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sábado, 13 de julho de 2013
O Caminho espiritual de Teresa
Olhando
para o ser humano descobrimos que a pessoa vive ao mesmo tempo fatos exteriores
que o ajudam a ir crescendo e fatos interiores, sem sinais visíveis de seu
passo, mas que o completam em seu círculo vital. E tão interior e invisível
que, às vezes, o próprio interessado morre sem reconhecê-lo e sem saber que o
tinha realizado.
Não é o caso de Teresa, que além de conhecer com precisão suas etapas nos transmitiu o relato que o certifica. E graças a isso conhecemos não só as datas importantes de sua vida e os acontecimentos exteriores, mas também conhecemos seu próprio itinerário espiritual.
Itinerário que começa no lar, guiada pelos exemplos e a piedade sincera e simples de seus pais que fundamentam toda sua vida, o que ela chama a “verdade de quando menina”, que não é outra coisa senão o descobrimento do fugaz e relativo desta vida, frente ao transcendente e eterno de Deus.
Algo vai movê-la a buscar o martírio ingenuamente, fugindo de casa, ou a construir ermidas no horto paterno, enquanto repete com seu irmão insistentemente aquilo de “Para sempre, sempre, sempre”. Movimento que culmina com o recurso à Virgem pedindo que seja sua mãe, quando morre Dona Beatriz.
Logo virá um tempo de esfriamento espiritual, absorvida pelo afã de comprazer e deslumbrar com seus dotes femininos a seus primos, da qual sai, à força e sem muita vontade de mãos de seu pai que a ingressa nas Agostinianas.
Será nesse convento da Agostinianas contando 17 anos, onde renasce “a verdade de quando menina”, e sua primeira inquietude vocacional, ao contato com as religiosas. Inquietude que aviva com a leitura de livros piedosos e entre eles as cartas de São Jerônimo, fazendo com que tomasse a decisão de entrar carmelita na Encarnação de Ávila, onde viverá feliz 27 anos. Primeiro cheios de fervor, depois o ingresso e a profissão e de exemplo no padecer em que desemboca a primeira enfermidade séria onde fica tolhida por três anos.
Durantes os mesmos vai se recuperando graças a São José. Inicia ao mesmo tempo uma certa “frieza” espiritual, onde quer unir sua entrega à oração, amizade com o Senhor, que chega a abandonar, com o cultivo das amizades. A leitura das Confissões de Santo Agostinho e o encontro inesperado com uma imagem de Cristo, na Quaresma de 1554, propiciam o que conhecemos como sua conversão e entrega, já sem retrocessos a uma vida espiritual intensíssima, incentivada por diferentes graças místicas, visões imaginárias, intelectuais, e alocuções com que o Senhor a regala e instrui, enquanto recorre aos doutores e espirituais que vão ajudá-la a clarear seu caminho.
Uma das visões, será no outono de 1560, a visão do inferno, em que experimenta os padecimentos do lugar que teria correspondido a seus pecados se não tivesse se convertido. Graça que a motiva o querer ser mais fiel ao “chamamento” recebido à vida religiosa, e de onde surge a criação de um convento com novo estilo de servir a Deus, e viver a fraternidade, que será o convento de São José.
A profundidade espiritual com que vive naqueles cinco anos de sossego, entregada à contemplação, fazem crescer até limites inimagináveis suas ânsias de ajudar a Igreja e de salvar almas, e como a oração deve desembocar em obras, entra de cheio a fundar Mosteiros, segundo o padrão do convento de Ávila.
Um parênteses nesta tarefa que lhe impõe a obediência no priorado da Encarnação, e sob a guia de Frei João da Cruz, facilitam o momento cume de sua vida espiritual recebendo a graça suprema do matrimônio Espiritual, que coroa sempre o caminho espiritual de quem se entrega de verdade e todo a Deus, conforme ensina a própria santa em sua obra principal: As Moradas ou Castelo Interior.
Não é o caso de Teresa, que além de conhecer com precisão suas etapas nos transmitiu o relato que o certifica. E graças a isso conhecemos não só as datas importantes de sua vida e os acontecimentos exteriores, mas também conhecemos seu próprio itinerário espiritual.
Itinerário que começa no lar, guiada pelos exemplos e a piedade sincera e simples de seus pais que fundamentam toda sua vida, o que ela chama a “verdade de quando menina”, que não é outra coisa senão o descobrimento do fugaz e relativo desta vida, frente ao transcendente e eterno de Deus.
Algo vai movê-la a buscar o martírio ingenuamente, fugindo de casa, ou a construir ermidas no horto paterno, enquanto repete com seu irmão insistentemente aquilo de “Para sempre, sempre, sempre”. Movimento que culmina com o recurso à Virgem pedindo que seja sua mãe, quando morre Dona Beatriz.
Logo virá um tempo de esfriamento espiritual, absorvida pelo afã de comprazer e deslumbrar com seus dotes femininos a seus primos, da qual sai, à força e sem muita vontade de mãos de seu pai que a ingressa nas Agostinianas.
Será nesse convento da Agostinianas contando 17 anos, onde renasce “a verdade de quando menina”, e sua primeira inquietude vocacional, ao contato com as religiosas. Inquietude que aviva com a leitura de livros piedosos e entre eles as cartas de São Jerônimo, fazendo com que tomasse a decisão de entrar carmelita na Encarnação de Ávila, onde viverá feliz 27 anos. Primeiro cheios de fervor, depois o ingresso e a profissão e de exemplo no padecer em que desemboca a primeira enfermidade séria onde fica tolhida por três anos.
Durantes os mesmos vai se recuperando graças a São José. Inicia ao mesmo tempo uma certa “frieza” espiritual, onde quer unir sua entrega à oração, amizade com o Senhor, que chega a abandonar, com o cultivo das amizades. A leitura das Confissões de Santo Agostinho e o encontro inesperado com uma imagem de Cristo, na Quaresma de 1554, propiciam o que conhecemos como sua conversão e entrega, já sem retrocessos a uma vida espiritual intensíssima, incentivada por diferentes graças místicas, visões imaginárias, intelectuais, e alocuções com que o Senhor a regala e instrui, enquanto recorre aos doutores e espirituais que vão ajudá-la a clarear seu caminho.
Uma das visões, será no outono de 1560, a visão do inferno, em que experimenta os padecimentos do lugar que teria correspondido a seus pecados se não tivesse se convertido. Graça que a motiva o querer ser mais fiel ao “chamamento” recebido à vida religiosa, e de onde surge a criação de um convento com novo estilo de servir a Deus, e viver a fraternidade, que será o convento de São José.
A profundidade espiritual com que vive naqueles cinco anos de sossego, entregada à contemplação, fazem crescer até limites inimagináveis suas ânsias de ajudar a Igreja e de salvar almas, e como a oração deve desembocar em obras, entra de cheio a fundar Mosteiros, segundo o padrão do convento de Ávila.
Um parênteses nesta tarefa que lhe impõe a obediência no priorado da Encarnação, e sob a guia de Frei João da Cruz, facilitam o momento cume de sua vida espiritual recebendo a graça suprema do matrimônio Espiritual, que coroa sempre o caminho espiritual de quem se entrega de verdade e todo a Deus, conforme ensina a própria santa em sua obra principal: As Moradas ou Castelo Interior.
sexta-feira, 28 de junho de 2013
LEITURA TERESIANA PROPOSTA PARA O ANO 2013-2014
LEITURA TERESIANA PROPOSTA PARA O ANO 2013-2014
Introdução:
AVILA – ESPANHA
14-06-2013
Querido irmãos e irmãs no
Carmelo:
A leitura de Santa Teresa – um
propósito fundamental do Carmelo para o V Centenário de seu nascimento- está
sendo fonte de revitalização, ajuda para descobrir a profundeza e riqueza de
sua espiritualidade. Nestes últimos anos compartilhamos suas obras - Vida,
Caminho de Perfeição, Fundações, Castelo Interior-, que são as mais traduzidas
e difundidas por todo o mundo. Teresa tem também outros escritos, mais breves,
mas não por isso menos valiosos, que nos confiam a intimidade e o dia a dia de
Teresa: suas experiências nas Relações, suas Exclamações, sua lírica nas
poesias; nas Cartas, testemunhas de suas preocupações e anseios. É por isso que
neste último ano de preparação ao V Centenário do Nascimento de Santa Teresa,
queremos ler estes escritos breves, que formam uma grande e rica coleção que
faria quase impossível para serem lidos em um ano em comum e em comunidade, até
para uma leitura pessoal seria quase impossível. Por este motivo, escolhemos
alguns textos. Assim queremos saborear algo desta riqueza, oferecer algumas
passagens mais interessantes. E, como diria a Santa, “engolosinar-nos”,
animar-nos a , com mais calma, a ler toda sua obra. Esta antologia é fruto das
orientações do Pe. Tomas Alvarez e o trabalho dos padres Salvador Ros, Pedro T.
Navajas e Gabriel Castro, assim como de outras religiosas da Companhia de Santa
Teresa (Projeto Nudo) . Um trabalho que agradecemos vivamente , como também
agradecemos à Editorial Monte Carmelo por ter nos colocado a disposição todos
os textos de sua edição. Esperamos que as leituras deste ano, já próximo do
Centenário, coroem esta aproximação à nossa Madre Teresa, e nos animem a
crescer em nossa vocação levados por sua mão.
Pe. Antonio Gonzales
Secretário Geral do V Centenário
Do Nascimento de Santa Teresa.
- Aqui no Brasil vai se usar a edição brasileira Edições
Loyola e
Edições Carmelitanas de 1995
- Colocaremos a numeração correspondente à obra Brasileira e
a página
1. RELAÇÕES OU CONTAS DE
CONCIÊNCIA
- Salamanca, abril 1571. Um
pequeno canto sobre o sofrimento. Êxtases.
. 15 – pg. 810
- Sevilha, fins de 1575 ou
fevereiro – março 1576. Relação de sua vida espiritual e confessores.
. 46 – pg.787
- Palencia, 1581. Seu espírito e
maneira de proceder.
. 6 – pg. 805
II. Conceitos de amor de Deus ou
Meditações sobre o Cantar dos Cantares.
Capítulo 1 – pg. 849
III. Exclamações
. Exclamação 4 – pg. 890
. Exclamação 17 – pg. 902
IV. Poesias
- Vivo sem viver em mim
. 01 – pg. 917
- Vossa sou, para Vós nasci
. 02 – pg. 963
Oh formosura que excedeis!
. 06 – pg. 971
- Busca te em mim
. 08 – pg. 979
V. Cartas
* 1 A dom Lorenzo de Cepeda, em
Quito
Ávila, 23 dezembro 1561
. 02 – pg. 1037
*2 A dom Lorenzo de Cepeda, em
Quito
Toledo, 17 Janeiro 1570
. 25 – pg. 1066
*3 A dona Luisa da Cerda, em
Paracuellos
Ávila, 7 novembro 1571
. 37 – pg. 1082
*A dona Juana de Ahumada, em
Galinduste
Ávila, 4 fevereiro 1572
. 39 – pg. 1085
*A dona Maria de Mendoza, em
Valladolid
Ávila, 7 maio 1572
. 40 – pg. 1086
*6 Ao Pe. Domingo Bañez, em
Valladolid
Só tem janeiro de 1574
. 56 – pg. 1103
*7À madre Maria Bautista, em
Valladolid
Segovia, metade ou final de
junho 1574
. 62 – pg. 1111
*8 A dom Teutonio de Braganza,
em Salamanca
Segovia, 3 julho 1574
. 65 – pg. 1115
*9 À madre Isabel de Santo
Domingo, em Segovia
Beas, 12 maio 1575
. 78 – pg. 1133
*10 Ao Pe. João Batista Rubeo,
em Piacenza
Sevilha, 18 junho 1575
. 80 – pg. 1135
*11 Ao Rei Dom Felipe II, em
Madri
Sevilha, 19 julho
. 83 – pg. 1141
*12 Ao Pe. João Batista Rubeo,
em Cremona
Sevilha, janeiro – fevereiro
1576
. 98 – pg. 1162
*13 A dom Lorenzo de Cepeda, em
Toledo
Toledo, 24 julho 1576
. 108 – pg. 1185
*14 Ao Pe. Jerônimo Gracian, em
Sevilha
Toledo, 23 outubro 1576
. 129 – pg 1224
*15 À Madre Maria de São José,
em Sevilha
Toledo, 7 dezembro 1576
. 151 – pg. 1256
*16 Ao Pe. Ambrosio Mariano, em
Madri
Toledo, 12 dezembro 1576
. 155 – pg. 1263
*17 Ao Pe. Jerônimo Gracian,em
Sevilha (?)
Toledo, 13 dezembro 1576
. 154 – pg. 1260
*18 A do Lorenzo de Cepeda, em
Ávila
Toledo, 2 janeiro de 1577
. 165 – pg. 1273
*19 Ao Pe. Jerônimo Graciano, em
Sevilha (ou Paterna) (?)
Toledo, 3 janeiro 1577
. 152 – pg. 1257
*20 A dom Lorenzo de Cepeda, em
Ávila
Toledo, 17 janeiro 1577
. 171 – pg. 1289
*21 A dom Lorenzo de Cepeda,
emÁvila
(?) Não se encontra ou 10
janeiro 1577
.176 – pg. 1301
*22 Ao Pe. Ambrosio Mariano, em
Madri
Toledo, 16 fevereiro 1577
. 178 – pg. 1305
*23 A dom Lorenzo de Cepeda, em
Ávila
Toledo, 27 e 28 fevereiro 1577
. 179 – pg. 1307
*24 À Madre Maria de São José,
em Sevilha
Toledo, 28 de fevereiro 1577
. 180 – pg. 1310
*25 A Roque de Huerta, em Madri
Toledo, 14 julho 1577
. 195 – pg. 1336
*26 Ao Rei Felipe II, em Madri
Ávila, 4 dezembro 1577
. 215 – pg. 1350
*27 Ao Pe. Hernando de Pantoja,
em Sevilha
Ávila, 31 janeiro 1579
. 271 – pg. 1440
*28 Às Carmelitas descalças de
Sevilha
Ávila, 31 janeiro 1579
. 272 – pg. 1442
*29 À Isabel de São Jerônimo e
Maria de São José, Sevilha
Ávila, 3 de maio 1579
. 282 – pg. 1454
*30 À priora e comunidade de
carmelitas de Valladolid
Ávila, 31 de maio 1579
. 283 – pg. 1460
*31 À Madre Maria Bautista, em
Valladolid
Ávila, 9 junho 1579
. 285 – pg. 1463
*32 Ao Pe. Jerônimo Gracian, em
Alcala
Ávila,10 junho 1579
. 286 – pg. 1464
*33 A dom Teotônio de Bragança,
em Évora
Valladolid, 22julho 1579
. 293 – pg. 1477
*34 A dom Lorenzo de Cepeda, em
La Serna (Ávila)
Toledo, 10 abril 1580
. 324 – pg. 1523
*35 À irmã Teresa de Jesus, em
Ávila
Medina, 7 agosto 1580
. 337 – pg. 1544
*36 Ao Pe. Jerônimo Gracian, em
Alcala
Palencia, 17 fevereiro 1581
. 357 – pg. 1573
*37 À Madre Maria Bautista, (?)
Não se encontra
*38 Ao Pe. Jerônimo Gracian, em
Alcala
Palencia, metade de fevereiro
(19 fevereiro) 1581
. 358 – pg. 1575
*39 Ao Pe. Jerônimo Gracia, em
Alcala
Palencia, 21 fevereiro 1581
. 359 – pg. 1578
*40 Ao Pe. Jerônimo Gracian, em
Alcala
Palencia, 27 fevereiro 1581
. 360 – pg. 1581
*41 A dona Juana de Ahumada, em
Alba
Segovia, 26 agosto 1581
. 384 – pg. 1611
*42 À Madre Maria de São José,
em Sevilha
Ávila, 8 novembro 1581
. 393 – pg. 1624
*43 A dom Lorenzo de Cepeda
(Filho), em Quito
Ávila, 15 dezembro 1581
. 407 – pg. 1643
*44 À priora e Carmelitas
Descalças de Soria
Ávila, 28 dezembro 1581
. 409 – pg. 1646
*45 À irmã Leonor da
Misericórdia, em Soria
Burgos, metade de maio 1582
. 426 – pg. 1663
*46 A dom Jerônimo Reinoso, em
Palencia
Burgos, 20 maio 1582
. 429 – pg. 1665
*47 À Madre Ana de Jesus, em
Granada
Burgos, 30 maio 1582
. 430 – pg. 1667
*48 À Madre Maria de São José,
em Sevilha
Burgos, 6 julho 1582
. 433 – pg. 1675
*49 À Madre Catalina de Cristo,
em Soria
(última carta de Santa Teresa)
Valladolid – Medina, 15-17
setembro 1582
. 446 – pg. 1695
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LEITURA TERESIANA PROPOSTA PARA O ANO 2013-2014
terça-feira, 25 de junho de 2013
Castelo Interior: Terceiras Moradas – Capítulo I- O homem das Terceiras Moradas
O
homem das Terceiras Moradas tem que passar “a prova do amor”, que o vai
libertar de egoísmos e ilusões narcisistas na vida espiritual. É-lhe pedido que
fixe um programa de vida espiritual e de oração e se estabilize nele. Aparecem
as primeiras manifestações de zelo apostólico, mas sobrevêm a aridez e as fases
de impotência como estados de prova: “Prova-nos Tu, Senhor, que sabes a
verdade…” (n. 9).
Sob a perspectiva bíblica, o cristão das Terceiras Moradas:
- é provado na sua autenticidade: como o jovem rico do Evangelho, como
o Apóstolo Tomé (“morramos por Vós…”);
- vive em risco permanente, até se sentir personificado nas duas figuras
paradigmáticas de David e Salomão: um, que supera o risco da queda; o outro,
que sucumbe nela.
Como
o jovem do Evangelho
Mais um passo em direcção ao interior do Castelo…, e chegamos às Terceiras
Moradas. O primeiro passo neste processo consistiu em “entrar”. Entrar nas
Primeiras Moradas equivale a “começar”, ser de verdade o que cada um é no
profundo de si mesmo e, a partir daí, pôr em movimento um processo de vida e de
relação com Deus e com os outros.
No Castelo luta-se: é a segunda etapa do processo. Para ser e viver é preciso
esforçar-se e batalhar. Agora, ao passar das Segundas para as Terceiras
Moradas, o orante espera que à luta se siga a vitória e a paz. Mas não vai ser
assim. A Santa Madre vai falar-lhe, ainda, de uma etapa de ascese, vigilância e
esforço. Vai falar-lhe da prova do amor, dos riscos de ilusão e narcisismo, da
passagem por uma espécie de adolescência do espírito.
Nesta nova etapa Teresa não teme tanto as novas provas, mas a própria pessoa,
isto é, a Santa Madre teme que a situação espiritual se converta em pedra de
tropeço para o próprio orante:
- por apoiar-se em si mesmo, naquilo que já fez;
- para exibi-lo como título diante de Deus;
- por ficar parado como se tivesse feito tudo: “Passai adiante de vossas
obrazitas” (n. 6).
Para chamar a atenção do leitor da importância de uma leitura atenta,
recomenda: “Olhai muito, filhas, a algumas coisas que aqui vão apontadas, ainda
que atabalhoadas” (n. 9).
Nesta etapa Deus actua, responde aos esforços da pessoa, mas não como o orante
espera. Deus não se faz presente “premiando” e aprovando, mas provando. Deus
entra em cena provando-nos, revelando-nos a nossa verdade moral íntima, oculta
no meio de tantas “obras” ascéticas.
Vai ser o refrão destas Moradas Terceiras: o homem é submetido por Deus à prova
do amor. Como diz a Santa Madre: “provemo-nos (…) ou prove-nos o Senhor” (n.
7); ou ainda: “Prova-nos, Tu, Senhor, que sabes a verdade, para que nos
conheçamos” (n. 9). O homem engana-se a si mesmo e Deus inicia a sua ofensiva
declarando-lhe a verdade da sua vida.
A Santa Madre vai apresentar-nos um Deus que não Se dobra aos desejos do homem,
mas um Deus que age transcendentemente e, por isso, desconcerta.
A acção de Deus vai pôr de manifesto a inconsistência e pobreza do que o homem
fez até aqui: “Passai adiante das vossas obrazitas” (n. 6); e “Ainda é mister
mais para que de todo o Senhor possua a alma” (n. 5).
Nada do que fizemos nos dá direito a nada: “Não peçais o que não tendes
merecido, nem havia de nos vir ao pensamento que, por muito que sirvamos, o
havemos de merecer” (n. 6); “Tenha-se por servo inútil”. Deus não vem atrás
“pagando”, mas vai à frente abrindo caminho de graça.
Com esta sua acção, Deus faz ver ao homem a sua soberba espiritual: o homem
quer dominar e submeter Deus, que Ele Se dobre às suas obras. Por isso, a prova
rompe os esquemas espirituais que tinham regido o homem até agora, ao mesmo
tempo que lhe abre o caminho a seguir: deixar-se conduzir por Deus.
Diante de todas as “obras” feitas até aqui, o “negócio” está em render a nossa
vontade à de Deus, como veremos no capítulo seguinte. E esta será a grande
viragem da vida espiritual.
Deus introduz o orante na aceitação do protagonismo de Deus na sua vida, a
partir de uma passividade activa da sua parte. Nesta etapa Deus começa a dar a
conhecer que é Ele que assume a iniciativa, actua, “embora muitas vezes não o
queremos entender” (n. 7).
E, por isso, vem a secura e falta de ânimo, um sentimento de desencanto. Deus
defrauda. A secura e a rudeza revelam a falta de humildade, isto é, a pouca
verdade em que caminha a pessoa, que não se abandona a Deus. Diz a Santa Madre:
“não posso acabar de crer a quem tanto caso faz destas securas, senão que é um
pouco falta dela” [humildade] (n. 6).
O orante tinha clamado a Deus para que se lhe comunicasse. Deus fá-lo agora e,
como o jovem rico do Evangelho, “lhe
voltamos as costas (…) quando nos diz o que havemos de fazer” (n. 7).
Temos aqui a caracterização das “almas concertadas” e da nova fase que se
inaugura nestas Terceiras Moradas.
Como se apresenta o orante das Terceiras Moradas? Apresenta aspectos positivos
e aspectos negativos.
Aspectos positivos:
- “Muito desejosos de não ofender Sua Majestade”;
- “Por coisa alguma fariam um pecado”;
- “Amigos de fazer penitência”;
- “As suas horas de recolhimento”;
- “Gastam bem o seu tempo”;
- “Gastam bem sua vida e fazenda”;
- “Exercitam-se em obras de caridade”;
- “Decerto que é estado para desejar”;
- “Bela disposição” para chegar às Sétimas Moradas.
Aspectos negativos:
- “Almas concertadas”;
- “Dar-lhes conselho, não é remédio”;
- “Parece-lhes que podem ensinar a outros”;
- “Canonizam [as suas faltas] … e assim queriam que outros as canonizassem”;
- “Quereriam a todos tão concertados como eles trazem suas vidas”;
- “Que todos vão pelo seu caminho”;
- “Penitências concertadas”;
- “A sua razão está muito em si”;
- Agem “com tanto senso” e “grande discrição”.
A Santa Madre aprecia aquilo que o orante destas Moradas faz, chama-lhe
“bem-aventurado”, mas põe a tónica no aspecto negativo: o estado em que vive é
mais aparente que real. Precisa de uma orientação de fundo, reorientação que
não fará por si mesmo, porque não vê que a necessita e porque está incapacitado
moralmente para levá-la a cabo. Por isso intervém Deus com uma intervenção de
amor: Deus quer que estas almas “passem adiante”. Esta acção de Deus revela o
fundo de egoísmo do orante que permanece intacto sob a aparência de uma vida
espiritual “concertada”, minuciosa e cuidadosamente programada.
O orante das Terceiras Moradas é acreditado pelas suas obras, são o seu troféu,
o pedestal sobre o qual se eleva, como veremos no capítulo seguinte.
Considera-se o “cânon” e “norma” de todos, ensinando a todos e não se deixando
ensinar por ninguém. E diante de Deus apresenta-se com exigências, pensa que
Deus lhe está obrigado a fazer mercês, a regalá-lo na oração.
Podemos dizer que o orante das Terceiras Moradas fez muitas coisas, mas ficou
intacta a pessoa. Dá coisas, não se dá. Confia só nas suas obras. Faltou-lhe o
amor que é saída de si, esquecimento de si, viver só por Ele e, para ser
curado, o orante das Terceiras Moradas tem que reconhecer que lhe falta
humildade, como veremos também no capítulo seguinte.
Em conclusão, podemos dizer que a libertação do “eu” do orante está por fazer.
E esta libertação só se dá quando o homem se abandona e se confia incondicionalmente,
em movimento de amor, nas mãos do Outro. A mudança a que é chamado o orante é
dar-se a si mesmo com amor puro, sem interesse, por Deus somente. É dar
gratuitamente.
Veremos ainda no capítulo seguinte que o orante é chamado a entregar a sua
vontade a Deus e que é o interior, a vontade, que tem que ser curada. A pessoa
cura-se na medida em que se abre total e radicalmente a Deus, rompe o cerco do
“eu”, num movimento de amor e doação. Este é o “negócio”, não a multiplicação
das obras externas.
Cristo nas Terceiras Moradas
A figura de Jesus afirma-se e cresce nestas Moradas como “modelo” da nossa
vida. Apresenta-se como Caminho e o orante é chamado a segui-Lo. Ele “pede-nos
que deixemos tudo por Ele”, já que a perfeição está em segui-Lo por caminhos de
amor, que consistem em servir o próximo. O orante é convidado a morrer por
Cristo: a morrer ao egoísmo, aos temores e medos que nascem da natureza, e a
viver em comunhão de amizade com um “Deus tão generoso que morreu de amor por
nós”. É convidado a viver as exigências do amor, tal como o expressou Cristo, a
pôr toda a sua confiança e apoio n’Ele.
Também a Santa Teresa passou por esta etapa:
Vocação das suas Terceiras Moradas
Quando a Santa Madre escreve estas páginas das Terceiras Moradas tem já mais de
sessenta anos de idade e claro que tem presente na sua memória a sua passagem
por elas. Esta etapa na vida da Santa Madre ocupa um período demasiado
prolongado, cheio de vaivéns e incertezas. Foi a década dos seus trinta anos,
iniciada provavelmente como consequência da morte de D. Alonso, seu pai, quando
ela entrava nos seus vinte e nove anos.
A morte de D. Alonso fá-la regressar, uma vez mais, “à verdade de quando era
criança”: que “tudo passa”, que “tudo é nada”… Recupera os seus ideais, a sua
tábua de salvação que é a oração, a sua determinada determinação de viver a
sério a sua consagração religiosa, de ser coerente consigo mesma e com a voz
misteriosa que a chama a partir de dentro.
Mas, neste período tudo em Teresa é tão frágil, tão quebradiço... Faz e desfaz.
Luta e sucumbe. Escreveu no Livro da Vida: “Quisera eu saber descrever o
cativeiro em que, nestes tempos, trazia a minha alma. Bem entendia eu que
estava cativa, mas não acabava de entender em quê (…) Desejava viver, pois bem
entendia que não vivia, antes pelejava com uma sombra de morte e não havia quem
me desse vida nem a podia eu tomar. E Quem ma podia dar tinha razão de não me
socorrer, pois tantas vezes me havia chamado a Si e eu O havia deixado” (V 8,
11-12).
O mesmo estremecimento se apodera da sua alma e da sua pena ao abordar agora o
tema nas Terceiras Moradas: “Certo é, minhas filhas, que estou com não pouco
temor escrevendo isto, pois não sei como o escrevo nem como vivo, quando disso
me lembro muitas, muitas vezes. Pedi-Lhe, minhas filhas, que Sua Majestade viva
sempre em mim; porque, se não for assim, que segurança pode ter uma vida tão
mal gasta como a minha? (...) Mas bem sabe Sua Majestade que só posso presumir
da Sua misericórdia; e, já que não posso deixar de ser a que tenho sido, não
tenho outro remédio, senão acolher-me a ela e confiar nos méritos de Seu Filho
e da Virgem, Sua Mãe…” (n. 3).
Aquilo que a Santa Madre recorda da sua vida nestas Terceiras Moradas, servirá
de pano de fundo à exposição que ela vai fazer desta zona do Castelo.
Teresa está convencida de que todos temos que passar por uma experiência
semelhante à sua. É a experiência agridoce da própria fragilidade, com
alternâncias de auto-suficiência e de incoerência, de ilusões e humilhações, de
firmes determinações e de dúvidas envolventes e totais; experiência da própria
insegurança radical e necessidade de descobrir a misericórdia amorosa de Deus
como tábua de salvação.
Quatro tipos bíblicos
Tal como sucedeu nas outras Moradas anteriores, Teresa recorre espontaneamente
a quatro personificações bíblicas. Um dos tipos bíblicos, elabora-o ela própria
a partir de um salmo sapiencial. O outro toma-o directamente do Evangelho. Vai
utilizá-los como verso e reverso desta etapa do caminho espiritual.
A Santa Madre inicia assim as Terceiras Moradas: “Àqueles que, pela
misericórdia de Deus, venceram estes combates e com perseverança entraram nas
Terceiras Moradas, que lhes diremos, senão «bem-aventurado o varão que teme o
Senhor»? (...) Por certo, com razão o chamaremos bem-aventurado, pois, se não
volta atrás (…), leva caminho seguro na sua salvação” (n. 1).
Neste quadro de luzes e sombras das Terceiras Moradas, o lado luminoso está
plasmado nesta personagem do salmo 111: “Bem-aventurado o que teme o Senhor”.
Bem-aventurado, enquanto se mantém no temor do Senhor.
Na linguagem bíblica, temor do Senhor, não é medo de Deus. Significa respeito e
consciência amorosa do seu papel de Deus: teme o Senhor quem “ama de coração os
seus mandamentos” (v. 2).
E prossegue o salmo apresentando este “varão ditoso”:
- “Em sua casa haverá abundância e riqueza” (v. 3);
- “O seu coração está firme no Senhor” (v. 7);
- “O seu coração é inabalável, nada teme” (v. 8);
- “Reparte com largueza pelos pobres, a sua generosidade permanece para sempre”
(v. 9);
- “Os desejos dos ímpios saem frustrados” (v. 10).
Os traços fundamentais retidos pela Santa Madre nesse tipo bíblico são a
segurança e a bem-aventurança. No Castelo, as Terceiras Moradas são um seguro
de vida só se o morador delas deposita toda a sua confiança em Deus. Uma tarefa
desta etapa espiritual é educar-se para uma ilimitada confiança n’Ele. Só a
ilimitada confiança n’Ele poderá salvar-nos da instabilidade e insegurança
permanente de nós próprios. Na realidade, o refúgio seguro não é o meu próprio
Castelo; só Deus é garantia de segurança para a minha insegurança e os meus
medos.
O segundo tipo bíblico é o reverso da medalha. Já não é uma imagem ideal como a
do salmo, mas um jovem de carne e osso, muito parecido com a Teresa dos seus
trinta anos. Na cena evangélica, narrada por São Mateus, esse jovem vem à
procura de Jesus com alma generosa. Fez tudo bem desde a sua juventude. O que é
pena é que tenha feito tudo, menos o que lhe propôs Jesus. E o jovem retira-se
entristecido (Mt 19,16-22).
Sem dúvida que Teresa se revê nesta personagem do Evangelho. Este jovem, tão
depressa generoso como tacanho, é a imagem viva dos trinta anos da Santa Madre,
quando ela oferecia ao Senhor a jóia da sua vontade (o seu amor íntegro), e
outras vezes lha retirava, quando o Senhor estendia a mão para a tomar. Já no
Caminho de Perfeição tinha recordado esse gesto e tinha-o narrado assim: “Não
são zombarias estas que se façam a Quem tantas fizeram por nossa causa; (…)
Dêmos-Lhe a jóia de uma vez para sempre, pois tantas tentámos em Lha dar; (…)
Somos repentinamente generosos, e depois tão tacanhos, que, em parte, mais
valera que nos tivéssemos detido em dar” (C 32, 8).
O morador das Terceiras Moradas deve rever-se no jovem do Evangelho e
empenhar-se na complexa tarefa da generosidade, para com Deus e com os Irmãos.
Não só oferecer e oferecer-se (“Vossa sou, para Vós nasci, que mandais fazer de
mim?”), mas recuperar-se da humilhação do fracasso e das incoerências da
própria generosidade juvenil. Sobretudo, deve esforçar-se em algo mais difícil:
aceitar que Deus tome a iniciativa, para além dos seus projectos de
generosidade. Mesmo quando a acção d’Ele me apanhe de surpresa na minha vida;
quando há intromissão dos outros no que é meu; ou nos acontecimentos que se atravessam
à frente do meu programa espiritual; ou ainda quando Ele expressamente me
ultrapassa e desfaz os meus esquemas, como ao jovem do Evangelho.
O terceiro tipo bíblico é o Apóstolo Tomé: “Morramos com Ele”. É uma personagem
que se mostra cheia de arrojo e valentia, decisão de seguir o Senhor nos
perigos e dificuldades, mas que vacilará no momento da morte e ressurreição do
Senhor.
O quarto tipo bíblico é, como já referimos, David e Salomão. São dois exemplos
de pessoas muito dadas a Deus e favorecidas por Ele mas que desfaleceram na
perseverança do bem. Diz a Santa Madre: “Duma coisa vos aviso: que nem por ser
tal e ter tão boa Mãe, estais seguras, que muito santo era David, e já vedes o
que foi Salomão; nem façais caso do encerramento e penitência em que viveis,
nem vos assegureis por tratardes sempre com Deus e exercitar-vos na oração tão
continuamente e estardes tão retiradas das coisas do mundo e tê-las, a vosso
parecer, aborrecidas” (n. 4).
Etapa de imaturidade espiritual?
Se formos à raiz da palavra grega, em Mateus, este apelida o jovem de
adolescente (“neaniskos”): “Ao ouvir Jesus, o adolescente saiu entristecido,
porque possuía uma grande fortuna” (19,22).
Na realidade a etapa que a Santa Madre descreve nas Terceiras Moradas
corresponde a uma espécie de “adolescência do espírito”, com os típicos traços
dessa etapa da vida
humana
.
Estes aspectos vai desenvolvê-los a Santa Madre, analisando-os e
caracterizando-os melhor, no capítulo seguinte. Neste capítulo primeiro
cingir-se-á a oferecer os traços principais e a preparar o leitor para tomar
consciência de que vai passar por esta zona da sua vida espiritual.
Como poderíamos caracterizar esta adolescência do espírito?
- Adolescência do espírito é, podemos dizer, esse gesto de arrojo e
generosidade primária, como a do Apóstolo Tomé na subida a Jerusalém: “Vamos e
morramos com Ele” (Jo 11,16), mas logo se converte em obstinação e resistência
diante de Jesus morto e ressuscitado.
- Adolescência do espírito é uma atitude de segurança fictícia, minada pela
realidade de uma insegurança de fundo, diante das dificuldades que
necessariamente hão-de sobrevir no caminho.
- Adolescência do espírito é a arrogância mal dissimulada, a fé secreta em si
mesmo, a convicção de que na vida do espírito – como na profissional – a
iniciativa vem de nós próprios, e que Deus e o Seu amor colaboram como alguém
de segunda. Daí que estes tais “não podem levar à paciência que se lhes cerre a
porta para não entrar aonde está o nosso Rei, por cujos vassalos se têm e o
são” (n. 6).
E a Santa Madre conclui o capítulo com uma oração: “Que poderemos fazer por um
Deus tão generoso, que morreu por nós e nos criou e nos dá o ser, que não nos
tenhamos por venturosos em que se vá descontando alguma coisa do que Lhe
devemos pelo que Ele nos tem servido (…)? (n. 8). E conclui com uma petição
final: “Prova-nos, Tu, Senhor, que sabes a verdade, para que nos conheçamos”
(n. 9).
Precisamente esta última invocação insinua o tema que irá desenvolver no
Capítulo seguinte. É necessário que o Senhor – que sabe as nossas verdades –
nos submeta à prova do amor. Passar esta prova do amor marcará a passagem de
fronteira para as Quartas Moradas.
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