I- Edith Stein, A
vocação do ser humano
I. A
vocação natural do homem
A vocação
natural do homem... do mesmo modo que a de toda a criatura, consiste em
desenvolver, na sua pureza e conforme a ordem estabelecida por Deus, o que o
Criador semeou em nós.
O especial
privilégio que o homem tem é que não se pode desenvolver somente de modo
instintivo e natural, mas como ser racional pode colaborar livremente com o seu
conhecimento e vontade.
É necessária a
formação das diversas forças do organismo humano de tal modo que corpo e alma
vivam em harmonia e não se produza um desenvolvimento unilateral contra a outra
parte.
Por isso, a
ordem tem que ser conservada, que o corpo se submeta à alma como instrumento
disposto ao serviço.
Do mesmo modo,
há que prestar atenção a todas as forças da alma: as sensitivas inferiores e as
espirituais superiores, mas mantendo as inferiores sob o domínio das
superiores.
A perfeição da
sua natureza, conforme o desenvolvimento da criatura, é em si uma glorificação
do Criador.
No homem, juntamente
com a sua vocação natural aparece, além disso, uma sobrenatural. Ele tem de se
pôr conscientemente, com o que é e o que tem, ao serviço do Criador, como filho
de Deus viver nas suas mãos e assim amadurecer na contemplação de Deus. Ser
filho de Deus é um dom da graça. Mas não é somente isso.
O homem caído,
cuja natureza já não é incólume e não possui a garantia do seu autêntico
desenvolvimento, necessita da colaboração da graça para alcançar a sua vocação
natural.
E inclusive
com a sua colaboração, o ideal de um perfeito e completo desenvolvimento da
natureza humana não se realizará na sua totalidade. Disposições pessoais e
circunstâncias condicionam uma certa unilateralidade.
(A
determinação vocacional da mulher)
II.Na
natureza de um homem
Na natureza de
um homem está previsto o seu chamado, a sua vocação e profissão: quer dizer, a
atividade, o trabalho para o qual está orientado a partir do seu íntimo.
O caminho da
vida faz amadurecer a vocação de cada um e a dá a compreender aos outros, de
tal modo que estes podem falar do chamado por meio do qual, cada um pode
porventura encontrar o seu lugar na vida.
A natureza de
um ser humano e o desenvolvimento da sua vida não se realizam casualmente, mas
são, à luz da fé, obra de Deus.
No fundo, quem
chama é Deus. Ele é quem chama cada homem à atividade que lhe corresponde, cada
individuo para o que ele é pessoalmente chamado; e, além disso, chama o homem e
a mulher ao que é próprio e particular de cada um.
Não parece
fácil distinguir o peculiar da chamada do homem e da mulher, uma vez que se
discutiu sobre o tema durante muito tempo. E, no entanto, existem muitos modos
através dos quais chega até nós o chamamento: o próprio Deus fala-nos no Antigo
e no Novo Testamento.
A diferença
descobrimos presente na natureza do homem e da mulher; a própria história nos
dá uma explicação, e as necessidades do nosso tempo falam-nos insistentemente
disso.
Tudo isto nos
apresenta um tecido multiforme; o modelo não é, tão opaco que não nos permita
identificar algumas linhas de distinção.
Não temamos,
pois fazermo-nos a pergunta: qual é a vocação do homem e qual é a vocação da
mulher? As primeiras palavras da Escritura que falam do homem nos assinalam uma
vocação comum tanto para o homem como para a mulher:
“Façamos o
homem à nossa imagem e à nossa semelhança, para que domine sobre os peixes do
mar, sobre as aves do céu, sobre os animais domésticos e sobre todos os animais
da terra e sobre todos os répteis que se movem sobre ela. E Deus criou homem e
mulher. E abençoando-os disse-lhes: Crescei e multiplicai-vos, enchei e dominai
a terra. Dominai sobre os peixes do mar, sobre as aves do céu e sobre os
animais que se movem na terra”.
Há na primeira
narração da criação do homem se fala da diferença entre macho e fêmea.
Depois lhes é
confiada uma tríplice missão: ser imagem de Deus, dar origem a uma posteridade
e dominar a terra. Não se fala diretamente aqui sobre o modo de levar a cabo
esta tríplice missão, se tem que ser cumprida de um modo diverso, se bem que se
pode considerar deste modo pela mesma distinção em sexos.
(A vocação do
homem e da mulher segundo a ordem da natureza e da graça)
III.Conhecemos
a interioridade
Conhecemos a
interioridade mais profunda da alma como morada de Deus. Pela sua
espiritualidade pura, esta interioridade é capaz de acolher nela o espírito de
Deus.
Pela sua livre
personalidade pode dar-se a Ele, visto que este dom é necessário para tal
acolhimento. A vocação à união com Deus é uma vocação à vida eterna. Já
naturalmente a alma humana, enquanto produto espiritual puro, não é mortal.
Enquanto
espiritual e pessoal, é capaz, por outro lado, de um crescimento de vida
sobrenatural, e a fé nos ensina que Deus lhe quer conceder a vida eterna, isto
é, a participação eterna da sua própria vida.
Assim a alma
individual com essa sua maneira de ser única já não é efêmera; não está
destinada a manifestar em si mesma a particularidade específica por uma duração
passageira, e no decurso desta duração a transmiti-la a seus descendentes a fim
de que seja salvaguardada mais além da vida individual: a alma individual
encontra-se destinada a uma vida eterna, o que permite compreender que deve
reproduzir a imagem de Deus de uma maneira completamente pessoal (...).
Mas quando a
vida terrestre chegue ao seu fim e tudo o que era perecedouro se separe, então
cada alma humana se conhecerá tal como é conhecida (1 Cor 13, 12), isto é, tal
como é diante de Deus: ou seja, o que Deus fez ao criá-la, o fim para o qual a
criou de maneira inteiramente pessoal, e o que ela chegou a ser na ordem da
natureza e da graça e a isto há que acrescentar principalmente: em virtude das
suas decisões livres (...).
O amor leva o
selo da maneira de ser pessoal. O que permite compreender novamente que Deus
pode ter criado em cada alma humana uma morada própria a fim de que a plenitude
do amor divino encontre na multiplicidade das almas, diferentes pela sua
natureza, um espaço mais amplo para a sua participação.
(Ser finito e
ser eterno)
IV.Ser
totalmente de Deus
Ser totalmente
de Deus, entregar-se a Ele e ao seu serviço por amor, é a vocação, não só de
alguns eleitos, mas de todo o cristão: consagrado ou não, homem ou mulher...
Todos são
chamados a seguir a Cristo. E quanto mais se avança por este caminho, tanto
mais se torna semelhante a Cristo, e visto que Cristo personifica o ideal da
perfeição humana – livre de toda a mancha, rica de caracteres masculinos e
femininos, livre de toda limitação terrena -, os seus fiéis seguidores são
elevados acima dos limites naturais.
Por isso,
encontramos em homens santos uma bondade e uma ternura feminina, uma solicitude
verdadeiramente maternal pelas almas a eles confiadas; e nas mulheres santas
uma audácia e uma disponibilidade e decisão autenticamente masculinas.
Deste modo, o
seguimento de Cristo implica o desenvolvimento em plenitude da vocação original
do homem: ser autêntica imagem de Deus; imagem do Senhor da criação,
conservando, protegendo e fazendo crescer toda a criatura que se encontra no
seu ambiente; imagem do Pai, gerando e educando – por paternidade maternidade
espiritual – filhos para o reino de Deus.
A elevação
acima dos limites da natureza, a obra mais excelsa da graça, não se alcança
somente com uma luta individual contra a natureza ou com a negação dos seus
limites. Alcança-se somente por meio da humilde obediência à nova ordem dada
por Deus.
(Ser finito e
ser eterno)
V.Perguntas
para a reflexão pessoal
- Esforço-me por descobrir cada dia a vocação que Deus me
deu?
- Sou consciente de que a minha vocação é um bem para a
comunidade?
- Aceito a minha vocação pessoal como um dom de Deus?
- Vivo unido a Deus? Deixo que a sua imagem se torne viva em
mim?
- De que modo sigo, enquanto cristão, as pegadas de Jesus?
II- Edith Stein:
Colaborar na obra da Redenção
I.O
Redentor veio ao mundo...
O Redentor
veio ao mundo para esta admirável troca. Deus se fez Filho do homem, para que
os filhos dos homens pudessem tornar-se filhos de Deus.
Foi um de nós
que rompeu o vínculo filial que nos unia a Deus, um de nós devia uni-lo
novamente e expiar o pecado. Não podia ser ninguém da geração antiga,
corrompida e bárbara. Um novo rebento, são e puro, devia ser enxertado. Ele
tornou-se um de nós; mas mais que isso: fez-se uma só coisa conosco. Eis o
mistério admirável do gênero humano: todos somos uma só coisa. Se assim não
fosse, se fossemos uns justapostos aos outros, seres autônomos e separados,
distintos e independentes, a queda de um não se teria traduzido na queda de
todos.
Então o preço
do resgate poderia ser pago e nos ser atribuído, mas a sua justiça não
abundaria sobre os pecadores, não seria possível a justificação. Mas Ele veio
para ser conosco um corpo místico: ele a cabeça, nós os seus membros.
Ponhamos as
nossas mãos nas mãos do divino Menino, respondamos o nosso Sim ao seu segue-me,
e seremos seus, e ficará aberto o caminho pelo qual a sua vida divina chegará
até nós.
Eis o
princípio da vida eterna em nós. Não é ainda a visão beatífica de Deus na sua
glória, ainda é a noite escura da fé, mas já é qualquer coisa que não é mais
deste mundo, já é participar do Reino.
Quando a
Virgem Santíssima pronunciou o seu Fiat começou o Reino de Deus sobre esta
terra, e ela foi a primeira a servi-Lo. E todos aqueles que antes ou depois do
nascimento do Menino O confessaram com palavras e obras – São José, Santa
Isabel com o seu menino e todos os que estiveram junto d’Ele no presépio –
todos tomaram parte no seu Reino.
Aconteceu de modo diverso de como se tinha
imaginado que seria, segundo os Salmos e as palavras dos profetas, o domínio do
Rei ungido pelo Senhor. Os romanos continuaram a ocupar e a dominar o País, os
sumos sacerdotes e os escribas continuaram a manter o pobre povo sob o seu
jugo. Cada um dos que pertenciam ao Senhor levava invisivelmente o Reino dentro
de si.
Não lhe foram tirados os fardos do mundo, antes,
outros se Lhes juntaram, mas o que Ele tinha encerrado dentro de si era uma
força dinâmica, que tornava o jugo suave e a carga leve. E ainda hoje é assim
com todos os filhos de Deus. A vida divina que se acende na alma é a Luz que
veio às trevas, o milagre do Natal. Quem a leva em si sabe de que falamos. Par
os outros, qualquer coisa que dela se possa dizer é um balbucio
incompreensível.
Todo o Evangelho de João é um semelhante balbuciar
a luz eterna, que é amor e vida. Deus em nós e nós Nele, nisto consiste a nossa
participação no Reino de Deus, cujo fundamento é o mistério da Encanação. (O
Mistério do Natal)
II.A
visão do mundo em que vivemos
A visão do mundo em que vivemos, a necessidade, a
miséria, e o abismo da maldade são causa suficiente para aplacar o gozo do
triunfo da luz. A humanidade luta ainda no lodo e o rebanho dos que se
libertaram dele no cume mais alto dos montes é ainda pequeno.
A batalha entre Cristo e o Anticristo ainda não se
concluiu. Nessa luta têm o seu lugar os seguidores de Jesus e a sua arma
principal é a Cruz.
Como podemos entender isto? O peso da Cruz que
Cristo carregou é a corrupção da natureza humana, com todas as consequências de
pecado e sofrimento, com os quais foi assinalada a humanidade caída. O sentido
último da Cruz é libertar o mundo da corrupção. (...)
O Redentor não estava só no caminho da Cruz e os
que O rodeavam e apertavam não eram somente os seus adversários, mas também
homens e mulheres que O apoiavam: a Mãe de Deus, como modelo dos seguidores da
Cruz de todos os tempos; Simão de Cirene, como exemplo para todos os que
aceitam o sofrimento que lhes é imposto e encontram a sua felicidade
suportando-o; Verônica, como representante das almas amantes que se sentem
impulsionadas a servir o Senhor.
Cada um dos que ao longo da história carregaram com
um destino difícil em memória do Redentor sofredor, ou voluntariamente tomaram
sobre si a expiação do pecado, ajudaram o Senhor a carregar com o seu jugo e
diminuíram, em parte, o peso brutal do pecado da humanidade. Mais ainda,
Cristo, como Cabeça, realiza a expiação do pecado nesses membros concretos do
seu Corpo Místico, que se puseram à disposição da sua obra de salvação em corpo
e alma. (...) Para isto também fomos chamados. (...)
A expiação voluntária é o que nos une verdadeira e
mais profundamente com o Senhor. É uma união que está acima da que já existe
com Cristo.
A natureza humana foge do sofrimento. E a busca do
sofrimento como satisfação pela dor é algo muito distinto da vontade de sofrer
por expiação. Não se trata de uma aspiração espiritual, mas de um desejo
sensível e não melhor que as outras paixões, mas pior por ir contra a natureza.
Somente quem tem abertos os olhos do espírito para
o sentido sobrenatural dos acontecimentos do mundo pode experimentar ânsias
pelo sofrimento expiatório. No entanto, isto só é possível àqueles em quem vive
o Espírito de Cristo, que como membros de um corpo, recebem da cabeça a sua
força, o seu sentido e a sua direção.
A expiação, por outro lado, une-nos mais
intimamente com Cristo, da mesma maneira que cada comunidade se sente mais
intimamente unida na realização de uma tarefa conjunta e como os membros de um
corpo se unificam cada vez mais no jogo orgânico das suas funções.
Assim como a união com Cristo é a nossa
beatificação e o progresso nessa união é a nossa felicidade na terra, assim o
amor pela Cruz e a gozosa filiação divina não se opõem.
Ajudar a carregar a Cruz de Cristo proporciona-nos
uma alegria forte e pura, e os que podem e têm o direito a fazê-lo, os
construtores do Reino de Deus, são os seus verdadeiros filhos. Daí que a
preferência pelo caminho da Cruz não signifique de modo nenhum que esqueçamos
que Sexta-feira Santa foi superada e a Obra de Salvação consumada. Somente os
redimidos, os filhos da graça podem ajudar Cristo a carregar com a Cruz.
O sofrimento humano recebe força expiatória somente
se está unido ao sofrimento da cabeça divina. A vida do cristão consiste em
sofrer e em ser feliz no sofrimento, em ser parte do mundo, andar pelos míseros
e ásperos caminhos desta terra e, apesar de tudo, reinar com Cristo à direita
do pai, em rir e chorar com os filhos deste mundo e cantar ininterruptamente
com os coros dos anjos os louvores de Deus, até que desponte a aurora da
eternidade.
(O Amor à Cruz).
III.A
doutrina da Cruz...
A doutrina da Cruz constitui o “Evangelium pauli”,
a mensagem que tem de anunciar aos judeus e aos gentios. É uma mensagem
simples, sem adornos, sem pretensão alguma de persuadir com argumentos
racionais. Tira toda a sua força do próprio testemunho que anuncia e este é a
Cruz de Cristo, quer dizer, a morte de Cristo na Cruz e o próprio Crucificado.
Cristo é a força de Deus e a sabedoria divina, não só enquanto enviado de Deus,
Filho de Deus e Deus ele próprio, mas enquanto crucificado.
A morte na Cruz é o meio de salvação escolhido pela
infinita sabedoria. E para demonstrar que a força e a sabedoria humana são
incapazes de conseguir a Redenção, foi dada a força de salvação àquilo que,
segundo medidas humanas, parece débil e louco: o que não quer ser nada por si
mesmo, mas deixa que só a força de Deus atue em si, o que se despojou de si
mesmo e “se fez obediente até a morte e morte de Cruz” (Fil 2, 7-8).
A força de salvação, quer dizer, o poder de
ressuscitar para a vida divina, aqueles que estavam mortos devido ao pecado.
Esta força de salvação da Cruz passou para a palavra da Cruz e, através desta
palavra, comunica-se a quantos a recebem e se abrem a ela sem pretender milagres
nem fundamentos de sabedoria humana: neles converte-se nessa força vivificante
e formativa que chamam Ciência da Cruz.
O próprio s. Paulo cumpriu isto com perfeição:
“E que eu pela Lei morri para a Lei, a fim de viver
para Deus. Estou crucificado com Cristo. Já não sou que vivo, mas é Cristo que
vive em mim. E ávida que agora tenho na carne, vivo-a na fé do Filho de Deus
que me amou e a si mesmo se entregou por mim” (Gl 2, 19-20).
(...) quantos foram batizados em Cristo foram
batizados na sua morte (Rm 6, 3ss). Submergiram-se na sua vida para ser membros
do seu corpo e, como tais, padecer e morrer com Ele, mas também ressuscitar com
Ele para a vida eterna e divina.
Esta vida chegará a nós em plenitude no dia da sua
glória. No entanto, já agora – “na carne” – tomamos parte Nele quando
acreditamos: cremos que Cristo morreu por nós para nos dar a vida. Esta fé
permite-nos ser uma coisa com Ele com a unidade que têm os membros coma cabeça
e abre-nos a torrente da sua vida. Tal é a fé no Crucificado, a fé viva que vai
unida a um abandono amoroso e constitui para nós a entrada na vida e o
princípio da glorificação futura: daí que a Cruz é o nosso único título de
glória:
“Quanto a mim, Deus me livre de me gloriar a não
ser na Cruz de Nosso Senhor Jesus Cristo, por quem o mundo está crucificado
para mim e eu para o mundo” (Gl 6, 14).
Aquele que se decidiu por Cristo, está morto para o
mundo e o mundo para ele. (...) A Cruz não é um fim em si mesma. Ela eleva-se e
impulsiona para o alto. Por esta razão, não é apenas símbolo, mas a arma
poderosa de Cristo, o cajado do pastor, com que o divino Davi sai a combater
com o Golias infernal e com o qual chama com autoridade à porta do céu e lhe é
aberta. Desde então, fluem torrentes de luz divina que envolvem a quantos seguem
o Crucificado.
(A Ciência da Cruz)
IV.Na
Nova Aliança
Na nova aliança o homem participa na obra da
Redenção por meio de uma forte relação com Cristo: por meio da fé que o une a
Ele – caminho de salvação – à verdade por Ele revelada, aos meios de santificação
que Ele oferece; por meio da esperança que o faz esperar com firme confiança a
vida prometida por ele; por meio do amor pelo qual busca todos os meios
possíveis de se unir com Ele. Esforça-se, para conhecê-Lo melhor, meditando a
sua vida e refletindo nas suas palavras; obtém a união mais íntima com Ele na
Eucaristia, e participa no prolongamento místico da sua vida vivendo o ano
litúrgico, a liturgia da Igreja.
Neste caminho de salvação não há distinção entre
sexos; daqui nasce a santidade para um e para o outro, e também a santidade da
sua relação recíproca.
A redenção levou de imediato a natureza corrompida
ao seu estado original: Cristo pôs a salvação na humanidade como uma semente de
trigo que tem de crescer, no crescimento interior e exterior da Igreja, e no
crescimento particular de cada pessoa.
Nós, que nos encontramos em via, a caminho da
Jerusalém celeste, experimentamos no nosso interior a luta entre a natureza
corrompida e o germe da vida da graça que quer triunfar e vencer toda a
enfermidade.
Vemos que as relações entre os dois sexos
manifestam de modo horroroso os efeitos do pecado original: a vida sensual
desenfreada na qual parece perdido todo o rastro de vocação superior; a luta
entre os dois sexos que discutem sobre os seus direitos e não escutam a voz da
natureza e a voz de Deus. Mas observamos também, pelo contrário, que onde a
força da graça se faz sentir, a realidade é muito diferente.
(A vocação do homem e da mulher segundo a ordem da
natureza e da graça)
V.Perguntas
para reflexão pessoal
- A
Humanidade está estreitamente unida desde a sua origem e na sua redenção
por Cristo: o que faz da solidariedade um dos valores inerentes ao homem.
Estou convencido desta afirmação? Sou solidário com toda a pessoa humana,
especialmente com os mais necessitados? Que deverá mudar na minha vida
para praticar mais a solidariedade?
- Partilho
dos sentimentos de Jesus pela humanidade, os sentimentos de um Deus que
oferece a salvação a todos e faz chover sobre bons e maus? Creio nisto? O
meu sim a Cristo é sincero? Faço dos seus sentimentos os meus sentimentos?
- Seguir
a Cristo supõe acolher o seu convite: “quem quiser ser meu discípulo, tome
a sua cruz e siga-me”. Estou realmente disposto a levar a cruz? Continuo
fiel nos momentos difíceis?
- Levar
a Cruz implica ajudar a Cristo na sua obra de redenção. Creio no valor
salvador do sofrimento vivido em união com Cristo?
- Cristo
faz-se presente na vida do homem para liberta-lo do peso do pecado e para
ajudá-lo na sua debilidade. Acredito que Deus tira força da debilidade?
Aceito a minha debilidade e ponho-a nas mãos de Deus?
- Se
quero colaborar com Cristo na sua obra de redenção tenho de começar a
esforçar-me por levar daqui em diante uma vida teologal de fé, esperança e
caridade, e de me aproximar Dele pela oração e pelos sacramentos, e de
viver em união com a Igreja, seu corpo místico, participando da sua vida
litúrgica.
III- Edith Stein, O Amor – Essência da Vida
I.Talvez a proposição expressa...
Talvez a proposição expressa mais acima: “o amor é
o que há de mais livre” tenha suscitado a surpresa e uma viva oposição.
O amor e o ódio consideram-se naturalmente como
poderes elementares que penetram com força na alma sem ela se poder defender.
Os homens tiveram já o costume de dizer, quando falam das suas inclinações e
das suas antipatias, que perante elas “nada podem fazer”.
E de fato, a alma responde à impressão que recebe
de uma pessoa de modo involuntário – amiúde desde o primeiro encontro e se não
durante um conhecimento mais longo -, com simpatia ou antipatia, outras vezes
talvez com indiferença; sente-se atraída ou recusada; e pode-se encontrar aqui
uma forma de posição do seu próprio ser em relação ao que lhe é estranho;
sente-se atraída para o que lhe promete um enriquecimento ou um desafio, e
retrocede cheia de medo diante de alguém que signifique um perigo para ela.
Por outro lado, são possíveis aqui graves ilusões:
as aparências podem esconder o ser verdadeiro do homem e, por conseguinte,
também o significado que se pode ter para os outros homens. Estes movimentos
naturais não constituem, em, algo que se poderá simplesmente não ter em conta;
mas também não seria muito racional abandonar-se a eles pura e simplesmente.
Estes movimentos naturais podem e devem ser objeto de um controle com a ajuda
do entendimento e, graças à vontade, não só é possível, mas necessário exercer
sobre eles uma influência.
Na presença do jogo das inclinações e antipatias
levanta-se o mandamento do Senhor: “amarás o teu próximo como a ti mesmo”. Tal
preceito vale sem condições nem restrições.
O próximo não é aquele que me é simpático. É todo o
homem que se aproxima de mim sem exceção. E novamente diz-se aqui: tu podes
porque deves. É o Senhor quem o exige e Ele não exige nada impossível. Ou
antes, torna possível o que seria naturalmente impossível.
Os santos, que confiando na palavra divina,
decidiram elevá-la até ao amor heroico dos seus inimigos, tiveram realmente a
experiência desta liberdade de amor. Talvez uma aversão natural se manifestasse
ainda durante certo tempo; mas não tem força e não pode atuar sobre o
comportamento que é conduzido pelo amor sobrenatural.
Na maior parte dos casos, ela cede perante o poder
superior da vida divina que enche mais e mais a alma. O amor é, no seu último
sentido, o dom do ser e a união com o amado. Aquele que cumpre a vontade de
Deus aprende a conhecer o espírito divino, a vida divina, o amor divino; e tudo
isto não é senão o próprio Deus.
Com efeito, ao executar com a mais profunda entrega
o que Deus exige dele, a vida divina torna-se a sua própria vida interior:
encontra a Deus em si mesmo, quando entra em si. Quando a alma está cheia da
vida divina, é imagem do Deus Trinitário num sentido novo e superior ao que
concerne às demais criaturas e se refere a ela própria segundo a sua estrutura
natural. (Ser finito e ser eterno).
II.O amor é dom de si ao bem...
O dom, no sentido próprio, não é possível senão a
uma pessoa. Assim o amor, no sentido pleno e próprio do termo, vai de pessoa a
pessoa, embora muitos sentimentos da espécie do amor tenham por objeto algo
impessoal. O dom conduz à harmonia; não se aperfeiçoa senão pelo acolhimento
por parte da pessoa amada.
Assim, o amor exige, para o seu aperfeiçoamento, o
dom recíproco das pessoas. Só assim o amor pode ser adesão total, porque uma
pessoa não se abre a outra senão no dom. Só na harmonia é possível um
conhecimento propriamente dito das pessoas.
O amor, nesta sua máxima realização, abrange,
portanto, o conhecimento. É, ao mesmo tempo, passivo e ato livre.
Deste modo, abrange também a vontade e constitui a
realização do desejo. Mas, o amor, na sua máxima perfeição, se realiza senão em
Deus: no amor recíproco das pessoas divinas, no ser divino dando-se a si mesmo.
O amor é o ser de Deus, a vida de Deus, a essência
de Deus. Corresponde a cada uma das pessoas divinas e à sua unidade.
... o amor é o que há de mais livre, porque não
dispõe apenas de uma emoção isola, mas do conjunto do próprio eu, da própria
pessoa... o amor deve ser sempre o dom de si, para que seja um amor autêntico.
(Ser finito e ser eterno)
III.O dom de si a Deus é...
O dom de si a Deus é, ao mesmo tempo, dom ao sim de
Deus que é amada, e á criação inteira, que dizer, a toda a essência espiritual
unida a Deus.
Mas o homem não é capaz por si só e pela sua
própria natureza de semelhante dom de amor.
Se não pode chegar ao conhecimento e ao amor
efetivamente realizado de outros homens, a não ser que eles próprio se lhe
abram amando-o – porque tudo aquilo a que damos o nome de conhecimento e de
amor dos homens não constitui senão caminhos e graus preparatórios que levam a
isto -, como chegará ao amor de Deus, que não vê, sem antes ser amado por
Ele?...
Mas para se dar a Ele amando-O, devemos aprender a
conhecê-Lo como amante. Somente assim Ele se pode abrir a nós. Em certa
mediada, o Verbo da revelação chega a este resultado e a uma orientação
amorosa, se nos atarmos ao seu significado, pertence a aceitação plena de fé da
revelação divina. Mas este conhecimento apenas se aperfeiçoa mais quando Deus
se dá Ele mesmo à alma na vida graça e da glória, quando a faz participante da
sua própria vida divina e a faz entrar nela.
A vida divina que se desenvolve na alma amante de
Deus não pode ser diferente da vida trinitária da divindade. A alma dá-se ao
ser trinitário. Entrega-se à vontade paterna de Deus que, por assim dizer, gera
novamente nela o seu Filho. Ela une-se com o Filho e queria perder-se Nele a
fim de que o Pai já não veja mais nela senão o filho. A sua vida une-se ao
Espírito Santo, transforma-se numa efusão de amor divino.
É evidente que esta imagem de Deus no espírito
criado graças à união de amor, fruto da graça e da glória, não é comparável a
nenhuma imagem meramente natural. A palavra imagem já quase que não é o termo
adequado. Deve ser compreendida no sentido em que se diz que o filho é imagem
do Pai.
Trata-se de uma autentica filiação divina.
(Ser finito e se eterno)
IV.Cristo é a Cabeça...
Cristo é a Cabeça, nós os membros do Corpo Místico,
somos membros uns dos outros, e todos os homens somos um em Deus, somos uma
vida divina.
Se deus é Amor e vive em cada um de nós, temos de
nos amar com amor fraterno. O nosso amor ao próximo é a medida do nosso amor a
Deus. Mas é um amor diferente do amor natural aos homens.
O amor natural surge entre aqueles que estão unidos
por laços de sangue, ou por afinidade de caráter, ou por interesses comuns.
Os outros são “estranhos”, não nos dizem respeito,
e chegamos a dizer que são incompatíveis conosco, e até nos afastamos deles
fisicamente. Para os cristãos não há “pessoas estranhas”.
O nosso próximo é todo aquele que está diante de
nós e tem necessidade de nós; não importa se é nosso familiar ou não, se nos
“agrada” ou não, se é ou não “moralmente digno” de ajuda.
O amor de Cristo não conhece fronteiras, nunca se
cansa, não tem repugnância da sujidade e da miséria. Cristo veio para os
pecadores e não para os justos.
E se o amor de Cristo vive em nós, então agiremos
como Ele, e iremos à procura das ovelhas perdidas.
O amor natural procura apoderar-se da pessoa amada.
Cristo veio ao mundo a fim de recuperar para o pai a humanidade perdida; e quem
ama com o seu amor, quer os homens para Deus e não para si.
Este é, sem dúvida, o caminho mais seguro para os
possuir eternamente; pois quando escondemos alguém em Deus, somos um com ele em
Deus, enquanto a tentação de o “conquistar” para nós conduz sempre – mais tarde
ou mais cedo – a perdê-lo.
Isto é válido para a nossa alma, a dos outros, e
para qualquer outro bem exterior: quem se afadiga por ganhá-lo, perde-o; quem o
entrega a Deus, ganha-o.
(O Mistério do Natal)
V.Perguntas para a reflexão pessoal
- Entrego-me aos meus
sentimentos de simpatia ou antipatia, ou esforço-me por superar essas
reações instintivas e assim ser senhor de mim mesmo?
- Tenho sempre presente na
minha vida o “mandamento do amor ao próximo”, como sinal distintivo que
Jesus deixou aos seus seguidores? Creio que é possível, com a sua graça,
chegar a pô-lo em prática?
- Sinto-me amado por Deus?
Procuro descobrir e experimentar no meu interior e na minha vida esse
amor?
- Tenho medo de amar por
temer a perder a minha liberdade? Valorizo o amor como a maior expressão
da liberdade?
- Esforço-me por ver no
meu “próximo” um membro do Corpo de Cristo, um filho de Deus?
“Quem não ama o seu próximo a quem
vê, não pode amar a Deus a quem não vê”.
Edith
Stein – Vida Eucarística
IV-.Quem
come a minha carne...
“Quem come a
minha carne e bebe meu sangue tem a vida eterna” (Jo 6, 54). O Salvador, que
sabe que somos seres humanos e que como tal permaneceremos, que cada dia
devemos lutar com as debilidades humanas, vem em ajuda da nossa humanidade de
modo verdadeiramente divino. Assim como o nosso corpo de carne necessita do pão
cotidiano, do mesmo modo também o corpo divino em nós necessita incessantemente
de se alimentar.
“Este é o pão
descido do céu” (Jo 6, 58). Naquele que verdadeiramente faz deste pão o seu pão
cotidiano, cumpre-se cada dia o mistério do natal, a Encarnação do Verbo. Este
é o caminho seguro para alcançar o “ser um com Deus”, e para crescer cada dia
com maior força e profundidade no Corpo Místico de Cristo.
Sei muito bem
que para muitos este desejo pode parecer demasiado radical. Na prática,
significa para a maior parte dos que se convertem, uma mudança total da vida
interior e exterior. E assim tem de ser!
Devemos dar
lugar na nossa vida ao Salvador eucarístico, de modo que possa transformar a
nossa vida na sua: é pedir muito? Temos sempre tanto tempo para tantas coisas
inúteis, para lermos toda espécie de notícias inúteis em livros, revistas,
jornais, para estarmos sentados ociosamente em qualquer café, para conversarmos
na rua durante um quarto de hora ou meia hora: tudo “dissipações”, nas quais
gastamos o próprio tempo e as próprias energias de modo fragmentado.
Não seria
verdadeiramente possível arranjarmos uma hora pela manhã na qual não nos
dispersemos, mas nos recolhamos, em que não gastemos mal, mas antes acumulemos
energias para sustentar todo o dia?
Porém, é
certamente necessário mais do que uma hora. Devemos viver as outras horas na
base daquela, de modo que a ela possamos retornar. Já não é possível
“deixarmo-nos distrair”, nem mesmo temporariamente.
Não podemos
escapar ao juízo daqueles com quem nos relacionamos diariamente. Mesmo que não
nos digam explicitamente uma palavra, percebemos qual a atitude dos outros em
relação a nós. Procuraremos adaptar-nos ao ambiente e, se não for possível, a
vida em comum tornar-se-á num tormento.
O mesmo
acontece também na relação cotidiana com o Salvador. Tornamo-nos sempre mais
sensíveis ao que lhe agrada e ao que lhe desagrada.. Se anteriormente estávamos
de um modo geral satisfeitos conosco, agora tudo será diverso.
Descobriremos muitas coisas em que mudar, e mudar-se-á o que se pode. E descobriremos algumas coisas que já não são apropriadas e positivas, e que todavia não mais se podem mudar.
Descobriremos muitas coisas em que mudar, e mudar-se-á o que se pode. E descobriremos algumas coisas que já não são apropriadas e positivas, e que todavia não mais se podem mudar.
Seremos então
mais pequenos, mais humildes; seremos mais pacientes e indulgentes com a palha
nos olhos dos outros, porque se conseguirá ver a trave nos nossos; finalmente
aprenderemos a suportar-nos a nós à luz inexorável da divina Presença, e a
abandonarmo-nos à misericórdia divina, que pode libertar-nos de tudo o que
rouba as nossas energias.
Há um outro
modo diverso de estarmos satisfeitos conosco, passar de ser um “bom católico”
que “cumpre o seu dever”, lê um “bom jornal”, “vota como se deve”, e para o
resto faz o que lhe parece e apraz, a uma vida vivida mão na mão de Deus, e
recebida da mão de Deus, com a simplicidade da criança e a humildade do
publicano. Contudo, quem nela avança uma vez, já não voltará para trás. Isto é
o que significa ser filhos de Deus: tornar-nos pequenos. Mas, significa, ao
mesmo tempo, tornarmo-nos grandes.
Viver
eucaristicamente significa sair das angústias da própria vida e inserir-se no
horizonte infinito da vida de Cristo. Quem procura o Senhor na sua Casa, não
quererá tê-Lo sempre ocupado falando-Lhe de si mesmo e das suas preocupações.
Começará a interessar-se pelas preocupações do Senhor.
A participação
diária no Sacrifício eucarístico arrasta-nos, sem nos darmos conta, na grande
corrente da vida litúrgica. As orações e os gestos da celebração litúrgica
tornam a representar na nossa alma, no decorrer do ano litúrgico, a história da
Salvação, e fazem-nos penetrar sempre mais profundamente no seu sentido. E o
próprio Sacrifício imprime em nós sempre mais o mistério central da nossa fé,
ponto cardeal da História da Salvação; o mistério da Encarnação e da Redenção.
Quem poderá
participar com empatia de espírito e de coração na Eucaristia sem ser ele
próprio tocado pelo espírito de sacrifício, sem ser tomado pelo desejo de ser
ele próprio e a sua pequena existencial pessoal, colaborados na grande obra da
redenção do Salvador?. (O mistério do
Natal)
II.Cristo
é o Caminho...
Cristo é o
caminho para a vida interior e o caminho para o coro dos espíritos
bem-aventurados que cantam o “Sanctus” eterno. O seu sangue é véu através do
qual entramos no santuário da vida divina.
O sacramento
do batismo e o da reconciliação nos purificam dos pecados, nos abrem os olhos
para a luz eterna, os ouvidos para a palavra de Deus e os lábios para o louvor
e para a oração de expiação, de petição e de ação de graças, que não são senão
diferentes formas de adoração, isto é, da veneração das criaturas ao Deus
Todo-Poderoso e de infinita bondade.
O sacramento
da confirmação marca e fortalece o soldado de Cristo para o testemunho corajoso
da fé. Mas é, sobretudo, no sacramento da eucaristia, no qual Cristo está
realmente presente, onde nos converte em membros do seu corpo. Quando
participamos no Santo Sacrifício e na comunhão, alimentados com a carne e o
sangue de Cristo, convertemo-nos na sua carne e no seu sangue. Só na medida em
que somos membros do seu corpo pode o Espírito da Jesus vivificar-nos e reinar
em nós:
“... o
Espírito é o que vivifica, pois o Espírito é o que dá vida aos membros; mas, só
vivifica os membros que encontra no corpo do qual é vida... Por isso, o cristão
nada há de temer tanto como a separação do corpo de Cristo. Porque quando se
separa do corpo de Cristo, já não é seu membro, e se não é seu membro já não o
vivifica o Espírito...” (S. Agostinho).
Tornamo-nos
membros do corpo de Cristo “não só pelo amor..., mas verdadeiramente pela
incorporação na sua carne: isto se realiza pelo alimento que nos deu para nos
mostrar o seu amor. Para isto veio a nós e tornou semelhante o seu corpo ao
nosso, para que sejamos um, como o corpo se une coma cabeça...” (S. João
Crisóstomo).
Como membros
do Corpo de Cristo, animados pelo seu Espírito, oferecemo-nos “por Ele, com Ele
e Nele” como sacrifício e unimo-nos ao eterno canto dos coros dos espíritos
bem-aventurados que cantam o “sanctus” eterno. Por isso, depois de receber a
sagrada comunhão, a Igreja nos faz dizer: “alimentados com tão grandes dons,
nós Vos pedimos, Senhor, concedei que os dons que recebemos sirvam para nossa
salvação e nos mantenham continuamente no vosso louvor”. (A oração da Igreja)
III.Só
com a força da graça...
Só com a força
da graça a natureza pode libertar-se das suas feridas e ser elevada à sua
autentica pureza e preparar-se para acolher a vida divina.
E esta vida
divina é a força interior da qual brotam as obras da caridade. Quem as quiser
conservar perenemente em si tem de alimentar-se continuamente na fonte da qual
surgem sempre os sacramentos, sobretudo, o sacramento do amor.
Para que a
vida de uma mulher seja modelada intimamente pelo amor divino, é necessário que
leve uma vida eucarística. Esquecer-se de si mesma, libertar-se de todo o
desejo e pretensão pessoal, ter um coração aberto às necessidades dos outros...
Tal só é possível se vive em relação íntima com o Salvador no Tabernáculo.
Quem visita o
Deus eucarístico e nele busca conselho em toda a necessidade, que se deixa
purificar pela força que emana do sacrifício do altar e se oferece a si mesmo
ao Salvador neste sacrifício, quem O recebe na Comunhão no mais íntimo da sua
alma, será atraído continuamente, cada vez mais, para a corrente da vida
divina, crescerá no Corpo Místico de Cristo e o seu coração se configurará com
o coração divino.
Existem, além
disso, outras realidades relacionados com estas. Se colocamos todas as
angústias da vida terrena no Coração divino, serão acolhidas neste Coração e a
nossa alma ficará livre para poder participar da vida celestial: caminharemos
com o Redentor pelo caminho que ele percorreu nesta vida terrena e continua a
percorrer na sua vida mística, e ao mesmo tempo, penetraremos com os olhos da
fé nos mistérios da sua vida escondida no seio da divindade.
Por outro
lado, esta participação na vida divina tem uma força libertadora que tira às
situações terrenas o seu peso e nos dá, aqui no tempo, um fragmento do eterno,
um raio da vida bem-aventurada, um caminho na luz.
O próprio Deus
nos educa para que avancemos agarrados pela sua mão por meio da liturgia da
Igreja. Daí que a vida de uma mulher plenamente católica deva ser também uma vida
litúrgica. Se ela se une a oração eclesial em espírito e verdade, toda a sua
vida se configurará com a vida da Igreja.
(O ethos da profissão feminina)
IV.A
melhor ajuda...
A melhor ajuda
para alcançar essa imagem viva do Redentor, que forma tanto a alma do educador
como a do aluno, obtém-se quando à contemplação do Cristo histórico se une a
relação com o Cristo presente: em primeiro lugar, a relação como Salvador
eucarístico. Quem o experimentou, sabe que a contemplação nunca é tão fecunda
como a realizada diante do Tabernáculo.
Todos sabemos
que a mesma coisa em tempos e circunstancias diversas produz efeitos
diferentes. Uma frase da Escritura pode ter sido lida, escutada ou pronunciada
cem vezes e ter sido captado em certo modo o seu sentido, mas pode não ter
penetrado na profundidade e ficar à superfície, como uma semente num terreno
pedregoso que não pode germinar.
E, no entanto,
num momento tudo se pode insinuar, afirmar e converter em luz que brilha, como
um fulgor que abre caminho e que ilumina os mistérios da fé e esclarece o nosso
caminho e que ilumina os mistérios da fé e esclarece o nosso caminho e
existência envolvidos pelas trevas. E isto acontece sobretudo se estamos diante
do Salvador eucarístico. Àquele que se aproxima Dele e Lhe abre a sua alma,
pondo-a nas suas mãos como material que espera ser forjado, a este forma-o.
Abre os olhos do espírito e torna-os capazes de ver e compreender o que está
escrito, e abre os ouvidos dando-lhes a capacidade de perceber e abre os lábios
para que sejam anunciadores quando, como e onde seja necessário.
Este é um dos
efeitos que provêm do Salvador eucarístico: põe a sua mão sobre nós, quando nos
aproximamos Dele, e muito mais ainda se participarmos no Santo Sacrifício de
modo conveniente, isto é, se não nos limitarmos apenas a intervir, observar e
escutar, mas participarmos no sacrifício, nos sacrificarmos com ele, nos
oferecermos sem reservas para ser tomados e transformados com Ele. O Salvador
pode entrar realmente naquele que se aproxima do altar comesses sentimentos,
incorporar-se com ele, tornando-o um membro do próprio corpo, um sarmento da
vide do Senhor.
Subentende-se
que a participação no Santo Sacrifício da Missa, a comunhão constitui o
cumprimento da união. Não existe eficácia formativa que tenha maior força. É o
próprio Salvador quem aqui é o protagonista da formação e ao educador
corresponde-lhe conduzir as crianças até Ele. (A colaboração das instituições
conventuais na formação religiosa da juventude)
V.
Perguntas para reflexão pessoal
- Que lugar ocupa na minha vida pessoal a celebração da
Eucaristia? Participo nela por obrigação? Esforço-me por entrar na
dinâmica da celebração e unir-me ao mistério de Cristo? Ou preocupo-me
mais do secundário: os cânticos, o sacerdote, o lugar, etc.?
- O essencial da celebração eucarística é a atualização da
entrega amorosa de Cristo pela nossa salvação. A Eucaristia é, para mim,
uma ação de graças ao Pai ou um simples estar ali presente?
- Cristo está realmente presente na Eucaristia como
alimento: deixo-me transformar por Ele? Se estou convencido que Ele me
transforma interiormente, porque não comungo assiduamente?
- A autêntica disposição interior para comungar Jesus na
sagrada comunhão não consiste em sentir-se totalmente livre de pecado, mas
fundamentalmente em abrir o meu próprio ser com a humildade de me
reconhecer débil e, por isso mesmo, necessitado da sua presença salvadora.
Só assim vou deixando que Jesus imprima em mim a sua imagem. Tenho
consciência disso?