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segunda-feira, 16 de maio de 2016

INTRODUÇÃO ÀS ORIGENS: HISTÓRIA DA ORDEM CARMELITA


Por que nascem as Ordens, Congregações e Movimentos religiosos?
As Ordens, Congregações ou Movimentos Espirituais surgem na Igreja por causa da busca constante do “homem religioso” pelo Absoluto: Deus. Ele mesmo sacia esta “sede”, pois Ele é “Água Viva”, é “Fonte”. Ao mesmo tempo são como que “resposta de Deus” às necessidades espirituais da Igreja e do mundo.
Em que consistem as diversas espiritualidades ou carismas dessas Ordens e/ou Congregações? Consistem no Amor, inspirado nas almas pelo próprio Deus, que é Amor.
Deus é o Amado , Aquele que é procurado com ânsias pelas almas amantes... Quando estamos “apaixonados por alguém”, não é verdade que buscamos belos e agradáveis (às vezes, divertidos) lugares para nos encontrarmos com “o namorado” e “a namorada”? Bem sabemos que, na verdade, o que mais importa é a pessoa amada por si só; mas, gostamos de ter um ambiente especial para esses encontros... Assim, as diversas Ordens, Congregações e Movimentos são como que “jardins” ou “praças” diferentes para esses encontros entre a alma e seu Amado: Deus. Nesses “jardins plantados pelo Espírito Santo”, tanto Deus como as almas encontram belas e diversas “flores” (os carismas e espiritualidade próprias de cada Ordem ou Congregação) para dar um ao outro. Cada alma, porém, se agrada mais de um tipo ou outro de “jardim”, para lá ter seus encontros com seu Deus. Isto se chama vocação .

I - ORIGEM DA ORDEM CARMELITA
A Ordem Carmelitana teve sua origem no Monte Carmelo, na Palestina. E seu espírito está caracterizado por dois elementos: sua origem Eliana, ou de Santo Elias e Mariana ou de Maria. são os germens que abrem, continuam e fecharão a história, a tradição e a espiritualidade do Carmelo.
Habitando junto à fonte de Elias, em torno de uma ermida dedicada à Virgem, com o tempo, os eremitas foram sendo conhecidos como IRMÃOS DE NOSSA SENHORA DO MONTE CARMELO e, ao longo das três primeiras décadas do século XII, puderam amadurecer sua espiritualidade e estilo de vida próprios. O Carmelo experimentou e confirmou, com santa Teresa e são João da Cruz, esta inspiração Mariana das origens. Modelo de oração e abnegação no caminho da Fé, Maria é aquela que se consagrou a acolher e a contemplar com a inteligência e o coração, a Palavra do Senhor, deixando-se guiar pelo Espírito Santo. A contemplação de Maria, como perfeita realização do ideal da Ordem, nos estimula a seguir suas pegadas a fim de que, com o coração de “pobres do Senhor”, na perene meditação da Palavra de Deus e no multiforme dom da caridade, configuremos nossa vida à dela. Assim seremos introduzidos no mistério de Cristo e de sua Igreja.



II - O MONTE CARMELO
O Monte Carmelo se eleva entre os confins da Galiléia e Samaria na Palestina. Limita-se pelo norte com Haifa, cidade marítima; pelo Sul, com as terras de Cesaréia; pelo leste com as planícies do Esdrelon e Saron e pelo oeste com o mar Mediterrâneo. Compõe-se de uma espécie de cadeias de montanhas que medem uns 30 Km de comprimento e 12 Km de largura. O pico mais alto é de 600 metros sobre o nível do mar, lugar este chamado do Sacrifício. Tanto ao pé do Monte, como em suas ladeiras e no cume, tudo cativa: os bosques, as dunas nas encostas; com o mar que se abre em frente, roubando cor e serenidade ao céu intenso do Oriente. Na primavera florescem anêmonas, margaridas, estrelas de Belém, gotas de sangue, arbustos e plantas aromáticas, elementos que contribuem para a beleza da paisagem e serviram a Salomão de inspiração para expressar a beleza da esposa do Cântico dos Cânticos: “Tua cabeça e tão linda quanto o Carmelo” (Ct 7,5).

III - PERFIL HUMANO E REGRA
III. 1 - PERFIL HUMANO
O Monte Carmelo foi com o correr dos tempos, o cenário de interessantes dramas humanos. Ali viveu Elias, o profeta, saboreando a presença divina“Vive Deus, em cuja presença estou” e, ao levantar-se como uma chama de zelo, marcou a história de Israel. Seu zelo ardoroso foi recompensado ali mesmo com a visão misteriosa da nuvem. “Eu me consumo de zelo pelo Senhor Deus dos exércitos!” Em sua mente se iluminou então, a idéia de uma sucessão espiritual consagrada ao serviço de Deus e realizou a sua obra, deixando após si uma escola e profetas, sendo Eliseu o primeiro deles. Pela montanha bíblica passaram também muitas raças e civilizações orientais e ocidentais. Os Cruzados lhe deram nova vida; foi a chegada de homens fervorosos para a vida eremítica, de maneira que se pode dizer que com eles começou propriamente a história da Ordem, entre fins do século XII e princípios do século XIII. Congregados por Aimérico de Malafaida, organizaram-se os eremitas sob a direção de São Bertoldo.

Era uma época de ressurgimento da vida eremítica, e os lugares santos, como desertos e montes bíblicos, apresentavam-se como ideais àqueles que procuravam encontrar Deus através da solidão e do silêncio. Ainda que vivendo de forma eremítica estes primitivos carmelitas, não deixaram de constituir uma pequena comunidade, na medida em que compartilhavam de interesses e necessidades comuns. (Este tipo de vida é chamado EREMÍTICA (vem da palavra eremus = deserto), isto é, vida solitária no deserto e teve seu início no século III, e como principais modelos temos São Paulo de Tebas (229-342) e Santo Antão (250-356), chamado o “Pai dos Monges”. (A palavra anacoreta é sinônima de eremita.) Como esses cristãos viviam SÓ PARA DEUS, longe do mundo passaram a ser chamados MONGES — palavra que se origina do grego: MONACHÓS (MONOS = SÓ) — que significa aquele que está só, que vive só para Deus.) Liderados por um certo Brocardo, buscaram uma organização jurídica mais sólida, demandando ao Patriarca de Jerusalém, Alberto de Vercelli, que lhes estabelecesse uma regra, tal como as demais ordens religiosas, a qual foi redigida entre 1206 – 1214.
 
III. 2 - PRINCIPAIS CONTEÚDOS DA REGRA DO CARMELO
A nova fórmula de vida delineada pelo Patriarca de Jerusalém, ressoa o eco da vida dos antigos monges da Palestina e tem como pontos essenciais :
Viver em obséquio de Jesus Cristo, servindo-O fielmente com coração puro e reta consciência, pondo somente nele a esperança da salvação, e prestando-lhe obediência na pessoa do Prior (Superior), com espírito de fé;
Permanecer na cela, meditando dia e noite a Lei do Senhor e fortalecendo o espírito com pensamentos santos, para que a Palavra de Deus esteja sempre em nossos corações e em nossos lábios, e tudo se realize pela Palavra do Senhor;
Celebrar diariamente em comum a Eucaristia e a oração da Igreja (Liturgia das Horas);
Praticar a ascese evangélica e revestir-se das armas que Deus nos dá, para viver piedosamente em Cristo;
Imitar o apóstolo Paulo na generosa laboriosidade “quem não trabalha não pode comer” e exercitar-se continuamente na mortificação, mediante a discrição que tempera as virtudes;
Instaurar uma comunhão de vida, baseada nas relações fraternas, na mútua correção caridosa, na comunicação dos bens e recíproca preocupação espiritual, sob a autoridade do Prior, posto a serviço da comunidade;
Acima de tudo, cultivar a oração contínua em solidão, espírito de vigilância evangélica.

III. 3 - QUADRO SINÓTICO DA REGRA DO CARMELO

A - REGRA ALBERTINA- dada por santo Alberto aos ermitãos do Monte Carmelo (entre 1206 – 1214). Adaptada à vida exclusivamente eremítica– celas separadas, comiam sozinhos nas celas. Ofício Divino rezado individualmente.

B - REGRA INOCENCIANA- a mesma Regra, aprovada pelo Papa Inocêncio IV em 1247 e adaptada às novas condições de vida, pois os ermitãos haviam se transladado para a Europa.
Mitigações introduzidas:
Permitido residirem nas cidades e fazerem fundações fora dos desertos;
Refeições num refeitório comum;
Ofício Divino rezado comunitariamente;
Suaviza-se a abstinência da carne;
Diminui-se o tempo do silêncio.
As mitigações foram dadas através da Bula Pontifícia: "QUAE HONOREM", em 1º de outubro de 1247. Esta será a Regra que adotará santa Teresa de Jesus ao fundar o Mosteiro de São José de Ávila em 24 de agosto de 1562.

C - REGRA EUGENIANA- Através da Bula ROMANI PONTIFICES, dada em 15 de fevereiro de 1432, o Papa Eugênio IV amenizou 3 pontos da Regra:
o jejum;
a abstinência perpétua de carne
e o encerramento na cela.
Essa versão da Regra é conhecida como “REGRA EUGENIANA” OU REGRA MITIGADA e era adotada no Mosteiro da Encarnação de Ávila, quando nele entrou santa Teresa de Jesus na idade de 20 anos, e de onde saiu para fazer a Fundação do seu 1º mosteiro da reforma, o Convento de São José de Ávila.

IV - MONJAS E ORDEM SECULAR

IV. 1 - INSTITUIÇÃO DAS MONJAS:
João Soreth – Padre Geral da Ordem, em meados do ano 1452, introduziu a instituição da ordem 2ª, ou ramo feminino do Carmelo, uma das realizações mais importantes do seu governo, que teria um desenvolvimento muito fecundo e permanente.
É certo que desde o século XIII, muitas mulheres piedosas se recolhiam em casas particulares, buscando viver, no afastamento do mundo, a prática da perfeição cristã através da oração e da penitência, adotavam como norma de vida a Regra do Carmelo. Não eram , porém, reconhecidas oficialmente como monjas. Atendendo, o pedido de afiliação por parte de diversas comunidades femininas, que desejavam professar canonicamente a Regra Carmelita, demandou uma autorização oficial ao Papa Nicolau V, o qual acedeu no dia 5 de outubro de 1452, dando às monjas o direito de compartilhar da vida do Carmelo “em toda a sua realidade”. E os Mosteiros foram se espalhando por toda a Europa.

IV. 2 - INSTITUIÇÃO DA ORDEM SECULAR:
Era comum naquela época, que os fiéis se afiliassem a uma Ordem religiosa para participar do seu espírito e de seus méritos. Assim surgiram Irmandades e Confrarias. A Ordem Carmelita Secular foi também obra de João Soreth, que conseguiu a aprovação Pontifícia em 1452. A confraria do Carmo não foi propriamente obra dele, mas foi seu organizador.
A Ordem Secular é uma associação de fiéis que se empenham por tender à perfeição evangélica no mundo, inspirando-se na espiritualidade do Carmelo Teresiano. A Ordem põe à disposição o seu patrimônio de Doutrina, de vida evangélica e oferece também a ajuda fraterna da direção espiritual.
Por sua vez, exige dos membros da Ordem Secular, a fidelidade ao Carisma da Ordem, mas na mais ampla autonomia do estilo de vida próprio dos religiosos e na plena valorização dos estados da vida secular.
Os membros da Ordem secular juntamente com Frades e Monjas, gozam dos mesmos bens espirituais de toda a Ordem.
Os ideais vocacionais da Ordem Secular são:
Amor a Deus;
Oração contemplativa;
Ascese do desapego;
Caridade fraterna e zelo Apostólico.
Tudo isto vivido na intimidade da Mãe de Deus e sob a sua proteção.
As pessoas que não puderem pertencer à Ordem Secular poderão receber o escapulário de Nossa Senhora do Carmo, que é um sinal de consagração a ela. É concedido pelos sacerdotes Carmelitas ou por outro.

V - O CARMELO - SÉCULOS XIII a XVI

V. 1 - NA PALESTINA
A partir de 1210, contando com a ajuda dos peregrinos, chegou-se a fundar até 15 Mosteiros no Oriente Médio, Tiro, Sarepta, Jerusalém, Monte Líbano, Antioquia, Deserto da Quarentena, Valin da Galiléia, sob a Regra de Santo Alberto, sendo todos eles, subordinados ao Mosteiro do Monte Carmelo Onde existiam :
 O Convento de São Brocardo, no Vale dos Mártires, cujas ruínas foram recentemente descobertas.
 O Mosteiro Santa Margarida, primeiro de monges gregos e logo de Carmelitas, a uns 5 quilômetros da fonte de Elias: grutas cavadas nas rochas imponentes que fecham o extenso vale.
 O Convento do Sacrifício, no lugar em que os arqueólogos assinalaram como o correspondente à grande façanha de Elias.
 O Convento atual do Promontório, onde Santa Helena construíra uma Basílica e onde agora se levanta o formosíssimo templo com a efígie da “Grande Milagrosa” e a gruta de Elias.
 Nos cimos provocadores de êxtases, e nos ondulados da santa Montanha palestiniana, viveram todos esses homens, rodeados de uma natureza esplêndida e apropriada para elaborar o mel da contemplação. A quietude do lugar e o silêncio fecundo os convidava para isso. A Regra que mais tarde redigiu Santo Alberto de Jerusalém e o “livro da instituição dos monges” são dados precisos do seu viver.
 A historiografia tradicional, mais piedosa que crítica, nos recorda aqueles solitários com as mais fortes cores. Homens santos e penitentes unidos a Deus. Carmelitas que sofreram o martírio; os últimos morreram no Vale dos Mártires; o Mosteiro da santa Montanha foi incendiado e os últimos eremitas que ainda viviam junto à fonte de Elias foram assassinados, enquanto cantavam a “SALVE REGINA”. ESTA, ENTOADA ATÉ HOJE NOS CARMELOS DO MUNDO INTEIRO.

V. 2 - EMIGRAÇÃO - OCIDENTE
No princípio parecia que a Ordem não sairia da Palestina, contudo o recrudescimento dos conflitos entre os cruzados e muçulmanos a partir desta época, obrigou os Carmelitas a emigrar para o Ocidente. A Sicília foi a primeira nação da Europa , que conheceu Carmelitas. A maior parte dos Carmelitas foi se estabelecer em Chipre, Sicília, França e Inglaterra nos anos de 1215 – 1238. Porém, a emigração definitiva foi no ano de 1291, com a queda de São João do Acre, último baluarte de defesa dos Cruzados na Palestina.

V. 3 - OUTRAS VICISSITUDES
Antes de se consolidar na Europa a Ordem teve que sofrer oposições sistemáticas, por muito tempo e de muitas formas.Nos novos conventos, os Carmelitas, num primeiro momento, almejaram prosseguir seu estilo de vida eremítico. No entanto, logo perceberam ser isto quase impossível, já que as condições sociais, políticas, econômicas e religiosas da Europa eram bem distintas. Floresciam e impunham-se então, como modelo alternativo de vida religiosa no Ocidente, as Ordens mendicantes, principalmente a dos franciscanos e dos dominicanos, que se voltavam mais para a atividade apostólica do que para a contemplação.
Os Carmelitas, apesar de seu carisma contemplativo, não escapariam da sua influência e, até por uma questão de sobrevivência dentro do cenário religioso da Europa do século XIII, foram incorporando certas características e costumes próprios da vida ativa. Abandonando os desertos, os Carmelitas passaram a estabelecer seus conventos nas cidades, onde desempenhariam tarefas apostólicas e pastorais. O antigo eremita que deveria permanecer na sua cela, meditando dia e noite na lei do Senhor, como determinava a Regra de santo Alberto, cedia lugar para o religioso que dividia seus momentos de oração com a pregação, o estudo e a cátedra universitária. A Ordem atribuiu como sendo uma intervenção especial de Maria, a entrega do Escapulário a São Simão Stock, no dia 16 de julho de 1251. Iniciou-se então a devoção ao ESCAPULÁRIO DO CARMO.
A Ordem começou a expandir-se num ambiente favorável. A causa que favorecia o desenvolvimento na Europa era o culto a Maria, muito agradável aos fiéis. Em 1247, sendo geral da Ordem, Simão Stock, Os carmelitas obtêm do Papa Inocêncio IV a adaptação da Regra primitiva, que regularizava as mudanças no seu estilo de vida caracterizando institucionalmente a Ordem como MENDICANTE.

VI - ORDENS MENDICANTES:
“As nobres aspirações à pobreza dentro da Igreja não haviam de perecer por completo no fanatismo e na agressividade. Para salvá-las, Deus quis suscitar no início do século XIII os fundadores das ordens - São Francisco de Assis e São Domingos de Gusmão - ditas “mendicantes” — porque viviam, em grande parte, de esmolas — também eles PREGADORES AMBULANTES, mas integrados dentro da Igreja. Estes deram origem à família que entre outras, apresentavam as seguintes notas:
Culto da pobreza não só individual, mas também comunitária, os irmãos viviam do trabalho manual ou de esmolas; eram provavelmente todos leigos, de início.
Para tornar mais eficaz a sua pregação, renunciavam a habitar em montes ou lugares retirados como os antigos monges, a fim de estabelecerem-se em centros populares; renunciavam também à estabilidade, no mesmo lugar, que os antigos monges praticavam.
Constituíram as chamadas “Ordens Terceiras” (a Primeira era a dos frades; a Segunda, a das Freiras), que se abriam às pessoas casadas, proporcionando-lhes algo da vida regular; no mundo obrigavam-se a observar normas de oração e práticas de penitência e caridade.
Por mais que se distanciassem de seu carisma fundacional, os carmelitas desse período esforçaram-se por identificar-se como Ordem contemplativa, buscando inclusive revalorizar suas raízes, estabelecendo sua origem histórica nos profetas do Antigo Testamento que habitaram o Monte Carmelo. Ao longo do século XIII, muitos Carmelitas reivindicaram um retorno às origens eremíticas da Ordem, lamentando o seu desvirtuamento. No entanto, o seu processo de transformação se desenvolvia irresistivelmente, experimentando notável crescimento durante a segunda metade do século XIII, não igualando em toda a sua história posterior.
No século XIV, muitos Carmelitas começariam a desempenhar atividades nas grandes universidades européias e a assumirem bispados. A ala que defendia o estilo de vida eremítica, mais de acordo com as origens da Ordem, vai perdendo força e influência, e o governo passaria às mãos dos doutores e catedráticos. No fim desse século, a Ordem havia atingido o seu apogeu em termos numéricos, de prestígio intelectual e político, mas, ao mesmo tempo, começava a sofrer um processo de decadência religiosa e espiritual, que se acentuaria no século seguinte.
Nesse período, o relaxamento dos costumes e do espírito da Ordem, principalmente no referente à VIDA DE ORAÇÃO, À POBREZA EVANGÉLICA E À OBSERVÂNCIA RELIGIOSA, assumiria grandes proporções, muitas vezes sendo justificadas através da própria legislação, modificada com a segunda mitigação da Regra carmelita, em 1432.
Diante disso apareceram movimentos reformadores, que a partir de diversos focos buscavam revigorar a vida religiosa da Ordem, quase propondo a retomada fiel da antiga observância, tal como estava estabelecida na Regra de santo Alberto. Eleito Geral da Ordem, João Soreth, no ano de 1451, procurou realizar uma reforma geral que, partindo dos Países Baixos, deveria encampar todas as Províncias. Seu alcance, no entanto, foi limitado. Todos os intentos de reforma fracassaram até que chegou Santa Teresa - no século XVI - e o que não puderam fazer muitos homens o conseguiu uma mulher: REFORMOU A ORDEM DO CARMO. O tronco velho se secou e a herança autêntica dos primitivos carmelitas passou de fato e de direito aos DESCALÇOS. Portanto temos três regras: a 1ª - a primitiva ninguém a segue; os Descalços seguem a segunda e os Calçados a terceira.
Durante três longos séculos, os religiosos permanecem ausentes da Santa Montanha, No século XVII, no ano de 1631, retornam, graças ao zelo e aos esforços do Padre Próspero do Espírito Santo, OCD, ganhando-o para a Reforma Teresiana. Parece ainda ouvir-se a voz do Profeta Isaías: ”A SANTIDADE SE ASSENTARÁ NO CARMELO ( Is 32,16 ).

VII - O MONTE CARMELO NOS ÚLTIMOS TEMPOS
No Monte Carmelo pediu asilo Napoleão para seus feridos. De 1914 a 1918 esteve em poder dos alemães e logo dos ingleses. Em 1948 voltam a ocupá-lo os ingleses. Nesse mesmo ano cai em poder dos judeus, e hoje o Monte forma parte de Israel.
Desde a Reforma Teresiana os carmelitas se encontram no Monte Carmelo e sucessivamente foi eremitério, missão, noviciado e casa de estudos.
Hoje o Monte Carmelo sendo morada dos Carmelitas Teresianos, não todo ele, moram aí israelitas em alguns lugares. Nos dois lugares mais importantes moram os Carmelitas: o Convento do Sacrifício e o Santuário, berço da Ordem, onde seus moradores tratam de reviver recordações antiqüíssimas bordadas de histórias e de lendas.
Parece todavia ouvir-se a voz de Isaías que disse: “A santidade se assentará sobre o Carmelo”, repetido como num eco pelo profeta Jeremias: “Conduzi-os à terra do Carmelo para que comêsseis os seus melhores frutos”.

VIII - ELEMENTOS DA TRADIÇÃO MONÁSTICA – SANTO ITINERÁRIO
1. Em primeiro lugar, já que decidiram entregar-se à vida eremítica em grupo (não cada um por si individualmente), deverão eleger, eles mesmos, um superior que os presida. Tal superior os governará com o parecer e colaboração de todos, viverá na cela mais próxima da entrada do eremitério, para poder atender mais facilmente aos que se aproximarem com intenção de associar-se ao grupo, e ele se encarregará de examinar os candidatos e de dispor as coisas de maneira oportuna para sua iniciação e admissão a esse gênero de vida. Considerar-se-á humilde servidor de todos e todos o obedecerão e honrarão como ao representante de Cristo em meio deles.
2. Cada um habitará em uma gruta ou cela independente.
3. Dedicados dia e noite a meditar a Palavra do Senhor e velando em oração.
4. A não ser que estejam ocupados em outros afazeres.
5. Cada manhã reunir-se-ão para a celebração da Eucaristia.
6. Será comum tudo quanto possuírem e se distribuirá entre todos, segundo a idade e necessidades de cada um.
7. Ao menos uma vez por semana deverão reunir-se para trocar impressões sobre a guarda destes pontos fundamentais da Regra e tratar da salvação das almas. Se houver alguma falta em alguém ou no grupo, aproveitar-se-á esta reunião para corrigi-la.
8. A comida será austera, abstendo-se sempre de comer carne e jejuando desde a Exaltação da Santa Cruz até a Páscoa, a não ser que por enfermidade ou debilidade, ou outra justa causa, haja que se prescindir do jejum ou abstinência, pois a necessidade não tem lei.
9. O Patriarca os exorta, em seguida, a viver de fé, esperança e caridade, nunca esquecendo que a vida é uma contínua luta e que todos os seus esforços hão de ser dirigidos a conquistar o amor a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmos, esperando sua salvação só do Salvador.
10. O trabalho, elemento essencial em toda a tradição monástica, deve ser abraçado com perseverança, à imitação de São Paulo, como meio para ganhar o próprio sustento e também evitar a ociosidade que abre a porta a toda sorte de tentações do demônio.
11. Pré-requisito indispensável para meditar dia e noite a lei do Senhor é o silêncio. Por isso, deverão evitar durante o dia os excessos no falar e à noite, desde a hora de Vésperas até a hora de Tercia, se recolherão em oração, abstendo-se de toda comunicação entre eles.
12. E se alguém se achar com forças para acrescentar algo mais a quanto aqui se estabelece brevemente – conclui Alberto – poderá fazê-lo, que o Senhor quando voltar lhe dará a paga; porém, procedendo sempre com discrição, própria da verdadeira virtude.
Trata-se, como se vê, de uma síntese perfeita dos elementos mais importantes da convivência monástica, enunciados de forma suficientemente explícita para pessoas adultas entregues de cheio a viver esse ideal.
Este é o primeiro documento histórico que possuímos dos momentos transcendentais nos quais se estava gestando a Ordem do Carmo. A este primeiro núcleo, seguirá uma cadeia ininterrupta de pessoas que, atraídas pelo mesmo ideal, ir-se-ão dando a mão, umas às outras, ajudando-se mutuamente a percorrer o mesmo caminho. Cada geração irá assimilando, à sua maneira, esse ideal e também as circunstâncias históricas irão influindo em sua configuração externa e em sua transmissão através dos séculos.
Os dois elementos mais importantes que, ainda que ausentes no texto da Regra, aparecem em seguida e caracterizarão a vida do grupo ao longo de sua história, são a presença de Maria, escolhida desde o princípio como patrona – titular da primeira igreja dos ermitães latinos do Carmelo – e o Profeta Elias, cuja lembrança continuava viva não só no nome de sua fonte, senão sobretudo, na alma dos ermitães.
À aprovação do Patriarca de Jerusalém acrescentou-se a aprovação pontifícia de Honório III em 1226 e Gregório IX em 1229, o que significa uma consolidação também jurídica do que era já uma realidade viva, consistente e capaz de superar toda espécie de dificuldades.
Por isso, quando as circunstâncias externas foram mudando e o ambiente do Carmelo foi tornando-se cada vez mais inseguro por causa do retorno dos sarracenos, os ermitães começaram a pensar em buscar outras montanhas e outras grutas, pois seu ideal não estava condicionado por nenhum lugar. E, assim, foram aparecendo a partir de 1238, comunidades de Carmelitas em diversas nações do Ocidente: Chipre, França, Inglaterra, Alemanha, Itália.
Esta mudança de ambiente levou os Carmelitas a uma evolução também interior e a uma ampliação – se é lícito falar assim – de seus horizontes. Entram em contato com o novo fenômeno religioso constituído pelas Ordens Mendicantes e assimilam vitalmente seu espírito e sua estrutura, recebendo de Inocêncio IV em 1247 a aprovação oficial.
Se os ermitães que recorreram ao Patriarca Alberto 40 anos antes, não tinham talvez intenção de fundar uma Ordem propriamente dita, se a “norma de vida” que o Patriarca lhes deu estava destinada só a uma comunidade, agora, com a Bula de Inocêncio IV, o texto albertino retocado converte-se em uma das Regras monásticas e os Carmelitas em Ordem Mendicante. Este é o significado mais importante da aprovação inocenciana. Quanto ao texto de Alberto, não possuímos nenhuma transcrição com inteiras garantias. Deduz-se, com bastante probabilidade, comparando o texto transmitido por Ribot com o texto de Inocêncio, que chegou intacto até os nossos dias: a Inocêncio deve-se talvez a prescrição de recitar o Ofício divino em comum, segundo o costume da Igreja; certamente devem-se-lhe as cláusulas que se referem à refeição em comum, às refeições fora de casa, a possibilidade de fundar não só em desertos, senão onde acharem oportuno, os limites do silêncio da noite desde as Completas até depois de Prima.
Do esplendor adquirido pela Ordem do Carmo sob a Regra inocenciana nos dão uma idéia as 9 províncias nas quais se dividiu em 1287, 12 em 1318, 14 em 1321, 18 em 1362, com um total de uns doze mil religiosos em meados do século XIV. Entre seus santos, destacam-se Alberto da Sicília (segunda metade do século XIII), B. Franco de Sena (1291), Pedro Tomás (1366), André Corsini (1373) e o B. Nuno Alvarez Pereira (1431).
Também no cultivo das ciências eclesiásticas participaram ativamente os Carmelitas, sobretudo desde o final do século XIII, alcançando, os estudos na Ordem, sua máxima expansão durante o século XIV. Porém, as diversas circunstâncias históricas que levaram à decadência geral da Igreja na segunda metade do século XIV afetaram também, como às demais Ordens, à Ordem Carmelitana. Em primeiro lugar a peste negra (1348-1350) assolou conventos e províncias inteiras, produzindo, em alguns casos, uma verdadeira ruptura com a tradição anterior, pois ao repovoarem-se os conventos vazios, entraram pessoas sem vocação suficiente, assustadas com a peste, e as que tinham verdadeira vocação nem sempre encontraram mestres para as educar na vida religiosa.
O cisma do Ocidente (1378-1417) agravou a situação, dividindo a Ordem sob as duas autoridades opostas de Roma e Avinhão, e fazendo sentir nos religiosos e nos fiéis as conseqüências negativas das dissensões no vértice da Igreja. Finalmente a guerra dos cem anos entre Inglaterra e França (1337-1435), com o que isso supõe de incêndios, destruições e falta da serenidade necessária para o florescimento dos estudos e da vida monástica, completa este quadro escuro de circunstâncias históricas que convém ter presente para compreender a história do século XV e do século XVI. Desde o Concílio de Constanza (1414-1418) até o de Trento (1545-1563), o problema mais urgente da Igreja e das Ordens religiosas será o da Reforma. E a Ordem do Carmo também trabalhou com perseverança até ver seus esforços coroados de sucesso.
A situação em que se achava a Ordem em princípios do século XV moveu os superiores a pedir à Santa Sé uma nova adaptação da Regra, que servisse de base à restauração. A disciplina do jejum e da abstinência estabelecida pelo Patriarca Alberto e aprovada por Inocêncio IV, fazia com que os jovens do século XV que desejavam entrar na Ordem, se sentissem retraídos, e sem jovens não se podia sonhar com uma possível renovação.
Por outro lado, os religiosos já professos, se a observassem ao pé da letra estragavam a saúde, e se não a observassem ficavam com escrúpulos. Também tinham problemas com a interpretação rigorosa da passagem da Regra que ordena estar dia e noite nas celas meditando na lei do Senhor e velando em oração. Por tudo isso, o capítulo geral celebrado em Nantes em 1430, decretou pedir ao Papa um esclarecimento ou mitigação desses pontos, e Eugênio IV concedeu-a com a Bula Romani Pontificis, datada de 15 de fevereiro de 1532 e expedida em 1435. A Bula concede a faculdade de comer carne três vezes por semana e que, em horas convenientes possam sair de suas celas para dar uma passeio pelos claustros ou estar um tempo na igreja. Note-se que Eugênio IV não retocou o texto da Regra. Limitou-se unicamente a essas declarações marginais, deixando em sua integridade o texto aprovado por Inocêncio IV.
Com esta nova aprovação pontifícia, recebe novo impulso o trabalho de restauração da Ordem, que foi, pouco a pouco, levando-se a termo através do trabalho pessoal dos Gerais e com diversas iniciativas provenientes também da base e que deram origem ao fenômeno comum das Congregações reformadas. Praticamente em todas as Ordens houve esse fenômeno. Na do Carmelo as mais importantes foram a Mantuana (1413-1783) e a de Albi (1499-1602). Por ser impossível a reforma simultânea de toda a Ordem, dava-se a oportunidade a alguns conventos de formar um núcleo reformado com superior ou vigário próprio, dependente diretamente do Geral para que se mantivessem mais facilmente em seu propósito. Tratava-se, naturalmente, de um fenômeno passageiro que devia cessar no momento em que o restante dos conventos estivessem convenientemente reformados e resultasse desnecessário o governo próprio. De fato, vemos que depois de uma duração mais ou menos longa em sua independência, todas as Congregações foram reincorporadas plenamente no seio da Ordem. Também se compreende facilmente que nem sempre as relações entre as congregações reformadas e o governo central fossem cordiais, o que às vezes diminuiu a eficácia destas iniciativas reformadoras. As dissensões, fáceis de compreender sempre que nasce um grupo novo dentro de uma instituição, provinham às vezes dos excessivos privilégios obtidos pelos reformados e de um proselitismo exagerado que, ao querer anexar novos conventos à reforma, perturbava a convivência pacífica com os que preferiam seguir um ritmo mais lento. Havia também religiosos que passavam à reforma mais por interesses egoístas que por afã de perfeição e, naturalmente, complicaram as coisas.
Os Gerais que mais se distinguiram por seu trabalho na reforma da Ordem foram o Beato Soreth (Geral de 1451 a 1471), o Beato Batista Mantuano (1513-1516), Nicolás Audet (1524-1562) e, finalmente, Juan Bautista Rossi (Rubeo), vigário geral em 1562 e Geral desde 1564 até 1578. Com o pleno acolhimento dos decretos da reforma do Concílio Tridentino, a Ordem recuperou sua antiga prosperidade, alcançando o número de 15.000 membros antes das supressões dos séculos XVIII e XIX.
O ideal da Ordem manteve-se sempre o mesmo, desde que, com a aprovação de Inocêncio IV, associou à contemplação o apostolado, ainda que as formas concretas em que se foi vivendo foram adaptando-se às circunstâncias históricas e o breve texto da Regra foi explicado e comentado através das Constituições e de numerosos tratados espirituais.
Também a devoção à Santíssima Virgem e a Santo Elias, que caracteriza a vida dos Carmelitas, foi expressando-se de diversas formas com o correr dos tempos, porém, sempre dentro de uma continuidade. Em Maria encontram a personificação mais perfeita da aspiração do Carmelo à união com Deus. “Maria é o ideal vivido da vida carmelitana: vida de escuta da Palavra de Deus e entrega total a seu serviço na obra da salvação”. A figura de Elias, modelo e inspirador da vida monástica desde suas origens e exemplo de homem de oração, foi calando cada vez mais fundo na espiritualidade da Ordem, que chegou inclusive a considerá-lo durante alguns séculos, como seu verdadeiro fundador no sentido estrito da palavra.

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Parte do texto retirado do www.mosteirosaojose.com.br , e do livro

O Carmelo Teresiano Páginas de sua História 

sexta-feira, 13 de maio de 2016

INTRODUÇÃO AO ESTUDO DA REGRA DE SANTO ALBERTO
( Regra do Carmelo )
Por ocasião do 8º Centenário da mesma.


            "Por que uma Regra? E por que Regra ainda hoje?"

1º Ponto  -  Por que uma Regra?
            "Antes de se tratar da Regra de Santo Alberto ou de qualquer outra, é bem adequado responder a perguntas como essas. Para se compreender isto, temos que nos transferir aos inícios do cristianismo e estudarmos um pouco as situações vividas nas comunidades eclesiais e pelos cristãos individualmente com respeito ao conhecimento e ao manuseio dos Livros Sagrados do Novo e do Antigo Testamento. Temos que considerar que a Bíblia não estava compilada ainda da forma como ela se apresenta hoje. A própria redação dos livros do Novo Testamento não se fez de uma só vez. A mensagem evangélica, originalmente, era passada de viva voz nas reuniões litúrgicas e de pessoa a pessoa. Só depois de certo tempo é que circularam alguns escritos, uns vinte e mais anos depois da morte e ressurreição de Cristo. A constituição do elenco dos livros do Novo Testamento se fez aos poucos. E tinham que ser reconhecidos como inspirados pelas comunidades. As línguas em que estavam escritos não eram de acesso geral. Não havia cópias disponíveis aos indivíduos para uso pessoal, e as que havia custavam caro pela tecnologia existente à época (estava-se muito longe ainda sequer da “imprensa” de gravação de textos fixos, e mais ainda da imprensa com tipos móveis de Guttenberg, no século 15). Tudo dificultava o amplo acesso ao conteúdo da Revelação. Usava-se o grego nos textos do Novo Testamento que, além do latim, era a língua mais falada no Império Romano. Na periferia do Império, e aos povos conquistados ou absorvidos nele, os romanos ensinavam sua língua, o latim. A esses povos o grego bíblico se constituía como um impedimento. O Papa Dâmaso, em 382, ordenou ao presbítero São Jerônimo que fizesse uma compilação de todos os textos bíblicos do Antigo e do Novo Testamento e sua versão para o latim falado pelo povo. O trabalho só foi concluído pelo ano de 405. A Bíblia traduzida por São Jerônimo será apelidada mais tarde de "Vulgata", exatamente pelo esforço de oferecer um texto latino mais compreensível ao povo de Deus.
            Diante de todas as dificuldades apontadas já se percebe as dificuldades de acesso aos textos da Sagrada Escritura. Acrescente-se a mais: a grande dispersão das comunidades cristãs pelo Império Romano; as distâncias enormes entre as comunidades; os meios de transporte e comunicação bastante precários, o que dificultavam grandemente a existência de um controle centralizado da Igreja; as repetidas perseguições aos cristãos; a decadência advinda à Igreja depois do seu reconhecimento oficial e com as invasões bárbaras, etc. A reação em busca de uma maior autenticidade da vida cristã surgiu com o monasticismo. Se antes disto os autores cristãos usavam esparsamente os textos bíblicos de que dispunham e com os mesmos argumentavam em suas obras, os primeiros monges necessitavam dos mesmos para compor sínteses deles para facilitar aos que não podiam manuseá-los a organizarem suas formas de vida religiosa, dando origem assim às "regras". No Oriente, as regras de S. Pacômio (cerca do ano de 330), e a de São Basílio, igualmente do século 4º (cerca de 340).
No Ocidente, a primeira regra foi a de Santo Agostinho, por volta de 391. A de São Bento, no século 6º. A de Santo Alberto (Regra dos Carmelitas), entre 1207 e 1214. A de São Francisco, aprovada oralmente pelo Papa Inocêncio 3º, em 1210; e por Bula do Papa Honório 3º, em 1223.
            Já em 1215, o 4º Concílio de Latrão estabelece uma proibição de novas Regras e novas Ordens religiosas. Os franciscanos se valem da aprovação oral anterior de sua regra. Os carmelitas, da carta de Santo Alberto, anterior a 1215. Já os dominicanos acolhem para viver a Regra de Santo Agostinho.
            Mas, voltemos à questão inicial, por que uma Regra? Resumindo todos os detalhes já explicados, pode-se trazer, além do contexto aduzido, outros elementos de ordem prática, a saber: é algo muito prático, textos curtos, seguros, fáceis de memorizar, indicam um caminho provado de santificação pessoal, se constituem como uma referência direta para avaliação individual e comunitária. Seus conteúdos apresentam, por assim dizer, uma súmula do Evangelho, dos Atos dos Apóstolos, das epístolas dos apóstolos, principalmente das de São Paulo. Conteúdo, portanto, bíblico. Algumas Regras, como a de São Bento, com larga citação do Antigo Testamento, particularmente, dos Salmos e dos Livros Sapienciais. Ainda, seus apelos e motivações são dirigidos pessoalmente ao leitor e lhe são propostos quadros de vida e normas de conduta.

2º Ponto  -  Por que Regra, ainda hoje?
            Está certo que além das restrições instrumentais, técnicas, históricas ao uso da Sagrada Escritura, outras restrições também foram criadas na Igreja Católica no correr dos séculos, "justificadas" por receios de interpretações errôneas individuais ou grupais que levassem a uma desagregação eclesial; por cuidados morais, considerando o despreparo do povo de compreender certos comportamentos humanos em textos descritivos da história de Israel, comportamentos esses nem sempre de conformidade com os desígnios divinos de salvação, etc. Também a questão da língua em que os textos circulavam: nem todos a conheciam e, muitas vezes, muitos cristãos, embora capazes de se comunicarem nessa língua, não eram igualmente capazes de a lerem. Já a partir do século 4º os povos romanizados não falavam o latim clássico e também não o grego falado em Roma.
            Mesmo o latim da "Vulgata" nem era assim tão entendido pelo povo, mais pelos letrados. E com o correr dos séculos, mais e mais os povos se distanciavam do latim, emergindo os dialetos, berçários das línguas neolatinas. Alguns exemplos podem nos fazer compreender essa realidade quando nove séculos mais tarde nem esse latim vulgar era mais entendido. Assim, São Francisco, no século 13, por não entender os ritos sacramentais e a Santa Missa, recorria a pessoas doutas que os explicassem. Nem sequer todos os padres o entendiam. Santa Teresa d'Ávila no século 16, também não era versada em latim, apesar de ter que passar horas e horas no coro rezando os Ofícios em latim. Seu pai, homem fidalgo e rico, dispunha em sua biblioteca um exemplar dos Evangelhos traduzidos em Espanhol. Nesse período, também foi publicado na Espanha a Bíblia numa tradução poliglota. Não seria difícil a seu pai ter tido acesso a tal aquisição, mas não se pode afirmar por falta de prova documental. Após sua morte, muito provavelmente Teresa  -  inventariante  -  já religiosa, o reteve consigo para seu uso, além de outros livros, como os “Comentários de São Jerônimo sobre o livro de Jó” e outros livros de espiritualidade. Depois, vários desses livros lhe foram tirados pela Inquisição. Nesse tempo, então, já havia Guttemberg inventado a imprensa (1456) e publicado várias edições da Sagrada Escritura, mas em latim. Mesmo assim, eram obras muito caras e de tiragens reduzidas, para poucos.
            Lamentavelmente, só com a ruptura causada pelo cisma luterano, no século 16, o Reformador realiza uma tradução da Bíblia para a língua alemã.
            No âmbito católico, tudo continuava aproximadamente como nos séculos anteriores, com a versão latina da "Vulgata" autenticada pelo Concílio de Trento e com todas as restrições antes aqui assinaladas, até os albores do século 20. Com os estudos bíblicos e de arqueologia bíblica desenvolvidos dentro do protestantismo, outros estudiosos católicos se movimentaram igualmente criando grupos de pesquisadores, escolas de estudo bíblico e um movimento para pôr a Bíblia na ordem do dia com as traduções que foram surgindo. Esse movimento bíblico católico vai desembocar no Concílio Vaticano 2º (1962-1965), que não apenas ratifica todo esse esforço para pôr a Bíblia nas mãos e no dia a dia do povo católico (cf. Dei Verbum) como aprova a utilização do vernáculo em todos os atos litúrgicos, sobretudo na Santa Missa. Assim, chega cada vez mais próximo do povo a Palavra de Deus contida na Sagrada Escritura. A partir daí, crescem os cursos de introdução à Bíblia, multiplicam-se os círculos de reflexão a partir da Bíblia, mais e mais o povo bebe diretamente da fonte da Palavra de Deus a orientação para a sua vida. A Bíblia se faz regra de vida para os católicos.
            Cabe, então, novamente se trazer a pergunta que ensejou todo este desenvolvimento, a saber: ainda hoje, uma Regra é necessária? Ao que se pode responder assim: se não de todo necessária  -  porque afinal os Evangelhos estão aí nas mãos do povo cristão a indicar o caminho do seguimento de Jesus Cristo (PC 2a)  -  mas, sem dúvida alguma uma Regra ajuda muito quando representa uma modalidade pedagógica de expressar uma determinada espiritualidade de um grupo eclesial que a vivenciou; se constitui como um referencial básico, breve e simples de conferir; e, quando vivida em comunidade, declara uma concordância e estimula sua prática por consenso espiritual fraterno."

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Palestra de improviso feita por Gustavo Castro no Carmelo de Camaragibe, PE, em 4 de agosto de 2007.


A Torre Fundamentada Na Regra De Vida

 

– Frei Wilson Gomes do Nascimento

“Já não sois estrangeiros nem migrantes, mas concidadãos dos santos. Sois da família de Deus. Vós fostes integrados no edifício que tem como fundamento os apóstolos e profetas, e o próprio Jesus Cristo como pedra principal. É nele que toda construção se ajusta e se eleva para formar um templo santo no Senhor. E vós também sois integrados nesta construção, para vos tornardes morada de Deus pelo Espírito” (Ef. 2, 19-22)
“...devemos sempre nos considerar alicerces dos que vierem depois... procure ser uma pedra que volte a erguer o edifício, pois o Senhor ajudará” (F 4, 6-7)



No dia 25 de janeiro deste ano, dia da conversão de são Paulo, caíram três edifícios no centro da cidade do Rio de Janeiro. O edifício maior tinha vinte andares, o segundo prédio: dez andares e o terceiro edifício: seis andares. Como já era noite, por volta das 20:30hs e os prédios eram comerciais, o desastre e as vítimas foram em menor proporção. Não desconsidero, porém, que cada vida humana tem um valor infinito.
Muitos dias depois, ainda não se sabiam as causas do desabamento. Alguns levantam como hipótese mais provável reformas realizadas no edifício maior sem as devidas licenças da prefeitura e sem o acompanhamento de um engenheiro. Tais reformas teriam atingindo as estruturas e as vigas de sustentação, o que levou o edifício ao chão e com ele, outros dois menores.
Este desastre teve uma grande repercussão na mídia (TV, rádio, revistas e jornais), comovendo a cidade e todo o país. Nosso arcebispo, dom Orani, pediu no dia 29 de janeiro (domingo) orações em todas as paróquias na intenção das vítimas do desabamento e de seus familiares, marcando a missa de sétimo dia na catedral. Esta é a solidariedade da nossa Igreja.
A razão de contar este triste fato é a de refletirmos sobre a realidade de nossas vidas como pedras vivas do edifício que é a Igreja e também do edifício que é o Carmelo.
O edifício maior que desabou, chamava-se Liberdade, pode ter caído por uma combinação de fatores que incluíam a antiguidade do edifício, sua manutenção precária e uma reforma que não poderia ter sido feita. Dizem que acidentes da grandeza de uma queda de avião ou do desmoronamento de um edifício de vinte andares, raramente têm uma única causa. Em geral, decorrem de uma perversa soma de fatores.
A Regra do Carmo, que é uma proposta de vida, tem mais de oitocentos anos. Durante este período orientou e alimentou a vida de várias gerações de carmelitas, em diversas partes do mundo: santa madre Teresa, santo padre João da Cruz, beata Elisabete da Trindade, Teresa de santo Agostinho, são Rafael Kalinovski, beata Miriam, santa Teresa Benedita da Cruz etc. A Regra nos aponta os alicerces do Carmelo, ajuda-nos a colaborar como pedras vivas na edificação do corpo místico de Cristo, que é a Igreja, para a salvação do mundo. Quanto mais alta é uma árvore e quanto maior é sua copa, mais profundamente devem ir suas raízes na terra e mais devem estender-se ao redor da árvore para sustentá-la.
“... com tal nuvem de testemunhas ao nosso redor, rejeitando todo o frado e o pecado que nos envolve, corramos com perseverança para o certame que nos é proposto, com os olhos fixos naquele que é o iniciador e consumador da fé, Jesus,...” Hb 12, 1-2
De 25 a 29 de outubro de 2006 aconteceu no México um Congresso OC-OCD com o Tema: A Regra do Carmo uma proposta de Vida em comemoração aos 800 anos de existência da mesma.
Deste Congresso saiu um texto que aborda sete aspectos básicos da Regra abordados a partir de sete perspectivas carmelitanas diferentes. Aqui vou apenas citar e abordar rapidamente os sete elementos da Regra que nos indicam os alicerces do Carmelo: A centralidade da Pessoa de Jesus Cristo, a meditação da Palavra de Deus, a oração, o trabalho, o silêncio, a fraternidade e a dimensão Eliana-Mariana.
Estes sete elementos da Regra de santo Alberto alimentaram e dirigiram também a vida da santa madre Teresa que continua a dizer-nos hoje: “Não façamos torres sem fundamentos” (7M 4, 15) e mais claramente ainda: “Toda nossa Regra e Constituições não servem de outra coisa, senão de meios para guardar com mais perfeição o mandamento do amor de Deus e do próximo” (1M 2, 17)

1.A centralidade da Pessoa de Jesus Cristo: “Viver em obséquio de Jesus Cristo (2Cor 10, 5), servindo-o fielmente com puro coração e reta consciência (1Tm 1, 5):
“Nunca deixei de fundar por medo do trabalho... vendo a serviço de Quem a fazia” F 18,5;
“Faça o que estiver conforme ao que lhes aconselharem os Letrados é mais serviço de Deus... não pretendemos outra coisa, nem Deus nos dê tal ocasião, senão que Sua Majestade seja servido em tudo e por tudo” F 27, 14;
“Claramente via que se servia a nosso Senhor (nas Fundações)” F 28, 2;
“Desejo sempre ser mediação para que se louve nosso Senhor e para que haja mais pessoas que O sirvam” F 28, 15;
“lançar-me àquilo que entendia ser maior serviço seu (do Senhor), por difícil que fosse” F 28, 19;
“Senhor, que pretendem estas vossas servas além de servir-Vos...?” F 31, 45;
“...ponhamos os olhos em Cristo nosso bem. Dele e de seus santos aprendamos a verdadeira humildade” 1M 2, 11;
“Ora, se nunca pusermos os olhos nele, nem considerarmos o quanto lhe devemos, nem a morte que por nós padeceu, já não sei como poderemos conhecer e trabalhar no seu serviço” 2M 1, 11;
“A fé sem obras, que valor pode ter? E estas, se não estiverem unidas aos merecimentos de Jesus Cristo, nosso bem, o que valerão? Sem a oração, a reflexão, a meditação, quem nos estimulará a amar este Senhor? Praza a Sua Majestade dar-nos a compreender o muito que lhe custamos. Faça-nos ver como o servo não é maior que seu Senhor, o quanto precisamos trabalhar para fruir de sua glória e como nos é indispensável orar, a fim de não andarmos sempre em tentação.” 2M 1, 10
                          
2.A Meditação da Palavra de Deus: “Meditando dia e noite na lei do Senhor” (Sl 1, 2; Js 1, 8);

3.A Oração: Vida na Presença de Deus: “Vigiando em oração”;

4.O Trabalho: “empregar-vos em algum trabalho, para que o demônio vos ache sempre ocupados”, “Quem não quiser trabalhar também não coma”;

5.O Silencio: “o culto da justiça é o silencio”, “No silencio e na esperança estará a vossa fortaleza”;
         
6.A Fraternidade: “um de vós mesmos prior, eleito por unânime consentimento de todos, ou da maior e mais qualificada parte”, “tomareis, num refeitório comum, os alimentos”, “nenhum irmão diga que tem coisa própria, mas tudo entre vós seja comum”, “deveis reunir-vos todos os dias de manhã para ouvir missa”...;

7.A dimensão Mariana-Eliana: “capela no meio das celas” dedicada à Santa Maria e “no Monte Carmelo, junto à fonte”.

Podemos ler a vida e a doutrina de nossos santos (as) e perceber como estes alicerces se fizeram presentes em suas vidas, conduzindo-os a uma íntima comunhão com Deus e desta maneira colaboraram com a edificação da Igreja para a salvação do mundo.
“...coloquem sempre os olhos na casta de onde viemos, daqueles santos profetas. Quantos santos temos no céu, que trouxeram este habito! Tenhamos uma santa presunção, com o favor de Deus, de sermos como eles.” F29, 33.
“somos chamados à oração e contemplação, porque este foi nosso princípio, desta casta viemos, daqueles santos padres nosso do Monte Carmelo” 5M 1, 2.
O esquema dos sete alicerces, apresentados pela nossa Regra de Vida, podem ser complementados com citações de Santa Teresa, São João da Cruz, santa Teresinha, Beata Elisabete da Trindade, etc. Nesta palavrinha do assistente coloquei apenas algumas citações de santa madre Teresa, tiradas do livro das Fundações, elas falam da centralidade de Jesus Cristo no Carmelo e na própria vida de santa Teresa; as irmãs podem descobrir outras e aprofundar a reflexão destes elementos que dão identidade à nossa vocação.
“Ninguém pode colocar outro alicerce diferente do que aí está já colocado: Jesus Cristo” (1Cor 3, 11);
“Aproximai-vos do Senhor, pedra viva, rejeitada pelos homens, mas escolhida e honrosa aos olhos de Deus. Do mesmo modo também vós, como pedras vivas, formai um edifício espiritual, um sacerdócio santo, a fim de oferecerdes sacrifícios espirituais, agradáveis a Deus, por Jesus Cristo” (1Pd 2, 4-5);
“Assim, todo o que ouve estas minhas palavras e as põe em prática pode ser comparado a um homem sensato, que construiu a sua casa sobre a rocha. Caiu a chuva, vieram as torrentes, sopraram os ventos; precipitaram-se contra esta casa e ela não desabou, pois seus fundamentos assentavam-se na rocha.” (Mt 7, 24-25).
Nota: Citações do livro das Fundações, da Santa Madre Teresa, tiradas das Obras Completas, 5ª. Edição, Editorial de Espiritualidade, traduzidas por fr. Wilson Gomes.




SANTA TERESA E A REGRA DO CARMO


A Regra carmelitana apresenta um duplo valor: espiritual e normativo. Ela foi o primeiro texto espiritual de nossa família carmelitana e sua primeira norma de vida.

Os dois valores foram vistos nela por santa Teresa, que os incorporou desde o primeiro momento e os reafirmou até os últimos anos de sua vida.


Antes de fundar São José

O conhecimento de Teresa sobre a Regra vem por meio da formação inicial no convento da Encarnação. Poucas são as informações sobre seu noviciado e de sua formação em seus primeiros anos de vida religiosa. Não sabemos até que ponto o conteúdo da Regra foi estudado e assimilado por ela antes do projeto da fundação de São José . Ela mesma vai contar o impacto que sentiu poucos depois em seu encontro com Maria de Jesus, a fundadora do Carmelo da Imagen de Alcalá de Henares, que sendo analfabeta sabia coisas da Regra que a madre ignorava (Vida 35, 1-2).

Na Encarnação a vida pessoal das monjas estava baseada na Regra. Elas faziam profissão “segundo a Regra do Carmo”. Não conhecemos a fórmula precisa da profissão da santa (1537), mas de uma fórmula anterior sim. Segundo esta a carmelita da Encarnação professava voto de obediência (sem a menção dos outros dois) segundo a Regra carmelitana (sem mencionar as constituições). Este texto de profissão religiosa data de 1521 e provavelmente oferece a mesma fórmula que usaria dona Teresa de Ahumada uns 16 anos depois.

A regra era ponto de referencia na profissão de cada monja e também a base jurídica e religiosa da vida da comunidade.
Mesmo assim, não sabemos até que ponto o texto da Regra era acessível às religiosas de então que não conheciam o latim, entre as quais se encontrava Dona Teresa. Nas constituições das carmelitas espanholas do século XVI alude-se várias vezes sobre as prescrições da Regra, mas nada se diz sobre sua leitura ou sobre a formação das religiosas no estudo da mesma. Falta nelas a norma que prescreve que a Regra “deve ser explicada quatro vezes ao ano”. Não é oferecido o texto em castelhano junto com as constituições em latim.
Serão textos não carmelitas (Osuna por ex.) que despertarão em Teresa, recém professa, a fome de oração pessoal e irão introduzi-la pelo caminho do “recolhimento” interior. O texto da Regra, no entanto, prescreve aos carmelitas o ideal da oração continua, “dia e noite...”.

Teresa nos informará que em seu mosteiro se vivia a Regra relaxada: “como em toda a Ordem, com bula de relaxamento” (Vida 32, 9). E este era um dos motivos de não voltar a sua comunidade de origem: “... voltar ao mosteiro da Encarnação..., que é da Regra Mitigada,... seria um desgosto para mim por razão que há para que dizer. Uma bastava, que é não poder viver ali o rigor da Regra primeira...” (Fund. 2, 1).


Não podemos precisar até que ponto tocou a sensibilidade da madre frente a Regra nesta primeira metade de sua vida carmelitana. De fato, o interesse por ela, a descoberta de seu valor e conteúdo será tardio, resultada das graças que desde o mais profundo de sua vida mística colocarão em movimento sua obra fundadora: últimos anos de sua vida na Encarnação.


O verdadeiro achado e nova opção pela Regra.

O encontro pessoal de Teresa com a Regra foi progressivo.

Está vivendo sob o impacto de uma das graças místicas que mais a impressionaram. É a visão do inferno, que põe em movimento sua vocação de fundadora. A primeira reação foi a nível pessoal: decidi para si mesma “a primeira coisa é seguir o chamado que sua Majestade me fez para a vida religiosa, guardando minha Regra com a maior perfeição que puder” (Vida 32, 9). A segunda reação, depois de um certo tempo, mas com a mesma firmeza, será sua decisão de fundar (os propósitos de “maior perfeição” Caminho 1, 2 estão relacionados com o voto do mais perfeito).

Nos anos de 1560-1562 persiste em Teresa o chamado carismático para fundar. Ela procura informar-se, lendo as constituições (Vida 35, 2). Com pesar tem que fundar o novo convento fora da jurisdição da Ordem, mas decide fundá-lo sobre a base firme da Regra do Carmo. Assim pede autorização para Roma que lhe concede.

Antes da chegada da autorização a Ávila, Teresa se encontra com Maria de Jesus, em Toledo no ano de 1562. É o momento em que a madre vive o dilema da pobreza evangélica devido a várias situações: exigências interiores, resistência dos conselheiros letrados, pressões de são Pedro de Alcântara, seguidas pela oposição do provincial e da cidade. Quando Maria de Jesus a informa sobre o teor da pobreza ditado pela Regra carmelitana “antes de seu relaxamento” (Vida 35, 2), traz o dado decisivo para Teresa: “eu já sabia que era Regra e via ser mais perfeição” e assim já não haverá teólogo que consiga dissuadi-la de seu propósito (V 35, 4).

Nesta época santa Teresa leu, meditou e assimilou a fundo a letra e o espírito da Regra carmelitana. Em Toledo, além do encontro passageiro com Maria de Jesus, dispõe de bons conselheiros. Próximo a ela tem o convento dos frades carmelitas, onde é prior Fr. Antonio de Jesus (Heredia), futuro companheiro de São João da Cruz em Duruelo. Tudo isto concorre para que se acenda na alma da madre a chama da Regra.

Em são José as noviças fazem sua profissão religiosa calcada na fórmula da Encarnação. Com alguns retoques. Um deles se refere à Regra “faço minha profissão... segundo a Regra primitiva de nossa Senhora do Carmo etc.”. Parece que num primeiro momento nem a Fundadora nem as outras carmelitas vindas da Encarnação sentiram necessidade de remodelar sua profissão segundo esse novo matiz. Esta preocupação surge anos mais tarde e então o visitador apostólico Fr. Pedro Fernandez, exige que todas as monjas que passam da Encarnação aos carmelos teresianos renunciem formalmente à Regra mitigada.