo delicadamente

de volta a si mesmo."

Saint Exupéry

 

§  Modelo atual propagado → “não vos conformeis com este mundo (...)” Rm 12,2a. Ancorado em contra-valores, enaltecendo aquilo que o ser humano tem de pior, fundamentado na ferida provocada pelo pecado original e nas suas conseqüências.

§  TRANSFORMAR: “fazer passar ou passar de um estado ou condição a outro; converter(-se); transfigurar(-se)”. Implica conversão na esfera pessoal, mas também relacional.

§  RELAÇÕES HUMANAS: relacionar é próprio da realidade humana; baseia-se no AMOR ou na falta dele.

§  EU = OUTRO – na ótica da criança. A princípio ou no princípio de sua vida, a criança é incapaz de fazer a diferenciação.

§  EUOUTROconstrução da identidade na relação com o outro. O sujeito não conhece muito de si próprio; processo de autoconsciência precário e  prejudicado pelo contexto atual.

§  A dificuldade de firmar a construção desta identidadeenquanto capacidade de fazer a diferenciação EU / OUTRO e definireu sou eu, você é você’ - ocasiona a preservação da infância nas atitudes e conseqüentemente nos relacionamentos. Conseqüentemente, ele assume comportamentos inadequados nos relacionamentos, que o impedem de crescer, de ser ele mesmo, de ajudar o outro a crescer, de ter relacionamentos que sejam maduros, formando comunidades que sejam conformes ao projeto de Deus.

§  “Se quero ver as coisasrealmente como são... e comunicá-las como são’, devo me fazer algumas perguntas difíceis sobre os padrões de ação e reação que emergem de minha conduta; devo me perguntar o que esses padrões me revelam sobre a minha própria pessoa.”

§  MÁSCARA: peça usada para ocultar a própria identidade e esconder o sujeito da realidade. Nos relacionamentos, ela aparece como estes comportamentos inadequados referidos. Anulam o autoconhecimento e destroem a possibilidade encontros interpessoais verdadeiros que levam ao crescimento e plenitude da vida humana.

§  Para se deixar transformar é preciso aceitar o desafio de se entregar a Deus, e saber-se amado por Ele. Confiando que o resultado da transformação será uma pessoa melhor, livre do estado de infantilidade espiritual e psíquica, que nos encontramos muitas vezes. A graça de Deus em nós irá nos fazer sair de si mesmo para ir ao encontro do outro, irá delicadamente fazer cair nossas máscaras, tornando nossos relacionamentos reais e verdadeiros.

§  A ação do Espírito Santo será também ordenar este caos interior em que se encontra nossa alma: desejos, projetos, sentimentos contrastantes e em luta entre si. O Espírito Santo é o professor que nos ensina a viver neste mundo com o coração no céu, porque opera em nós o querer – a vontade de fazer o bem e ser melhor – e o agir – concretização deste bem.

§  Sua ação abrange o homem integralmentecorpo, alma, espírito. “O homem perfeito se compõe de três realidades: a carne, a alma e o espírito. Um, a saber: o Espírito Santo, salva e forma; a outra, a carne é salva e formada. A restante, aquela que fica entre as duas, a saber, a alma, ora segue o Espírito e por ele voa, ora obedece à carne e cai em desejos terrenos”.

§  Fortalecimento da associação entre o Espírito Santo e o homem. A intensa ação divina em nossa natureza gera os ‘FRUTOS DO ESPÍRITO’: amor, alegria, paz, longanimidade, benignidade, bondade, fidelidade, mansidão, autodomínio (Gal. 5, 22). “São os produtos que o terreno da nossa liberdade produz quando recebem a irrigação do Espírito”.

§  AMOR: pelo Espírito Santo o amor de Deus vem até nós, mas não termina em nós. Faz com que nos amemos em atos concretosnão em arroubamentos sentimentaisperdoar uma ofensa, amar aquele que se opõe a nós e a nos reconciliarmos. Jesus amou nossa miséria humana até ao extremo da aceitação da Cruz. Ele deu o exemplo para que o pudéssemos seguir: “amai-vos uns aos outros como Eu vos amei” (Jo 15,12). O amor para ser verdadeiro ‘tem que doer’ (Madre Teresa de Calcutá e João Paulo II).

§  Alegria:Felicidade é amar e ser amado”. Porque  recebemos o amor, conseqüentemente recebemos a alegria, enquanto fruto de uma vida conduzida pelo Espírito.

§  PAZ: afastar-se de toda agitação e inquietude, aderir à vontade de Deus procurando imitar as atitudes de Jesus são meios de se alcançar a paz. Sobretudo cultivar a confiança filial.

§  MANSIDÃO: fazendo a vontade de Deus, estamos imitando a Jesus, o Manso e Humilde de coração (Mt 11,29).

§  LONGANIMIDADE: capacidade de  suportar com firmeza contrariedades em benefício de outrem (...); paciência, resignação com que se suportam contrariedades, malogros, dificuldades, etc”.

§  BENIGNIDADE: ser generoso e complacente no tratamento com os outros. Ser benigno é também ser servidor, atendendo o outro em suas necessidades.

§  BONDADE:  atitude daquele que é sensível aos males do próximo e naturalmente inclinado a fazer o bem.

§  FIDELIDADE: lealdade em circunstâncias que sabemos que a “a porta é estreita” (Lc 13,24) e exige de nós a permanência na escolha feita.

§  AUTODOMÍNIO:  a corporalidade é o meio de expressão de nosso ser; por meio do corpo vivemos os frutos do Espírito. Equilíbrio: concedido como graça, deve ser buscado pelo homem.

Micheline de Faria Silva

OCDS – Com. Sta. Edith Stein

Divinópolis / Abril 2009

BIBLIOGRAFIA:

§  Cantalamessa, Raniero. O canto do Espírito: meditações sobre o Veni Creator. 3º ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 1.998.

§  Cantalamessa, Raniero. Subida ao Monte Sinai. 2º ed. São Paulo, SP: Loyola, 1.997.

§  Dicionário eletrônico Houaiss da Língua Portuguesa. Objetiva, 2001

§  Grun, Anselm. Imagens de transformarção. Impulsos bíblicos para mudar sua vida. Petrópolis, RJ: Vozes, 2.007

§  Hunter, James C. O monge e o executivo. Rio de Janeiro, RJ. Sextante, 2.004

§  Linn, Matthew. Cura dos oito estágios da vida. Campinas. SP. Verus, 2001

§  Nogueira, Maria Emmir Oquendo; Lemos, Silvia Maria Lima. Tecendo o Fio de Ouro. 7º ed. Fortaleza, CE: Shalom, 2006.

§  Powell, John. Por que tenho medo de lhe dizer quem sou? 19 ed. Belo Horizonte, MG: Crescer, 2.001.

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